Trabalho de Alabá – Setembro/2016

Templos do Amanhecer - Trabalho de Alaba - 2016-09

O Alabá é um trabalho realizado por sete dias, no período da Lua cheia, a partir das 18 horas, tendo, como missão maior, a harmonia dos plexos dos pacientes pela concentração da força de Olorum através da manipulação dos Pretos Velhos e a presença dos Cavaleiros da Luz, especialmente a do Lança Vermelha, da Cura Desobsessiva.

É uma emissão muito poderosa, que beneficia também mestres e ninfas que participam do trabalho, trazendo a harmonização de seus espíritos e a recuperação de seus plexos físicos.

Templos do Amanhecer – Castelo dos Devas

Trabalho de Alabá

De 13 à 19/09/2016

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Benção de Ministros – Setembro/2016

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Salve Deus!

Convidamos a todos para participarem da Benção de Ministro nos Templos do Amanhecer.

Dia 04/09/2016

Seguindo o calendário de atividades doutrinárias, a benção de Ministro é realizado nos templos do amanhecer todo 1.º Domingo de cada mês. Informe-se sobre a benção no templo mais próximo a você e participe de mais esta realização.

Sejam todos bem vindos!

Agradecemos a sua visita e atenção.

Coordenação – Castelo dos Devas
coordenacao@castelodosdevas.org

COORDENAÇÃO GERAL DOS TEMPLOS DO AMANHECER

CASTELO DOS DEVAS – VALE DO AMANHECER

Templos do Amanhecer

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As Vidas do Lenhador

14 - As Vidas do Lenhador-pSalve Deus!

Meus filhos:

Este é um exemplo vivo do que tanto precisam e que me serviu – e vem servindo – a vida inteira. Condicionados, nós nos esquecemos do nosso relacionamento eterno com Deus…

Sim, porque ao homem condicionado muito pouco podemos fazer na Doutrina. É tão grande a sua indiferença às coisas deste Universo, que então todo o Sistema Espiritual, principalmente se ele desfrutar de saúde e cultura, vive e sofre para contestar o Espírito da Verdade. Ele enche seu ambiente com seus maus pensamentos, tornando mais triste este mundo.

Esta espécie de homem vamos encontrar no LENHADOR. Junto a ele encontraremos os que se julgam em liberdade. Veremos também, que os mesmos não passam de cativos da ignorância e da desventura: são os ENCOURAÇADOS dos poderes da Terra. E assim, vamos prosseguir nossa história.

O dia começava a raiar na Terra, quando me encontrei na Mansão dos Encouraçados. Vi gente que entrava e saía, como se fosse uma rodoviária. Nisso, passou alguém que me chamou a atenção: o LENHADOR – um homem de aspecto cansado. Ouvi quando Amanto disse bem alto:

– Este homem tem um lindo exemplo a contar. Sua história alcança muitos séculos.

Ouvindo como eu a narração de Amanto, ele se virou e batendo a mão em meu ombro foi me arrastando dali.

Meio surpresa o acompanhei, e ele começou sua narrativa:

Veja minha irmã, o perigo das manias entusiastas: elas são contagiosas e ninguém se inclina impunemente à beira do abismo da demência. Aqui está uma coisa horrível que vou contar.

Então, meio desconfigurado começou a levantar a pedra de seu sepulcro, dizendo:

Antes vamos agradecer a Deus, a força e a maneira como aceitamos os desígnios de nossa evolução na lei imutável do carma. Sim, a Lei de Deus nos faculta que tenhamos cultura nos recursos de nossa inteligência, mas esperando, fica a nos proteger em nossas dificuldades, pelo atraso de saber e não fazer. Como é fácil de anotar na Individualidade, o que criamos na Terra pela ânsia de fazer sem saber. Às vezes, adiantamos tanto uma Doutrina e não sabemos expressar o nosso Amor.

Minha querida Tia Neiva, tudo começou assim: eu estava na Terra e em uma linda manhã de sol, saí para o campo para ali receber os seus raios, pois precisava me aquecer. Porém, a Natureza mais uma vez me pregou uma peça. O tempo mudou e em vez do sol veio um terrível temporal que me obrigou a sair correndo de volta para casa.

Oh, meu Deus! Como sofro ao lembrar, mesmo agora, depois de longos quatro séculos. As árvores dobravam suas copas até o chão. Mal cheguei ao portão, ouvi alguém que gemia pedindo para entrar. Era uma jovem que mal enxergando a luz com seus negros olhos, queria também atravessar o portão. Ouvi ao longe os gritos da Condessa, minha esposa, e num gesto de cuidados não deixei entrar aquela jovem, porque sabia que não seria compreendido por Nice, minha querida esposa. Também não disse a ela nada sobre a jovem.

O temporal prosseguiu como um furacão, causando destruições naquelas imediações.

No outro dia sucedeu o que sempre sucede aos covardes e egoístas: os criados aflitos contavam o desespero de um triste pai que encontrara morta a sua filha nas imediações do meu Castelo. A jovem havia morrido de frio e medo…

Era uma família de Fidalgos que morava ali perto da minha Província. É difícil descrever a dor que senti diante de um quadro tão culposo para mim. Não tinha coragem de contar a ninguém a minha imensa covardia.

Dois anos depois, Nice me deu uma linda filha, que ia crescendo e me fazia lembrar ainda mais aquele olhar suplicante da pequena Fidalga.

Tudo se passou, chegando eu a fazer um bom relacionamento com os Fidalgos. Por fim, Nice morreu quando ia dar à luz uma outra linda menina.

Passei meus dias sozinho naquele imenso Castelo, procurando me intelectualizar ao máximo, já que nada tinha para fazer. Os criados tinham uma espécie de compaixão por me verem tão só. Porém, um certo dia estava a me martirizar de dores, quando ouvi a porta do quarto ranger como se fosse abrir e, me apareceu a figurinha de Nice, que em um relance me disse:

– Venha… Venha… Chegou o seu tempo!

Assustado quis segurá-la, mas ela já desaparecia. Gritei por seu nome tão alto que os criados vieram ao meu encontro. Eu estava ardendo de febre. Vi os criados a correrem, porém não sentia interesse em perguntar nada. Fui ficando leve e desaparecendo daquele local, sentindo que uma corrente muito forte tomava conta de mim. Sem visão, absolutamente sem nada e… sem esperanças.

Minha Tia Neiva, só Deus sabe as dificuldades que o sentido emocional provoca em nossa alma.

Sim, porque a matéria sem sintonia com a alma fica em desajuste, fica dispersa e passa a ser uma ENERGIA ESPARSA, sem contato do Etérico.

– Um homem, simples homem. É a hora de minha morte!…

Ouvia o movimento dos criados, do médico e, por fim, passei a sentir como se levitasse num crepúsculo, em um balé de luzes que acendiam e apagavam. Vi meu pai e minha mãe se despedindo de mim e já em minhas agonias pensava:

– Como? Se eles já morreram e eu estou também morrendo?

Oh, meus paizinhos queridos! Logo estaremos juntos! Nisso chegou minha Nice e me foi levando pela mão. Senti uma dor atroz no coração. Então ouvia a voz de Bruno, meu mordomo:

– Pobre Conde! Fez sua passagem. Como sofreu o meu querido patrão.

Ouvi também o choro dos criados.

Oh, fenômeno! Oh, meu Deus! Sentia que toda a matéria até então organizada, começava a representar uma modalidade de energia esparsa, que ia me definindo em outra situação, em outra condição de homem. Porém a mente era lúcida, cada vez mais lúcida. Minha cabeça rodava, rodava e, finalmente entrei num novo estágio: formou-se outra atmosfera. Um terrível zumbido, como se meus ouvidos fossem arrebentar e a transformação incompatível se fez em uma dor, também incomparável, porém muito rápida. Foi então que me senti do outro lado da vida.

– Dor? – Perguntei – Por quê dor? Se eu estava morto, se já havia feito a passagem…

Sim Tia Neiva, é o que me pareceu. Porém, o deslocamento do PLEXO FÍSICO, o impacto da energia compactada à corrente etero-magnética é uma dor física tão grande que não tem qualificativos. Inclusive, fica no nosso subconsciente a ponto de muitas vezes, por maior que seja o desespero, temos medo de morrer. É a razão deste tamanho medo da morte.

Dali parti para um novo e desconhecido mundo. Só – mais uma vez, só…

Ouvia agora vozes no meu novo mundo, como se fossem me instruir para mais outra experiência.

– Seja o que Deus quiser – pensava sempre comigo e assim fui me libertando dos meus defeitos.

No terceiro dia levantei a vista, e vi ao longe um lindo Castelo. Então parti para lá como se fosse a minha única salvação. E qual não foi minha dor!… Ao chegar ao portão ouvi os gritos de Nice dizendo:

– Venha! Venha meu amor! Venha me salvar…

Comecei e andar no interior do Castelo enquanto seus gritos iam se distanciando. Oh, meu Deus! Já estava cansado quando ouvi uma voz que me alertou:

– Conde Lepant! Estás a seguir tua própria consciência. Nice já passou por aqui faz dez anos.

– Oh! – Gritei – Onde estou?

– Estás sob o jugo de sua consciência, já disse.

– Consciência? Não me lembro de nada. Diga-me onde estou.

– Em Pedra Branca, no exílio dos mortos da Terra. Daqui partirás. Partirás para uma nova vida. Os teus pensamentos o levarão a mundos que a tua percepção ainda não atingiu. Procura estar atento ao Comando Universal, porque estás completando o teu Retiro e dentro de algumas horas partirás para a Terra.

– Como? Eu venho de lá e não deixei ninguém a me esperar…

– Sim. Deixastes os teus criados e terás portanto de voltar à Terra.

Não sei por quanto tempo ouvi a mesma voz. A cada hora me sentia mais lúcido. O fato é que não sei porque tinha saudades de uma certa harmonia que penetrava em meu nariz, em minha boca e nos meus poros.

Sim, não sei mais por quanto tempo. Lembro-me somente de ter ouvido, como se fosse uma melodia o Guia Universal dizer:

– Passageiros da Terra: fiquem alertas para voltar. Já completaram o seu Retiro.

Comecei a ter medo do que até então não tivera. Para onde iria? Enquanto pensava fui atraído por um impulso vindo a descortinar uma grande rodoviária, onde pessoas teleguiadas tomavam os seus rumos. Eu também segui o meu sem qualquer percepção do meu destino. E qual não foi minha surpresa: Uma compreensão muito grande e, em fração de segundos estava em frente ao meu Castelo. Quem sabe o que estava acontecendo? Meu Deus! Entrei como se estivesse VIVO, porém sem sentir as anormalidades do corpo. Agora era tudo diferente. Leve… leve… como se estivesse em um corpo de pluma.

O Castelo cheio de parentes, meu procurador e demais pessoas. Como é horrível Tia Neiva, ver pessoas estranhas violarem os nossos objetos. É realmente terrível.

Tentei sentar-me à minha mesa. Porém um grupo que saiu do corredor tomou toda a mesa. Nisso o meu procurador começou a ler o testamento que eu havia deixado.

Deixara uma grande parte para Janete, a Governanta, e para Bruno, meu Mordomo, meus criados queridos.

Quando foi lido o nome de Janete, ouvi seu choro convulsivo e corri para atendê-la. Meu gesto a comoveu e eu – pobre de mim – debrucei sobre o seu corpo e ouvia o meu som a dizer o que bem precisava…

Nisto, ouvi a voz que dizia:

– Chega Lepant! Sua hora está chegada. Vamos. Temos muito o que fazer. Uma nova vida!

Era Germano, o meu Guia Espiritual.

Saí dali sem saber como terminara o meu inventário e também não me preocupei.

Uma linda Chalana me esperava e saí sem pensar em nada. Se alguém perguntou o meu nome? Não saberia dizer.

Nuvens espessas cobriam o aparelho. Então, um novo mundo se descortinou em mim: RESSURREIÇÃO. Ressurreição! Gritei diante daquele quadro que se apresentava em frente aos meus olhos.

Oh, Deus Todo Poderoso! Saí de um mundo e entrei em outro. De repente, comecei a raciocinar: Como seria minha vida? Nice, minha Nice, onde deverá estar neste momento neste Universo tão imenso? Comecei a ter medo. Medo do que eu não conhecia… Sim, não sei porque, mas aquela beleza me dava medo.

Oh, que saudades de minha Nice!

Por fim, o aparelho parou diante de um enorme hospital, onde havia um letreiro: CASA TRANSITÓRIA DE FABIANO.

Oh, meu Deus! Desembarquei sem ninguém mandar. Porém, no interior do hospital, encontrei um amigo: Lafaiete.

– Oh, Lepant. Como vai?

Porque estava ali, não sei.

– Você me dá notícias de Nice, minha esposa?

– Ela passou por aqui, há dez anos. Não tenho nenhum roteiro.

Nisto alguém chamou:

– Lepant! Venha para esta sala que a tua família espera.

Oh, meu Deus! Cheguei e encontrei uma enorme tela que me assustou. Sentamos – Eram muitos – e começou a grande prova para mim. Eu que até então pensava ter entrado no esquecimento… Germano puxou uma alavanca, e tudo começou: eram 10 horas da manhã na Mansão dos Lepant, quando um lindo casal deixava os portões do Castelo e as flores se misturavam com as cores do rosado vestido da Condesinha, minha Nice e seu irmão Roberto, um terrível jogador que acabara com a fortuna do Conde meu sogro. Em resumo: Nice por amor a seu irmão roubava dinheiro do meu cofre, ou melhor, do nosso cofre, e pagava as contas de seu irmão, inclusive com sorrisos e insinuações ao lado do terrível cobrador.

Comecei a me lembrar de sua rápida enfermidade, dos desencontros e de nossos reajustes. Comecei a ver seu romantismo, o mundo de onde eu viera.

Oh, meu Deus! – Pensava. Como? No entanto, eu deixara morrer a pobrezinha de frio e medo, para não melindrá-la. Distraído em minha dor comecei a ouvir a voz do meu Mentor amigo:

– Chega por hoje. Veja como sofrem os que passam na Terra sem nada fazer. Nunca fostes saber o que acontecia em seus arredores. Bruno e Janete foram seus legítimos pais. Pediram a Deus esta oportunidade de serem seus criados, para resgatar uma velha dívida que contraíram outrora com você.

– Oh, meu Deus! Como fui tolo! – disse eu na força da expressão, lembrando do olhar carinhoso de Janete e de Bruno.

Após breve silêncio, Germano continuou:

– Salve Deus! Agora vamos ouvir o Rosário de Salmos, que é o Canto da Energia Imortal. Venha ver quem realmente se venera neste recanto de Amor e Paz. Fizeste na Terra aquele rico Castelo, sem suor do teu rosto e sim pelo ouro pesado. Aqui é o Jardim que os anos e o tempo não destroem. Fecha os teus olhos e verifique que ainda está diante de ti mesmo, do teu jugo. Agora deixe teu fardo nas mãos de quem poderá sustentá-lo.

Nisso, uma jovem mulher apareceu, parecidíssima com minha Nice. Senti amá-la, porém algo me dizia – aquele Espírito tinha o todo de Nice – enquanto pensava sem rancor, fora traído pela minha pobre consciência.

– Deixa o teu fardo, Lepant! Já lhe disse…

Oh, meu Deus! Onde estaria eu àquelas horas? A minha pequena cabeça não saía do ciclo vicioso, sempre com os mesmos pensamentos – Nice me traíra – e eu? Estou na Terra, no espaço ou em que plano? Deveria estar…

De repente, um forte abalo me fez alertar. Senti medo da solidão e gritei:

– Oh, meu Deus!

Germano me perguntou com carinho:

– O que houve? Lepant, para estar perto de Deus só nos basta pensar nas boas obras. Os nossos pensamentos são as nossas asas.

– Por quê este estrondo?

– O silêncio é perigoso quando temos muitas falhas no subconsciente. Aqui também trabalhamos… O que você não soube fazer com sua riqueza na Terra.

– Sim – gritei – o trabalho. Não sei fazer nada!

– Saberás, quando tua alma também souber se entrelaçar a outras almas.

Nisso, um grito nos tirou do recinto onde estávamos: uma mulher pedia por socorro. Instintivamente corri para lá. Oh, meu Deus! Fui em socorro de alguém pela primeira vez em minha vida. – Lepant, somente naquela encarnação fostes tão indiferente. Começa em ti a grande luta. Seja verdadeiro contigo mesmo. A sinceridade, quando real, persiste e vence.

Todos estes movimentos vêm da natureza universal inferior. Dar expressão a um impulso ou movimento não é o suficiente para uma afirmação religiosa ou doutrinária no caminho da Evolução. Deixe que a iluminação te brilhe a alma. O intercâmbio vital não lhe serve mais. Procura! Não fiques a chorar pelo que não fizeste e sim procure entoar teu Canto Universal.

– Oh, meu Deus. Tudo é delicioso!…

Como pode, Tia! Aquele lindo Missionário e eu, um pobre Sofredor, tão bem coordenados. A cada dia eu mais me entregava ao trabalho, em missão junto àqueles chegantes, e minha mente ia se desenvolvendo.

Tia Neiva, esta história é realmente interessante, digna de ser ouvida. Sim, Tia. Ainda não terminei. A parte mais interessante vem agora.

Salve Deus! Desde que eu estivera ali, jamais sentira o que neste dia – ou tempo, como marcamos no espaço – sentira. Diferente de tudo o que até então sentira. Fiquei à espreita de meu querido Mentor Germano e fui prevenindo minha alma.

– Vamos partir – disse – Vamos, porque não tens mais com que pagar a tua estada.

Oh, meu Deus! Lembrei-me de que estava fraco e minha perturbação tinha razão de ser. Minha alma discorreu e balancei a cabeça. Pensei como devem sofrer aqueles que na Terra não têm dinheiro para se alimentar.

Oh! Fui prevenido por minha alma… Salve Deus!

– Sim – disse Germano – este é o Todo Poderoso…

Saímos dali caminhando, caminhando como se estivéssemos na Terra. Caminhamos, caminhamos até cruzarmos com um homem. Germano perguntou-lhe:

– Conheces bem estas imediações?

– Não, estou foragido – disse ele, apressando-se a distanciar-se de nós.

Então, Germano comentou que ele vivia há muito tempo naquelas redondezas. Senti um pouco de fraqueza e dor em meu coração. E aqueles pobrezinhos que viviam nas imediações de meu Castelo? Oh, meu Deus. Deixei que morressem de fome e, no entanto tudo me sobrava. Tentei, mais uma vez, afastar o meu remorso, a minha imensa covardia. Germano me advertiu:

– Prossegue. Vamos, prossegue. Não tentes cair no mesmo padrão vibratório. Aos poucos tu vais pagando o que deves.

Continuamos nossa busca até chegarmos em frente a um enorme Albergue. Lá, encontramos uma mulher, cujas jóias a ornavam da cabeça aos pés. Olhei o meu traje e Germano observava-me com um leve sorriso nos lábios. A que poderia atribuir o comportamento daquela senhora? Louca, simplesmente louca. Atônito, disse:

– Não trabalha. E como ela vive? Se não me tivessem tirado da Mansão de Fabiano, eu estaria sofrendo terrível perturbação por falta de BÔNUS para o meu alimento. E ela, como os ganha?

– Foi ela quem trouxe tudo da Terra.

– Como, Germano? Trouxe da Terra? Explica-me melhor.

– Sim, te direi.

Porém, antes que Germano dissesse alguma coisa, apareceram dezenas de escravas, tentando servi-la. Vinham muitas, porém ela gritou:

– Esperem. Um pouco de cada vez.

– Viu? Elas a obedecem…

Foi então que surgiu um casal muito lindo e começou a ser feita uma Doutrina. Não sei por quanto tempo demorou aquela solenidade. O fato é que todos ali tomaram um novo rumo sob as Bênçãos de Deus.

– Viste, Lepant? Não podemos julgar os outros pelas aparências.

Desta vez, mais do que nunca, os acontecimentos me deixaram confuso. Sentindo fome, muita fome, olhei para cima e vi algo que me deslumbrou: uma nave muito grande se deslocava no espaço. Para onde iria?

– Lepant, tenhas cuidado. Uma coisa de cada vez. Por quê não procuras saber o destino dos escravos?

– Oh, Jesus! Como sou distraído. Desculpa-me, irmão.

– Sim, Lepant. Enquanto estávamos em harmonia não pudemos expandir a nossa força. Ouça:

Lá no final do Albergue tocavam uma sineta.

– Vamos, para termos um bom lugar.

Sim, sempre pensando: Onde irei, o quê me espera?

A senhora das jóias não participava. Permaneceu em seu lugar. Linda mulher. Agora eu podia ver muito bem o que se passava. Ia perguntar, quando duas Chalanas se encontraram e um enorme estrondo nos tirou da sintonia, nos removendo para outro Plano.

Comecei a raciocinar bem melhor e a me preocupar com as coisas que vira e ouvira. Por exemplo: aquela mulher, a sua beleza, suas maneiras. Como a encontrara… tudo tão estranho.

– Para onde vamos? – Perguntei.

– Vamos voltar para o Albergue.

– Estamos em outra estrada?

– Sim, estamos.

– Por quê?

– Vamos para outro Albergue.

Desta vez, enquanto caminhávamos, pensava como era perfeito este Universo. Chegamos a um rico Albergue, onde uma grande família ria de seus desencontros na Terra. Sem ser notado fiquei ouvindo. Tive inveja de um certo comentário de uma linda jovem que estava ali e havia sido esposa de um cego, cujo destino o levara à mendicância. Logo entrou o ex-cego e ambos se beijaram abraçados. Meu Deus, tanta simplicidade.

Nisto, entrou a linda mulher das jóias, com muita familiaridade.

– Oh, querida Sabá! Entre e cante para nós.

A jovem cantou e dançou lindas canções. Senti como se todo o Universo a estivesse ouvindo. Depois, ela levou a mão ao peito e suspirou dizendo:

– Oh, meu Deus! Porquê me faltou Amor no momento mais precioso de toda a minha vida?

Dizendo estas palavras soluçou. Fiquei vibrando para saber mais alguma coisa sobre aquela linda mulher, mas, logo entrou um estranho nos botando para fora do Albergue.

Nisto, reconheci um Abade que passou e, num relance, compreendi que todos que ali estavam saíram à procura dele.

Então fiquei só com Germano e a linda mulher que estava sentada em uma pequena e triste pracinha. Cheguei-me para junto dela, sentei-me e comecei a perguntar sobre sua procedência. Ela começou a me contar sua história dizendo:

– Vivia numa pequena cidade no interior da Índia. Meu pai e minha mãe eram pescadores de pérolas, e formaram um grande patrimônio. Tão grande que me fizeram Rainha. Tornei-me poderosa, mas cedo meus pais morreram. Então fiquei endurecida. Não amava ninguém, dificilmente sorria. Até que um dia encontrei o olhar do jovem Janara, filho de meu escravo. Ah, meu amigo, quanta paixão. Nunca me perdoarei por ter desperdiçado a minha oportunidade. Lembro-me agora com saudades. Tenho ânsias. Que horror! Foi triste, realmente. Só me resta contudo recuperar o tempo perdido nestas condições deprimentes. Encho-me de jóias preciosas e fico à mercê dos que me julgam.

Enquanto Sabá falava ocorreu-me um pensamento: tão linda que eu não posso acreditar em sua piedade; não acredito também que alguém possa desposá-la. Porém, como estávamos no mesmo nível de evolução, ela não sabia o que eu pensava e nem eu, tampouco, sabia o que ela pensava.

Ela sorriu mostrando a sua beleza, e eu ainda fiquei pensando mil coisas quando um forte estrondo nos fez tremer.

– Oh, meu Deus! – gritei – Não me acostumo. Não me acostumarei nunca com esses estrondos…

Ela deu uma gargalhada como se fosse um Canto e despedindo-se me disse:

– Hoje me libertarei daqui. Deus, o bom Deus te libertará também um dia.

Foi se levantando como um lindo pássaro naquele crepúsculo, que é como nos parecia aquele Plano de nossa evolução.

Só! Novamente só, continuei sentado naquela pracinha, não sei por quanto tempo. De vez em quando aparecia alguém que se sentava, contava suas dores, suas paixões e prosseguia. Porém eu era além de medroso, um grande preguiçoso. Foi preciso que um forte estrondo me atirasse em outro lugar – um bonito Albergue. Compreendi que os estrondos nos tiravam a sintonia e nos levavam a uma situação primária. Sim, primária…

Na minha força de expressão, o fato é que a nossa mente entra em choque e um processo de nosso próprio mecanismo expulsa as ficções, nos dando outras oportunidades de novos raciocínios. Sempre a mesma coisa: alguém se lastimando do que deixou de fazer.

Estava observando os movimentos de alguns Centuriões que se movimentavam na escuridão, e tive inveja. Perguntei:

– O que poderia fazer para ingressar nessa comitiva algum dia?

– Voltar à Terra – disse alguém.

– Voltar à Terra? – Admirei, sentindo nova esperança. Poderia tirar a imagem que tanto me torturava.

Não podia ficar ali parado. Resolvi caminhar, porém sempre com medo de me afastar muito. À medida que caminhava a iluminação ia se ofuscando, como se tivesse chegado à hora do crepúsculo. Comecei a ouvir sons – risadas, gente alegre que estava em missão. Não preciso explicar que me familiarizei com toda aquela gente. Não sei por quanto tempo vivi ali meio despercebido do resto do grupo.

Um certo senhor de voz calma, se levantando em um degrau mais alto daquele luxuoso pavilhão onde estávamos, disse em voz de quem vai discursar:

– Meus caros contemporâneos, chegou o nosso grande momento. Voltaremos para a Terra na grande missão que nos foi dada. Iremos remover séculos. Partiremos para uma nova conquista e mais uma vez, iremos libertar aqueles Espíritos e remover novamente neste primitivo roteiro – e apontando com uma espécie de lápis mostrava na grande tela a Terra em seus diversos ângulos. De repente, surgiu na tela uma embarcação sobre o oceano tempestuoso, parecendo uma pequena folha prestes a sucumbir nas águas.

Em seu discurso ele dizia o nome dos personagens que futuramente estariam em sua direção. Dizia, também, que iriam reencarnar em Portugal.

– Salve, salve Lamúrcio. Salve, salve Lamúrcio. – Aclamava o grupo.

Veio em minha mente a pergunta: de onde teria vindo esse grupo, estes personagens tão unidos? Eu sei que viera da França. Como se tivesse ouvido minha pergunta, o orador continuou seu discurso:

– Oh, meu Deus! Parece que foi hoje quando descemos as cordilheiras e chegamos às Planícies Macedônicas, descobrindo Esparta. Foi horrível! Fomos massacrados pelos Dórios. Oh, como foi dura aquela Península Peloponense. Os Gregos nutriam verdadeiro ódio provocado pelos Dórios, a ponto de impregnar aquele ódio em toda a Península, ou melhor, em toda aquela gente. Os Gregos e os Egípcios acreditavam na vida além física, os segredos da morte; nas revelações sucessivas e nas comunicações com os Mundos. Esse ensino provocava uma grande evolução da alma, provocava impressões tão profundas infundindo uma paz, uma serenidade e uma força moral incomparável. Em resumo, a DOUTRINA SECRETA, Mãe das Religiões, na maneira de cada Tribo, foi infundida a ponto de nunca morrer.

– Porquê nunca morreu? – Perguntou alguém.

– É impossível que morra a Doutrina Mãe, como a chamamos na Terra. Ela é uma revelação, é algo biológico do predestinado, de sua missão, que age segundo sabemos pela indução recíproca; altamente moderada sobre o centro principal do seu eixo. Quando as células inferiores entram em excitação por excesso de estimulações na linha do interoceptível, que ameaçando o sensitivo do homem, se esgota pela seqüência moderadora ou regência moderada, impondo o freio e o controle dinâmico-sensorial, exigindo sua ação. São as células coronárias que decidem os três reinos. São estas células que governam o cérebro, ou pineal, ou células inferiores. Entram em período de estafa ou decomposição do sistema dualista nervoso, ou de outra parte do núcleo vegetativo, os quais dão origem às fibras. Não há como superar funcionalmente os dois setores nervosos, porque ambos são vinculados ao cérebro, sujeitos às suas flutuações. São rigidamente controlados pelo sistema da flutuante alma, que estabelece um equilíbrio cerebral, pela indução recíproca dos três reinos de sua natureza. Esta atividade desordenada na concepção do sistema nervoso, é desvantajosa ao homem na Terra. Meus irmãos que pensam voltar à Terra. O homem físico sofre seriamente pela sua falta de Amor. As suas propriedades são imensas, porém sempre de acordo com o seu padrão vibratório.

– Oh, meu Deus! – Pensei – Quanta coisa além do infinito. Meu Deus, sou um estrangeiro que jamais voltará à sua pátria, ao seu primeiro estágio.

– Desculpe, Lepant – Disse alguém – O teu suspiro vem de longe. Pensa e tenha esperanças. Não ouves uma só palavra, não vês bem o meu rosto, a minha face. Passou a hora dos sonhos. Este é um mundo em que não se oculta nada. Ainda és um hóspede silencioso.

– Passaram as horas do sonho – Oh! – Gritei, como se fosse um gemido – Estou preso pelas garras do meu Castelo, sinto-me amarrado a seus portões. Não vejo à minha frente a luz da manhã. Não posso expulsar de meus pensamentos meu horrendo crime – ele vem a vaguear à vontade.

– Venha, meu hóspede silencioso – disse a voz – Eu me chamo Lamúrcio e já estou com a missão em Deus de voltar à Terra. Olhe, Lepant, a alma do mundo é uma força que tende sempre ao equilíbrio. É preciso que a vontade triunfe sobre ela ou ela triunfa sobre a vontade. Toda vida incompleta é atormentadora. É preciso conhecer nesta visão, o homem acordado deste plano asfixiado pelas emanações da Terra. Saia deste falso sonambulismo que o seu inconseqüente estado de espírito provocou. O seu único reflexo vivo é a ciência do mundo invisível, e continua a ser um dos mais importantes ensinamentos reservados.

Sim, porém, a ciência invisível entre os homens, e as almas desencarnadas pelas propriedades desses fluídos, pela ação que a vontade exerce sobre eles, onde explicamos os fenômenos da sugestão da transmissão de pensamentos, segundo o passado e o passado no futuro. É preciso saber que a vontade do homem modifica também o seu comportamento, a sua razão nos seus amores, nos seus impulsos e nos seus desejos. Aqui tens uma natureza e na Terra tivestes outra, bem mais ardente, a que te fez chorar hoje e poderá te fazer rir amanhã. A própria natureza do homem ensina por indução que existe ordem. O Ser é substância e vida. A vida se manifesta pelo movimento e o movimento se perpetua pelo equilíbrio. Assim, o equilíbrio é pois a Lei Imortal. A consciência é o sentimento e a justiça. Chega, Lepant. Já te condenastes e não fizestes nada.

– Salve Deus! – Gritei – Quero fazer alguma coisa. Eu quero fazer alguma coisa.

– Sim – Disse o nosso Comandante – Breve teremos uma oportunidade para reencarnarmos.

– Eu quero essa oportunidade – gritei eufórico.

 – Sim – Disse alguém – Espero que Deus te conceda essa oportunidade.

Como sempre um grande estrondo nos tirou da sintonia e, de repente, estávamos em outro local. Lembrei-me de Germano – Nossos pensamentos são como as nossas asas – E ali estava ele parecendo estar à minha espera e me falou:

– Como? Então já pensas em partir para a Terra?

– Sim, penso. E mais: Vou com um grupo que, segundo me informaram, parte para uma grande conquista.

– É um compromisso muito grande. Recebeste alguma coisa?

– Não. Estou com muita fome. Onde vamos?

– Para o Albergue de Nana. Lá você não sentirá mais fome.

– Por quê?

– Porque lá existe trabalho.

– Sim, porém na Terra eu comia e não trabalhava.

– Lepant! Esta missão é perigosa. Hoje a sua mente está muito pesada. Porém tão logo se acerte, tudo estará bem. Vais ter prazer em viver aqui, fazendo a caridade. Saibas que as imperfeições da vida não se corrigem através da meditação, porque a alma não entra em atividade normal, aqui neste Terceiro Plano onde nos encontramos. Salve Deus! Vamos continuar nossa jornada.

De repente chegamos a um lindo Albergue. Bateram palmas com nossa chegada. Foi emocionante. Muitas pessoas comentavam assuntos diversos e eu sem sentir comecei a participar, como se estivesse há muito tempo naquele ambiente. As horas alegres e as horas tristes terminavam de uma maneira que me deixava realizado.

Voltei para o Albergue de Matozinho, onde já estava bem familiarizado. Estava sentado em uma pracinha, quando ouvi terrível algazarra e em seguida um estrondo. Só restou Germano que veio falar comigo.

– Oh, Lepant! Vim despedir-me de ti.

– Para onde vais? – Perguntei.

– Vou para a Terra.

– Para a Terra? Como? – Perguntei – Como?

– Desde que a Terra libertou o Homem Pássaro, nunca mais evoluiu. O Homem Pássaro veio logo depois dos Equitumãs. Eles vieram na força da era. Dizem que se transportavam de um lado para outro e foram esses homens que se afastaram de Deus, deixando a vibração da Terra na pior sintonia. Ah! Se não fossem aqueles homens a Terra estaria melhor…

– Não estou entendendo muito bem esta sua narração. Por acaso não estás com algum cobrador a te vibrar? Sim, se vais para a Terra…

– Não, Lepant, não. Vou para a Terra, já te disse. Porém, as vibrações não estão me atingindo. Estou falando dos Homens Pássaros porque eu fui um deles – e tu também. Porquê fostes tão egoísta quando estivestes por lá?

– Eu? Não me lembro de nada, de nada mesmo.

– Vamos para a Terra. Aproveita, pois os tempos vão chegar em que as oportunidades irão ficar muito escassas.

– Não tenho coragem, enquanto não me esquecer da jovem Inara.

– Só esquecemos quando pagamos nossos débitos.

– Oh, meu Deus. Sou realmente um preguiçoso. Fico de um lado para outro sem me preocupar. Depois como irei escapar? – Pensei.

Com esses pensamentos, nos despedimos.

Era 30 de outubro e eu me levantei com mil pensamentos, quando ouvi os aplausos de todo o povo reunido, alegre, sem saber o que me vinha na alma.

Meio atônita, meio desequilibrada, me mantive sem demonstrar o que sabia do futuro daquela gente.

Salve Deus!

Com carinho,

A Mãe em Cristo.

Tia Neiva.

PEQUENAS HISTÓRIAS SOB OS OLHOS DA CLARIVIDENTE NEIVA

14 – As Vidas do Lenhador

Templos do Amanhecer

CASTELO DOS DEVAS – VALE DO AMANHECER

 

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Almas Gêmeas

13 - Almas Gêmeas-pSalve Deus!

Meu filho Jaguar:

Através de suas Faixas Cármicas na longa jornada evolutiva, em qualquer situação em que não estiverem juntos, haverá sempre uma imensa saudade que se reflete em cada um dos dois, tornando suas existências incompletas. Podem amar e ter tudo no Plano Material, mas fica uma sensação de insatisfação, de não estar completa a felicidade, que só se realiza quando as duas Almas Gêmeas se reencontram. E esse reencontro também só as realiza quando ambas estão livres de seus compromissos cármicos, como veremos mais adiante na história que Tia Neiva nos contou.

Não temos como penetrar a Mente Divina e perscrutar os misteriosos desígnios do Criador, mas, o mecanismo das ALMAS GÊMEAS é poderoso incentivo ao retorno às origens, ao seio do que é completo, a garantia de que um dia os Espíritos voltarão à Divindade.

E é muito linda a jornada das Almas Gêmeas. Como progridem em missões separadas, na maioria dos casos uma se dedica ao auxílio da outra. Vivem no amor completo e incondicional. Quantas chegam ao último degrau de sua Evolução na Terra, mas, como sua outra metade ainda está a caminho, pedem a graça de poder voltar e ajudar suas Almas Gêmeas. E é um grande sacrifício este, pois este Planeta é excessivamente pesado em suas Faixas Vibratórias e um Espírito sofre muito em uma reencarnação dessas. Mas parte feliz, com esperança, com dedicação, porque é uma missão de amor.

Para se ter um exemplo do encontro das Almas Gêmeas e de seus compromissos, vamos ver a história de um velho Jaguar e Rosa Maria, que Tia Neiva nos contou em uma aula dominical.

Salve Deus!

Certa vez fui abordada por um Espírito calmo, tranqüilo, muito bacana mesmo, desses que você pode ler em sua mente, ver em seu rosto toda a dignidade, as coisas boas que porta o homem sem frustração. Honesto, sem essa maneira de querer enganar alguém.

Tive a certeza de que era um daqueles Espíritos que, conforme a época que estou passando, Amanto, Umahã ou mesmo Pai Seta Branca, me enviam para transmitir uma história, uma mensagem.

Aquele Espírito foi chegando e começou a falar tranqüilamente sobre sua vida.

– Tia – falou – Eu sou aquele do sonho… Aquele sonho…

Lembrei-me de que já o encontrara antes e me contara muita coisa. Perguntei:

– Graças a Deus! Tem mais alguma coisa boa para dar continuidade?

– Sim Tia, tenho. Tenho o princípio da história da minha vida, que vou lhe contar. Eu era um homem perverso, um verdadeiro tirano. Sou um Jaguar! Vivi nas planícies e estive por todas as partes da Terra. Só aprendi tirania e violência. Não conhecia o Amor. Um dia reencarnei no Império como Senhor de Engenho.

Sorri lembrando-me de vocês meus filhos. Esses seus rostos, cada um revelando um Jaguar, Senhor de Escravos, Senhor de Engenho…

– Fui Senhor de Escravos – continuou – Mas era muito direito em meus negócios e procurava aplicar a justiça a meu modo. Fui muito querido pelo Imperador, chegando mesmo a merecer plena confiança dele. Constantemente estava no Palácio – E então citou diversos nomes de políticos, senadores, homens importantes naquela época, com os quais tinha estreitos laços de amizade.

– Eu era um homem tão temido que quando chegava em minha Fazenda Tia, uma das melhores da região, com uma bela mansão, os escravos ficavam temerosos de mim. Faziam tudo com medo de mim, da punição que era certa se não agissem conforme minha vontade. Minha família era a mais bonita que havia. Minha esposa era linda e meus dois filhos, um casal, eram verdadeiros Príncipes. Enfim Tia, parecia que eu não tinha mais nada para desejar na vida. Bastava que eu falasse uma coisa e todos corriam para me atender. Eu fui esse homem Tia Neiva… Tinha tudo, mas a verdade é que não tinha Amor por nada.

– Esse é o grande mal – Comentei – Quando não temos Amor no coração filho, a vida se torna seca, difícil…

– É, Tia, eu era honesto com minha família, com minha mulher, com meus negócios. Mas, sentia no íntimo que alguma coisa me faltava. Um dia… – Ele parou de falar e em seu olhar havia um brilho diferente, quando continuou com meiguice:

– Tia, a senhora vive falando sobre as Almas Gêmeas. Pois um dia esbarrei com minha Alma Gêmea. Interessante Tia, que nunca notara a presença daquela escrava. Era uma jovem bem clara e naquele dia quando eu me dirigia ao portão da casa, ela vinha com uma cesta de verduras e não me viu. Deu um encontrão em mim e as verduras se espalharam pelo chão. Ela ficou em pânico… Abaixou-se para catar as verduras chorando e implorando que não a castigasse. Queria até mesmo beijar meus pés na sua aflição e humildade. Fiquei reparando nela e alguma coisa despertou no meu íntimo. Senti que ela era diferente. Senti meu coração se encher de alegria com a presença dela. Então, peguei sua mão e a ergui, eu mesmo me abaixando e catando as verduras para recolocá-las na cesta. Ela paralisada pelo medo, me olhava com os lindos olhos marejados de lágrimas. Balbuciava desculpas e pedia que eu não a castigasse. Acabei de encher a cesta e me levantei, encarando aquela linda moça. Trocamos um longo olhar e acho que consegui transmitir a ela o que eu sentia, de tal forma que ela pareceu se tranqüilizar, acabando por dar um tímido sorriso. Eu é que me desculpei por minha falta de atenção, e fiquei parado vendo aquela figurinha tão querida, sumir entre as plantas do jardim levando sua cesta.

Desse momento em diante meus filhos, aquele Jaguar se transformou. Aquele encontro com sua Alma Gêmea – de que ambos não tinham consciência por estarem encarnados – despertou no coração dele o Amor. E o Amor transforma as pessoas. Enquanto caminhava para casa ia pensando no que havia ocorrido. Sentiu profundo desprezo pela fama que tinha ao lembrar a aflição de sua querida, o medo de ser castigada por algo tão banal. Aquela maneira humilde de pedir desculpas… Aquele olhar… Sim, decidiu que dali para frente não mais seria aquele tirano.

Em casa, à noite, não conseguia dormir. Os dias se seguiram e ele ficou isolado sem falar com ninguém, mal comendo, com o pensamento naquela escrava adorada, cuja presença ele não havia percebido até aquele dia. Não entendia o que estava acontecendo… Como podia não ter notado aquela meiga presença? Ansiava por vê-la e ao mesmo tempo temia como pudesse reagir a um novo encontro.

Seu comportamento preocupava a todos. Sua mulher achava mesmo que ele estava enfeitiçado, tal era a mudança que se operava nele. E um dia receberam a visita do Imperador.

A azáfama da recepção quebrou a rotina da Fazenda e até o Jaguar, saiu um pouco de seus pensamentos para receber o ilustre amigo. E na hora de servir o chá, quem se apresentou com a bandeja foi a bela escrava. Quando ela se deparou com o Jaguar começou a tremer tomada de emoção e desequilibrou a bandeja que caiu, despejando tudo sobre a mesa. A Sinhazinha que havia com sua percepção sentido a reação dos dois ao se olharem, ficou furiosa e chamou o Feitor para que retirasse imediatamente aquela escrava dali e lhe aplicasse terrível castigo. O Imperador que era muito galante e percebera a escrava encantadora, pediu que nada fizessem com ela. Era um acidente e pronto. Já tinha passado, não devia a moça ser castigada. Também o velho Jaguar interferiu, dizendo ao Feitor que não era preciso levá-la.

Essa reação mais raiva provocou na Sinhazinha, tomada pelo ciúme, já deduzindo que aquela bela jovem tinha algo a ver com a modificação que se passara com o marido. Ordenou ao Feitor que a levasse.

Logo que o Feitor saiu com ela, empurrando-a com brutalidade, o Jaguar foi atrás e mandou que ele a soltasse e que ela fosse para junto das outras escravas na Senzala.

Era a época dos Nagôs que trabalhavam muito com Espíritos e faziam trabalhos que os outros diziam que eram feitiços. Por isso a Sinhazinha achou que finalmente descobrira a causa de tão brusca alteração no comportamento do marido: Ele fora enfeitiçado por aquela escrava. Começou a perseguir a moça e o Jaguar percebendo tudo, procurou solucionar a questão. Arrumou um amigo de confiança e pediu que ele fizesse uma compra forjada daquela escrava para que ela pudesse escapar da Sinhazinha.

E assim foi feito. Comprada a escrava, parecia que tudo voltaria ao normal na Fazenda. O próprio Jaguar insistira para que ela fosse vendida, dizendo que já não agüentava ver à sua frente aquela mulher que tanta vergonha os haviam feito passar diante do Imperador…

Mas o que não sabiam é que o Senhor da Fazenda arranjara um sítio solitário e escondido onde a bela escrava foi se ocultar. E uma vez ali instalada, longe das garras da Sinhazinha, aquelas duas Almas Gêmeas puderam construir um pequeno mundo. Passaram a se encontrar e sempre que possível, o Sinhozinho corria a ver a sua amada.

O Amor das Almas Gêmeas é uma coisa sublime, muito lindo, pois nunca pode se erguer sobre as ruínas dos outros. Para a plena realização torna-se necessário que ambos estejam livres de compromissos. Mas o Sinhozinho tinha a família e, então, era preciso que acontecesse um verdadeiro milagre – como eles mesmo diziam – para que ele pudesse se libertar. A esposa, os filhos ainda pequenos, representavam uma verdadeira barreira para a plena vida daquele Amor.

O respeito da moça – que se chamava Rosa Maria – pelas responsabilidades do Jaguar, mantinha a harmonia daquele romance sem criar sofrimentos.

O tempo passou. Os filhos do Sinhozinho já mais crescidos foram estudar em Portugal. E naquele mundo de encantamento das duas Almas Gêmeas, teve início o último reajuste pelo qual deveriam passar para se libertarem totalmente. Lembrem-se meus filhos, que só retornamos às origens quando nada mais nos resta a resgatar. Vejam o exemplo de Aragana, que viu aquele cobrador a urrar de ódio, e submeteu-se a um julgamento para libertá-lo, a fim de que pudesse tranqüilamente voltar à origem.

Havia uma conta do passado. E para resgatar essa dívida, Rosa Maria concebeu um filho que seria aquele Espírito reencarnado para se reajustar com ambos. Mas, o fato de ficar grávida envergonhou tanto Rosa Maria perante o Jaguar, que ela perdeu o encanto pela vida. Achava que aquilo era uma falta de respeito para com seu amado, gerando uma responsabilidade que ele não tinha condições de assumir.

É que encarnados não se lembravam dos compromissos assumidos no espaço. Aquilo tudo havia sido tramado com eles no espaço, sob os desígnios da Lei de Deus, que lhes fornecia aquela oportunidade de resgatarem sua última dívida. Porque as Almas Gêmeas só se realizam quando nada mais devem, quando não têm mais qualquer obsessor e quando já atravessaram suas faixas cármicas positivas e negativas e podem, assim, retornar juntas às origens. Porque é muito bonito meus filhos, ver o trabalho das Almas Gêmeas. Uma ajudando a outra a evoluir e a se libertar. Quantas já não precisavam mais retornar à Terra, mas como estão mais evoluídas que a sua Alma Gêmea, reencarnam e sofrem para ajudar aquela a subir o degrau. Sempre com dedicação, com Amor. Uma beleza…

Mas, sem consciência de suas tramas no espaço, Rosa Maria sofreu com a situação, até dar à luz uma bela criança. Um menino clarinho, louro, com lindos olhos azuis. O nascimento do menino modificou a sintonia do casal. Rosa Maria passou a viver mais feliz e ambos se dedicavam com grande Amor àquela criança. Aquele Amor ia resgatando a dívida com aquele Espírito.

O menino crescia e o Sinhozinho estava totalmente modificado. Pela realização de seu Amor, pela sintonia com Rosa Maria, pelo tesouro que o menino representava em suas vidas, ele se transformara em um homem bondoso e amável. Tão bom que todos que o conheceram antes se admiravam. Havia mandado embora de sua Fazenda o malvado Feitor, aquele homem feroz que castigava e surrava os escravos e, tudo era administrado com Amor.

Isso é que eu gosto de mostrar a vocês meus filhos. O Amor é uma força poderosa, bendita, que não deixa que se possa fazer mal aos outros ou ferir alguém. Quando se ama, mas se ama realmente, a gente ama todo mundo. É filhos, o mundo inteiro a gente ama. Não sei quantos de vocês já puderam sentir isso, ter a oportunidade de viver um Amor assim, um Amor de respeito, um Amor que a gente respeita, que a gente sente realmente estar muito acima dessas baixezas… Duas pessoas que sentem um Amor verdadeiro, sabem se entender à distância, se falam no silêncio, se harmonizam a cada momento de suas vidas. Este é o Amor das Almas Gêmeas!

Muitos me falam que encontraram sua Alma Gêmea. Eu concordo, pois não quero causar tristeza. Mas, o Amor das Almas Gêmeas transforma as pessoas. Elas ficam boas, não pensam em fazer mal à sua família, não pensam em fazer mal aos outros, não desrespeitam a família. A primeira coisa que fazem é passar a amar também os outros, principalmente os filhos, mesmo que sejam fruto de ligações com outras pessoas.

Acho lindo o Amor das Almas Gêmeas no espaço. Têm a mesma paixão, a mesma vida como temos aqui. Muitas tiveram filhos na Terra e os buscam para, reunidos, viverem juntos em suas mansões do espaço. São tão felizes e se realizam tanto com seu Amor, que buscam levar a felicidade aos outros. Com essa intenção, protegidos pela vibração desse Amor tão puro, penetram naqueles pântanos sombrios, arrebatando das trevas muitos Espíritos que por ali se debatem.

Vejam o exemplo desse velho Jaguar: Era um tirano – e ele me mostrou muitas das barbaridades que havia cometido – e temido por todos. Um dia – um simples olhar modificou tudo. Pelo esclarecimento dos dois tudo se transformou, e ele se tornou tão bom que até mesmo no Palácio do Imperador se comentava o milagre de sua modificação.

A felicidade do encontro das Almas Gêmeas aqui na Terra, reside no fato de não terem compromisso com outras pessoas. Elas se encontram, se amam verdadeiramente, mas não podem desfazer os laços cármicos, seus laços transcendentais. Apenas porque se encontram, porque se amam, não podem abandonar seus lares.

E isso é o que havia acontecido com aqueles dois: tinham vindo apenas para resgatar aquela dívida, libertar aquele Espírito que estava encarnado como o filho dos dois.

Mas a Lei de Causa e Efeito sempre está em vigor. E um velho chamado Gregório, que muito havia sofrido naquela Fazenda a mando do Sinhozinho, soube da existência daquela criança e descobriu toda a situação. Impulsionado pelo desejo de vingança correu a contar tudo para a Sinhazinha. Não poupou detalhes malvados e aumentou muito as coisas, para fazer sofrer o mais que pudesse aquele que o tinham castigado um dia.

Atenção meus filhos! Temos visto muitos “Gregorinhos” e “Gregorinhas” por aí, sempre contando novidades – maior parte mentiras! Espalhando o ódio e a desconfiança entre esposa e marido, desfazendo lares, gerando desequilíbrios. Isso é muito perigoso. Quantos ao chegarem no dia de prestar contas vão verificar que com suas línguas, cortaram o carma de outras pessoas e não poderão pôr a culpa em ninguém, senão em si próprios, no seu coração ainda em evolução…

A Sinhazinha, enlouquecida pelo ódio e pelo ciúme por tudo que ouvira de Gregório, tramou em segredo a destruição de Rosa Maria e do menino. Aproveitando-se do ódio que o malvado Feitor nutria por ter sido despedido pelo Sinhozinho, conseguiu induzi-lo a realizar seu plano. Um dia, quando o Sinhozinho teve que ir ao Palácio ver o Imperador, o Feitor raptou Rosa Maria e o filho, levou-os para um local ermo, e ali os executou ocultando os corpos. Ninguém vira essa ação criminosa, de modo que quando o Sinhozinho voltou e foi correndo ao seu ninho de Amor, não encontrou sua amada nem o filho, nem qualquer orientação sobre o destino daqueles dois seres tão queridos. Também pelas redondezas, ninguém sabia informar o que teria acontecido.

Desesperado, continuou buscando-os por muito tempo, sem descobrir o que houvera. Mesmo mergulhado na dor e na aflição, a bondade daquele Jaguar superou suas forças. Continuou a ser bom e caridoso e testado por Deus, que quis saber até onde ia sua paciência, superou todo o seu desespero e completou sua missão na Terra, com aquela força bendita que o Amor lhe dera.

Sua jornada ainda continuou muitos anos. Na solidão, chorava a ausência de sua amada. Muitas noites quando mergulhava em seus pensamentos, vinha-lhe a certeza de que sua esposa tinha muito o que ver com aquele desaparecimento misterioso. Também não sentia ódio ou desejo de vingança. Lembrava-se de que Rosa Maria sempre lhe dizia, que chegaria um dia em que morreriam e poderiam ficar juntos para sempre, no céu. Mas, se ele fizesse alguma maldade, não seria possível o encontro, pois Deus não permitiria que gente ruim entrasse no céu. Ele lembrava dos olhos de Rosa Maria. Quando falava essas coisas, ficava brilhando como estrelas, como se tivesse certeza do que falava, como se o amor deles só pudesse atingir toda a plenitude depois que tivessem deixado essa vida. E porque a amava, tinha confiança nela e achava que o único meio de tornar a encontrá-la, seria manter-se acima do mal. Mas a dor da ausência de Rosa Maria tornara-o triste, e a vida era quase mecânica. Seu coração sangrava de saudade. Tornou-se Espiritualista. Continuou acompanhando sua esposa sem demonstrar sua desconfiança, mas a vida já não tinha mais prazer. Só existia para ele a lembrança daquele Amor.

Muitas coisas enfrentou até o dia de sua morte. Contou diversas passagens, e me admirei com a fibra daquele Jaguar. Era uma época terrível aquela. Muitos Espíritos haviam encarnado na Terra na missão de Evangelizar. Alguns mesmo vinham preparados para domar como se fossem animais, aqueles Espíritos de Imperadores, Centuriões, vestindo roupagens de Pretos Velhos e Escravos. Aquele Jaguar havia sido diferente. Morreu purificado pelo Amor, por suas boas ações, e sua câmara mortuária foi perfumada pelos Pretos Velhos, a quem vivia pedindo perdão pelos males causados outrora.

Pouco antes de morrer, soube de toda a trama da esposa, o triste fim que tinham tido seus amados. Mandou chamar Gregório e fez com que ele visse o punhal que atravessou em seu coração. Mesmo assim, perdoou-lhe e ainda arranjou meios de ajudar ao velho que tanto mal lhe causara.

Há muitas passagens lindas nessa história. Houve até o caso de uma aparição de Jesus ao sofrido Jaguar. Um dia contarei!

Quando desencarnou, Rosa Maria veio recebê-lo. É muito grande a felicidade do reencontro de duas Almas Gêmeas, preparado pelos Mentores. Pensavam que havia chegado o momento de seguirem a linda caminhada para a origem. Mas, ainda não era a hora. Havia permanecido aquele Espírito cobrador, do filho deles, que o ciúme da Sinhazinha não deixara realizar a missão do reajuste.

Era preciso reparar o destino daquela criança, que por culpa deles havia nascido em tão tristes circunstâncias. Era responsabilidade do Jaguar, que devia ter tomado as providências para evitar aquela gestação que o respeito impunha, pois não haveria condições para criar um filho. Com isso, ele criara uma responsabilidade a mais e teria que voltar à Terra para cumprir sua última missão.

Após o feliz encontro, Rosa Maria ficou triste sabendo que ainda teriam que esperar a conclusão dessa missão para poderem ir para a origem. Preocupava-se com seu amado, incerta sobre as condições dele para enfrentar mais essa prova. Ele fora um tirano, mas o Amor mudara completamente seu Espírito por saber Amar. Mas fora a presença de Rosa Maria que o havia despertado para o Amor. Agora ela não viria à Terra, como agiria ele?

Tudo foi preparado no espaço e quando chegou o momento, o Jaguar despediu-se de Rosa Maria e, triste pela separação se encaminhou para o sono cultural.

Quando o Espírito vai reencarnar, meus filhos, é uma tristeza maior do que a morte aqui na Terra. Ele vai partir para uma missão da qual tem consciência, sabe da responsabilidade e, corajosamente se entrega ao sono cultural, que vai apagar de sua consciência toda a memória transcendental, preparando-o para ser colocado no feto e nascer na Terra.

E o velho Jaguar, o velho Senhor de escravos, parte em busca do seu filho, o lindo menino louro de olhos azuis.

Mas Deus não diz para você que será tudo “bonitinho” nem os Mentores resolvem que será tudo fácil. Não! Ele por exemplo, iria voltar à Terra e desposar uma mulher que seria aquele mesmo Espírito da Sinhazinha – mau a ponto de mandar matar uma criança – e em meio a muitas provações e dificuldades, deveria salvar seu filho, Espírito que até aquele instante não perdoara a ele nem a Rosa Maria.

Na Terra o início foi relativamente fácil. Casou-se (com aquela que havia sido a Sinhazinha) e teve alguns filhos. Mas, esquecido dos planos do espaço pelo efeito do sono cultural, não entendia o vazio que sentia. Faltava alguma coisa que não identificava, para sua vida fazê-lo feliz, realizado. Perguntava a si mesmo porque aquela paixão pelas pessoas, pelas coisas, aquela insatisfação permanente. E o desespero começava a tomar conta de seus pensamentos, nas horas em que estava sozinho.

Foi quando nasceu um novo filho, um menino debilitado, com um aleijão na perna e que mais tarde quando começou a falar tinha dificuldades em se expressar, um pouco mais moreno do que os demais irmãos e, que o fez sentir algo estranho. Quando pegava o menino no colo, sentia um arrepio, uma sensação que não identificava, mas sabia ser de repulsão àquela criança. A mãe do menino também demonstrava total intolerância e até mesmo desprezo pelo pequenino. Vendo essa reação de ambos, o Jaguar superou tudo e passou a amar mais àquele filho do que aos demais. Também a criança ficou num grande agarramento com o pai.

Em seus sonhos o Jaguar se encontrava com uma moça muito bonita – Rosa Maria – que lhe falava na força do Amor, e pedia que ele sempre tivesse esperança em seu coração.

Sempre protegendo a criança do ódio da mãe e do desprezo dos irmãos, o Jaguar prosseguiu em sua missão. Ficou seriamente doente e o filho mais novo não se separava dele. Ficava ali atento ao que fosse preciso, dando-lhe água, remédio, preso pelos laços de uma profunda afeição.

Uma noite profundamente enfraquecido, estado em que se fica mais próximo da Espiritualidade, foi levado por aquela mulher de seus sonhos até uma casa onde havia uma criança. Esta estava muito mal, já para morrer. Os pais ali perto choravam a morte do filho, já não tendo mais nada a fazer. A criança com os olhos fechados parecia estar sofrendo muito. O Espírito do Jaguar ficou preso àquele quadro e se aproximou da criança que, abrindo os olhos percebeu a imagem do Jaguar e exclamou: “Papai!”.

Os pais se alvoroçaram, e o pai abraçou a criança certo de sua melhora, pois ouvira o chamado. Mas o Espírito do Jaguar percebeu emocionado quem era a criança, quando vira aqueles olhinhos azuis e sabia a quem ela chamara de pai. Sim, aquele era o seu filho, a quem buscava para resgatar suas dívidas do passado.

Mas, teve que retornar ao corpo e sua memória apagou-se quase totalmente. Ficou uma lembrança do menino, mas em sua fraqueza não sabia separar bem os fatos. Seu estado piorou e começou a delirar, falando de um menino louro de olhos azuis que era seu filho, que ele tinha que encontrar. Suas palavras não eram entendidas pela mulher e pelos filhos, que achavam ser tudo fruto de sua delicada situação de saúde.

Finalmente o mal começou a ser debelado, e ele teve a fase de recuperação povoada pela lembrança daquela criança. Irritado por não ser entendido pelos outros, criara em sua cabeça a necessidade de encontrar aquele menino, que ele sabia existir em algum lugar.

Já recuperado começou a andar pela cidade. Assim fazia um exercício e atendia à sua ânsia de descobrir a criança.

Andava certa vez pela beira do cais, quando o choro de uma criança chegou até ele.

Curioso aproximou-se de uma pobre casa de onde parecia vir aquele choro convulso. Um vizinho estava por ali e ele perguntou o que fazia aquela criança chorar tanto.

– É uma triste história – disse o vizinho – O pai desse menino trabalhava naquele navio ali e saiu com a esposa para dar um passeio de barco. O barco virou e os dois morreram. Restou o filho que está ai com esses parentes, mas, desde então chora como se nada o pudesse fazer calar…

Bateu à porta do casebre e uma pobre mulher o atendeu. Pediu para conhecer o pequeno órfão e entrou. Pôde ver então aquele menino por quem tanto buscava, por quem seu coração ansiava loucamente, chorando. Aquela linda criança loura com os olhos azuis…

Emocionado, pediu àquela gente que o deixasse levar o menino para cuidar dele. Foi atendido prontamente, pois os parentes estavam loucos para se verem livres daquele choro angustiado, e seria menos uma boca para alimentar.

Chegou feliz à sua casa. No trajeto para lá a criança se calara e aconchegara-se a ele como se estivesse acostumada com o seu colo. Sentindo-o em seus braços, o velho Jaguar sentia que amava muito aquele pequeno Ser. Um amor muito maior do que o que nutria por qualquer de seus filhos, até pelo mais novo.

Começou uma nova fase de complicações. Os laços de amizade tão profundos entre o Jaguar e aquela criança abandonada haviam despertado a inveja e o ciúme da família. A hostilidade da esposa – que na outra encarnação mandara executar o menino – era para com os dois. O tempo foi passando, e cada vez mais estreita era a amizade entre o Jaguar e o menino.

Mas o grau de maldade da esposa era tanto, um Espírito que não se abria para o amor, e assim, não evoluía e esperava uma oportunidade para se vingar daquela criança. E quando o esposo precisou ausentar-se um pouco mais demoradamente de casa, pegou o menino e o colocou para fora de casa. A pobre criança já com sete anos, não pode fazer nada senão afastar-se triste daquela casa, onde estava alguém que lhe era muito caro.

Retornando e não encontrando o menino, o Jaguar forçou a esposa a dizer o que havia feito. Ela confessou que havia mandado embora aquele estranho e não permitiria que voltasse.

Ele saiu em busca do menino e teve um palpite que poderia encontrá-lo onde o fora buscar – na beira do cais. Correu para lá e viu o garoto sentado, olhando o mar com o queixo apoiado na mão, como se aguardasse alguém.

Alegre pelo encontro chamou o menino. Este assustou-se com o chamado e levantou rápido de onde estava, virando-se para ver seu querido benfeitor. Mas, agitando os braços perdeu o equilíbrio e caiu do cais, naquele local cheio de pedras, madeirame e ferros batidos pelas ondas do mar.

Desesperado, o velho Jaguar correu e pulou na água. Diversas pessoas que estavam por ali tentaram ajudar, mas o destino havia marcado aquele desenlace. Morreram ali, pai e filho, tragados pelo mar.

Esse é o destino do homem meus filhos! Muitas vezes temos uma tristeza muito grande sem saber porquê. Muitas vezes o homem se casa e tem por obrigação honrar aquele casamento, os filhos que dele nascem, mas em seu íntimo não está feliz. Porém, existe uma responsabilidade maior: o destino cármico. Ninguém pode ser feliz, feliz mesmo, se não terminar a sua missão, se não libertar seus cobradores.

Imaginem que aquele filho mais novo, moreno, do casal, era o Espírito do velho Gregório, que apesar de seus defeitos físicos, amou muito aquele a quem tanto mal fizera e por ele foi amado. Foi aquela mulher que tanto mal fizera que o recebeu no ventre e, pela bênção de Deus o criou com cuidados, mas sem amor. Mas Gregório conseguiu resgatar suas faltas, pelo amor daquele a quem tanto fizera sofrer.

E no desenlace da história, quando o homem e o menino desencarnaram no mar, seus Espíritos se reencontraram com Rosa Maria e juntos, felizes, foram para sua origem.

E a Sinhazinha que voltara agora como uma simples dona de casa, não evoluiu, não aproveitou a chance que lhe foi dada, e nada fez de bom. Então, seu sofrimento será grande. Deverá voltar várias vezes, para subir seus degraus na Evolução.

Mesmo assim, ela foi objeto da ajuda dos Espíritos do Jaguar e de Rosa Maria, que entenderam que tudo que ela havia cometido servira como degrau para a libertação deles, através da Evolução. Na realidade, fora a Sinhazinha que preparara a subida dessas Almas Gêmeas.

Por isso, jamais devemos nos queixar de Deus. Ele nos dá tudo, nos proporciona os meios para nossa libertação. O conhecimento, a consciência, é que nos impulsionam no caminho certo. Ele nos dá força antes de chegarmos aqui e, chegamos preparados para cumprir nossa missão. É errado só se desejar coisas boas e reclamá-las de Deus. Pelo sofrimento, conseguimos nossa libertação, nossa Evolução. Nem Deus, nem nossos Mentores, nos seguram para que possamos subir os degraus de nossa jornada. Temos que caminhar por nós mesmos, com nossas próprias pernas. Deus nos dá tudo…

Salve Deus!

Com carinho,

A Mãe em Cristo.

Tia Neiva.

 

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Templos do Amanhecer

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Tiãozinho e Justininha

12 - Tiãozinho e Justininha-pSalve Deus!

Meu filho Jaguar:

Em uma bela Fazenda situada no município de Ponta Porá, Estado do Mato Grosso, tendo como proprietário o Sr. Germano Perez, com sua esposa Dona Guiomar Perez e seus três filhos…

Sua filha mais velha, bela mocinha nos seus 14 anos de idade, cabelos compridos e louros, olhos negros “rasgados”; a bela jovem chamava-se Justininha Perez.

Ali vivia em completa harmonia esta honesta família. O Sr. Germano tinha grandes negócios de animais em criação de variável qualidade. Apesar de sua nacionalidade paraguaia, já sentia-se naturalizado brasileiro.

Em 1915, eu, Sebastião Quirino de Vasconcelos nos meus 18 anos de idade, filho de dois velhos fazendeiros de Mato Grosso, Joaquim de Vasconcelos e minha mãe, Dona Persínia Quirino de Vasconcelos. Meus pais muito me amavam, por ser eu firme administrador dos nossos bens…

Certo dia então, meu pai chamou-me e deu-me uma quantia em dinheiro dizendo:

– Meu filho, já tens um pouco de estudo e melhor seria para nós se não precisasse sair daqui. Porém, podias ir até Ponta Porá comprar uma partida de gado e soltar nestas invernadas. Esta é a melhor maneira de empregar o teu dinheiro. Dizem que na Fazenda Perez, tem um gado sadio e por bom preço. Sim meu filho, em breve casará e deves desde já cuidar do teu futuro. Vá meu filho, aproveita estas invernadas.

Três dias depois destes conselhos, equipei uma tropa de bons animais, com 5 vaqueiros armados com seus Bacamartes(1) de chumbo grosso. Sim, era muito perigosa aquela região, infestada de onças traiçoeiras… Levei também dois Comandantes, peritos em guiar boiadas e um crioulinho por nome Zeferino, de minha inteira confiança, pois o mesmo fora criado junto comigo fazendo nos considerar irmãos. Porém, eu era bem claro e ele pretinho como piche. Levamos cargueiros com apetrechos de cozinha. Com a bênção dos meus pais, as recomendações de minha boa mãe, partimos com destino a Ponta Porá.

Gastamos longos 20 dias. Ficamos conhecendo uma porção de lugarejos, onde parávamos para descansar os animais…

Muitas moças namorei na minha bela idade.

Então chegamos na bem formada Fazenda de criações. Ao chegarmos fomos recebidos por um senhor gordo, de aspecto bonachão. Veio ao nosso encontro dizendo ser o Sr. Germano. Mandou-nos entrar e deu ordens para nos servir o jantar. Depois fomos nos sentar na ampla sala de visitas, quando entrou uma mocinha com belas tranças, em sua graça angelical. O senhor Germano disse:

– Justininha, minha filha! Venha até aqui conhecer estes cidadãos. E, apresentando sua filha, nos disse em seguida: – Esta é a minha filha mais velha; ela, coitadinha, é muito acanhada e não gosta de festas, não sai de casa a não ser na casa de sua tia, muito sistemática esta menina. Todos pegaram sua mão em cumprimento. Porém, ao chegar diante de mim, olhamo-nos como se já tivéssemos nos visto em outras eras. Senti arrepios percorrerem todo meu corpo.

Depois de passar aquelas primeiras horas, o senhor Germano propôs com Dona Guiomar, que era também uma senhora muito alegre, dizendo:

– Vamos pegar os instrumentos e cantar até a hora de dormir. Todos apoiamos a boa idéia. Vieram alguns tocadores, chegaram também algumas mocinhas. Todos cantavam enquanto os donos da casa, muito alegres, serviam bebidas, doces, biscoitos…

Passado algum tempo, ouviu-se uma exclamação do velho fazendeiro ao deparar-se com sua filha Justininha ali sentada. Sim, pois não era seu costume permanecer em reuniões daquela espécie. O senhor Germano muito satisfeito com a transformação de sua filha, disse:

– Justininha agora vai cantar uma canção oferecida aos viajantes! Ela, muito acanhada, chegou perto de um violonista e começou:

Meu amor nunca chega
Eu me canso de espera
A garça branca me disse
Que ele não ia demorar

Papaizinho me consola
Garça branca vai buscar
Não é mentira do papai
Meu amor já vem pra cá

Todos batemos palmas. Era uma criança aquela bela criaturinha. Depois pediram que eu cantasse. Eu que já me sentia todo apaixonado pela bela Justininha, segurei o violão e comecei:

Morena minha morena
Morena dos sonhos meus
Lábios da cor de verbena(2)
Morena dos olhos meus
Deus por te fazer criança

Deu-te entre as flores mais belas
Dando tua alma de esperança
O teu olhar de estrelas
Quero dormir em teus braços
Aos gozos do coração
Minha alma assim não resiste
Com tanta ingratidão

No mar de tuas madeixas(3)
Quisera me naufragar
Teus olhos negros me matam
De singeleza sem par

Ao terminar todos vieram cumprimentar-me e o senhor Germano disse:

– Jovem! Tens uma bela voz. Acredito mesmo que deixou muitos corações apaixonados…

Hora de dormir, todos foram se retirando e eu fiquei ali junto de uma fogueira ainda meio acesa. Cheguei a distrair-me pensando: É verdade. Sempre sonhei com uma criatura como esta. Sinto mesmo ter matado toda a saudade que vivia alimentando sem mesmo saber por quem. E, com toda aquela paixão, continuava com meus pensamentos quando senti a presença de alguém chegando às minhas costas. Virei-me e qual não foi a minha surpresa… Ali estava ela com sua saia bem comprida, seus cabelos soltos a uma echarpe(4).

Senti fraquejar as pernas. Se não estivesse sentado, por certo teria caído. Ela disse: – Meu paizito mandou-me vir ter contigo, porque disse que tu és jovem de bela família e sente-se triste aqui entre nós. Depois com uma “falinha” angelical continuou: Sabe senhor Sebastião, eu quero que o senhor cante novamente aquela canção, gostei tanto! E escondendo seu lindo rostinho perguntou: – Foi para mim que o senhor cantou? Se foi para mim, recite-a agora, sem música, quero ouvi-la novamente.

Eu que não tirava os olhos daquela pequena fada, disse: – Dona Justininha, a senhora quando cantou, disse que seu amor estava longe, porém já vinha para ti, é verdade que ele existe e que teu pai bem o conhece? Responda-me porque eu a amo e quero que seja minha esposa. Ela sorriu e respondeu:

– Não, não! Eu não tenho nenhum amor… Sinto uma grande saudade, que eu mesma não sei de quem, só sei que ele existe e um dia chegará e me levará para longe daqui. E, virando-se para mim, perguntou: – O senhor vem de longe, muito longe?

– Sim! (Respondi e perguntei) – E tu, tens coragem de casar-se comigo e juntos irmos embora?

– Sim, sim! (Respondeu ela) – Se és tu o meu amor, casar-me-ei e partirei; isto é, se papaizito e mamãezita consentirem. (e concluiu) – É verdade! Tu cantaste para mim. Porém não gostei, porque parecia que olhavas com ternura para Marinalva, aquela sirigaita(5) que eu não suporto… E tu também bateu palmas quando cantou a Maura. Sabe? Não gostei. Fiquei um pouco sem graça, quase com raiva e não quis mais cantar. Eu que já ia cantar uma canção tão linda para você. (e concluiu com firmeza) quando você quiser alguma coisa, peça para mim que eu mesma virei trazer-te. Pode dirigir-se a mim, ouviu? Não precisas pedir nada as outras moças. Eu mesma o atenderei.

E ao ouvi-la, pensei: Como é singular esta moça! Cada vez mais me sentia apaixonado por aquele anjo. Disse-lhe então: – Justininha, nada quero com estas moças. Estou apaixonado por você e quero casar contigo se teus pais consentirem. Amanhã irei embora, e marcaremos um dia para eu voltar e pedir-te em casamento…

Logo depois chegou o senhor Germano dizendo: – Meu rapaz, estás de parabéns, porque minha filha bem parecia um bichinho e, no entanto, pelo que vejo tornou-se sua amiga. Parabéns meu jovem, parabéns.

Sorri como resposta e fomos dormir.

No outro dia bem cedo, entramos em negócio do meditado gado, fiz o devido pagamento, juntei meus empregados e tudo ficou pronto para partir. Na hora da despedida, fui ter com os velhos. Senhor Germano contou-me então que tinha muitos anos ali e que sentia vontade de passear um pouco com a família. Foi então que ofereci nossa casa, ficando marcado assim: Logo que pudessem iriam passar uns dias conosco em nossa fazenda. Justininha veio ao curral despedir-se de mim. Disse-lhe que logo eles conheceriam também os meus pais. Ela saiu chorando e eu senti algo atravessar minha garganta a sufocar-me. Parti com meu povo, levando o gado que contava 500 cabeças. Passávamos por outros lugares, porém eu não tinha mais alegria. Meu coração ficara ao lado da pequena paraguaia. Os meus companheiros riam-se de mim dizendo: – A paraguaia parece que prendeu o coração do patrãozinho! Os outros sorrindo confirmavam: – É verdade, pelo que vemos vai ter festança em breve. E continuavam brincando comigo.

Na verdade eu já sentia ânsias de gritar aquele amor que me sufocava o peito. Notei então, que Zeferino estava como eu. Sentindo vontade de saber a causa de sua tristeza, fui ter com ele e ficando nós dois a sós, perguntei-lhe o que estava acontecendo. Ele baixou a cabeça e disse quase a chorar: – Tiãozinho, é verdade, gostei daquela crioulinha por nome Tianinha, que foi criada com Dona Guiomar. Não sei Tião, mas se eu não me casar com ela, morro de paixão. E sei que ela também morre.

Eu que tudo escutava fiquei boquiaberto. Resolvi então contar a minha situação pela linda paraguaia, e animei-lhe dizendo que tudo faria para vê-lo feliz. Ele ficou tão alegre que agarrando-se ao Bacamarte, mirou ao alto disparando um tiro de salva ao nosso colóquio. Sob o impacto do estampido, tivemos tanto susto que quase caímos de costas. Depois sorrimos ao vê-lo alegre a dizer: – Vou me casar com Tianinha, vou me casar! Convido a todos para o meu casório…

Depois daquele descanso, seguimos novamente nossa viagem.

Assim, sofrendo e brincando chegamos em casa. Minha mãe e meu pai já estavam preocupados e saudosos. Fizeram grande festa à nossa chegada. Fui então ter com Martinha, minha antiga namorada a qual muito surpreso me deixou. Nos meus dois meses de viagem, ela ficara noiva de outro…

Nos dias mais calmos eu ia contando aos meus pais tudo o que se passara na viagem, em casa do senhor Germano e até mesmo como nos tratou o bom senhor. Cheguei a contar que Zeferino pretendia casar-se com a Tiana, contando mesmo todos os pormenores. Meus pais ficaram então simpatizando com a tal família, a ponto de desejar sua visita.

Passara-se um ano e eu já não tinha paz de espírito, senão pensar na minha bela paraguaia. Zeferino começava a perder as esperanças. Foi então que chamei meus pais e pedi que mandassem um portador com um convite ao senhor Germano para vir passar o Natal conosco. Logo o mesmo partiu e ficamos à espera. Passados alguns dias, chegou a notícia que chegava toda a família Perez.

Eu estava em um dos currais quando quase sem fala, chega Zeferino correndo e agarrado em meus braços gritava e pulava: – Chegaram! Chegaram! Ela já estava lá em casa. Saí também correndo. Ao longe já se viam os animais parados à porta. Foram dias de grandes festas, os velhos ficaram muito amigos e tudo era alegria. Alguns dias depois foi celebrado o casamento de Zeferino e Tiana. Um mês depois também o meu. Ela vestida de noiva parecia o símbolo da pureza, porém os seus ciúmes eram os mais engraçados possíveis, todos riam dela.

Fomos morar em um retiro perto da sede da fazenda. Lembro-me bem que já estávamos com dois meses de casados e em uma das vezes que fomos visitar os meus pais, lá encontramos umas moças, minhas primas que vieram de Parnaíba visitar-nos. Justininha, ao vê-las ficou com raiva, dando suas birrinhas. Tive então que retirar-me dando desculpas, que não podia ficar ali por motivo de visitar Zeferino. Quando já íamos saindo minhas primas vieram ao meu encontro pedindo que não fosse. Porém, Justininha ergueu-se com um gestinho altaneiro e disse:

– Respeite, ouviram? Ele é meu esposo e quem manda sou eu. Por isso Sinhás Corujas, cheguem perto pra ver…

Depois, virando-se para mim falou: – E você, não gostou?

Fui até onde ela estava, peguei-a nos braços e dei-lhe um beijo, sorrindo daquela cena.

Sim, meus irmãos, quando amamos verdadeiramente, quando estamos com nossa alma gêmea, estamos com a mais doce das mulheres, e em geral aquelas são, aos nossos olhos as mais divinas e belas, originais! Por este amor perdoamos tudo, em recompensa do que nos traz. Éramos eternos namorados, porém seus ciúmes continuavam. Eu bem compreendia, a ponto de achar graça nos seus tão infantis caprichos. Já estávamos com cinco meses de casados quando resolvemos passear na casa de minha tia, onde eu estudara.

Tudo combinado, partimos. Todos em casa gostaram da idéia.

Com todas as recomendações dos velhos seguimos em direção à cidade de Parnaíba. Ao avistar o grande rio senti medo; porém nada disse. Entramos naquela embarcação, em meio ao rio senti que não estávamos seguros e segurei em meus braços o meu amor…

Senti a morte; porém, o resto foi tão repentino que não posso bem descrever. Depois desta perturbação escutei o grito de Justininha que me dizia:

– Tiãozinho! Saia de perto dessa Coruja. E virando-se para uma moça que estava ali junto, continuou: – Saia de perto do meu esposo, Sinhá Coruja! Ele é meu esposo, viu?

Vimos então, que a moça olhava ao longe aquela fatal Chalana(7). Sim, a Chalana que acabava de afundar nas águas do Parnaíba. Depois escutamos gritos de desespero… Olhamo-nos e bem compreendemos que não éramos mais deste mundo exterior. Sim, ali esperamos algum chamado para outras moradias.

Depois de algum tempo assistimos quando chegaram os nossos restos mortais. Justininha tudo reparava e ria achando graça de tudo. Porém, se alguma moça dizia qualquer coisa a respeito do meu cadáver, ela brigava e dizia coisas que me faziam rir. Tudo ali era novidade e motivo de riso para nós. Começava a escurecer e então comecei a temer. Que devia fazer? Ela parecia um passarinho, continuava junto a mim. Era o que me preocupava, sua inocência e sua confiança em mim a tirava de qualquer pensamento mau. Chamei-a e disse:

– Justininha! Somos Espíritos e o Mundo dos Espíritos me parece ser outro longe daqui. Vamos pedir a Deus para que nos mande um Guia seu, para bem nos guiar, pois não sabemos o caminho e temos que chegar até lá.

Ela começou a rezar a ladainha de Nossa Senhora. Eu sabia apenas a Ave Maria, que minha tia havia ensinado. Chegou então um Fidalgo(8) que disse chamar-se Netuno; porém, tivemos medo e não queríamos acompanha-lo e então, começamos a sofrer de um lado para o outro. De quando em vez, nos apareciam aqueles Espíritos que mais pareciam bichos(9), vinham tentando nos agarrar, porém nós começávamos a chamar por Deus e na mesma hora eles se afastavam.

Já estávamos cansados de tanta perseguição, quando chegou novamente o Fidalgo e nos disse:

– Meus filhos! Sempre fui protetor de vocês e no entanto temem, pois se esqueceram de mim. Agora, escutem o que vou dizer-lhes… Nisso ia passando um casal de encarnados e ele então confirmou: – Sim! Vocês são Espíritos! Vou dar-lhes mais uma prova. Vá Tiãozinho, pegue Justininha e passem por eles, falou apontando o casal. Sim, lembro-me, passamos por eles, o casal apenas revelou sentir arrepios e continuaram caminhando. O período que passamos vagando começara a nos deixar em dúvidas quanto a termos ou não desencarnado.

Voltamos então ao nosso Instrutor e o mesmo disse:

– Agora vamos até onde está aquele pequeno grupo de senhores. Era um grupo de homens que conversavam animadamente sobre seus negócios materiais. Passaram-se alguns minutos (nós entre eles) e começaram a sentir-se mal. Um queixava-se de sua enxaqueca, outro dizia estar sentindo um grande peso nas costas… Enfim, se foram deixando-nos a sós. Eu então perguntei a causa daqueles transtornos naqueles senhores, que antes de nossa chegada pareciam nada sentir. Ele sorriu e nos disse:

– Quando vocês passaram pelo casal, tanto quanto em meio aos senhores, lhes foram fornecidos os necessários fluídos(10), força vital. E levando-nos a um certo lugar(11), continuou: Agora procurem ver o quadro dos seus feitos…

Foi então que tudo se clareou para nós. Não tivemos mais medo do nosso Protetor, e seguimos a um Plano de Readaptação(12).

Passamos então sob as exigências da Hierarquia Espiritual.

Hoje, após várias Missões, inclusive em nosso lar(12). Agora aqui estamos, integrados à Missão do Grande Seta Branca. Somos também Jaguares, junto a vocês, Mestre Sol e Mestre Lua, Doutrinador e Apará…

Salve Deus.

Com carinho,

A Mãe em Cristo Jesus.

Tia Neiva

NOTAS DO TEXTO

(1)   Bacamarte –  Antiga espingarda de cano curto e largo;

(2)   Verbena – Espécie de flor vermelha;

(3)   Madeixa – Porção de cabelo, mecha, trança;

(4)   Echarpe – Faixa de tecido que as mulheres usam como adorno;

(5)   Sirigaita – Mulher que sacoteia muito. Ladina. Tem resposta para tudo;

(6)     Chalana – Pequena embarcação de fundo chato, costados verticais, proa e popa finas e iguais, usada no tráfego de pequenos rios e igarapés;

(7)     Fidalgo – O Mentor Espiritual se apresentou ao casal com tipo de roupa (Indumentária) que lembrava Fidalgos na terra;

(8)     Pareciam bichos – Espíritos Sofredores adoecidos, deformados;

(9)     Fluídos – Fluído Magnético Animal, Força Vital, Ectoplasma;

(10)     Um certo lugar – Tiãozinho não citou o nome, mas, são vários “pontos” no espaço com esta função, no caso da “nossa região” atual, essa espécie de contato é realizada num local por nome “Pedra Branca”. Lá o Espírito recém desencarnado fica normalmente 07 (sete) dias, onde tem contato com imagens daquilo que fez e, sobretudo, do que deixou de fazer quando encarnado;

(11)     Plano de Readaptação – (Nosso Lar) Importante Casa Transitória do Mundo Espiritual, similar ao Canal Vermelho (Plano de Readaptação). Há inclusive uma obra literária muito conhecida, sob o mesmo nome, editada por Francisco Cândido Xavier, ditada pelo Espírito André Luiz;

(12)     Tiãozinho e Justininha – Com o início da missão de Tia Neiva, Tiãozinho recebeu incumbências junto a ela, principalmente devido aos laços espirituais que os unem há séculos. Manifestava-se através da Clarividente de maneira alegre e simples, falando numa linguagem natural do interior de Mato Grosso, aparentemente simplório. Todos ficavam à vontade e ele alegremente ia proporcionando Mensagens, profundas lições de amor, batendo palmas, manipulando… Em Capela (*) seu nome é STUART, um Engenheiro Sideral. Tem o Comando de sua própria Nave (**) e é responsável pela “Torre de Desintegração”(***). A história registrada nesta pequena obra, narra sua última encarnação neste planeta, quando reencontrou-se com Justininha, sua Alma Gêmea, e pouco tempo depois do casamento, morreram afogados no naufrágio de uma balsa.

 

(*) Capela – Planeta Mãe, Origem;

(**) Nave – Nave que vem de Capela (Amacês, Estufas, Chalanas);

(***) Torre de Desintegração – Localizada “num ponto do espaço”, onde tanto os Espíritos (Capelinos) quanto suas naves, por ali passam, desintegram sua condição molecular natural, passando para “Matéria Etérica”, assim operando entre nós.

PEQUENAS HISTÓRIAS SOB OS OLHOS DA CLARIVIDENTE NEIVA

12 – Tiãozinho e Justininha

Templos do Amanhecer

CASTELO DOS DEVAS – VALE DO AMANHECER

 

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O Amanhecer das Princesas na Cachoeira do Jaguar

11 - O Amanhecer das Princesas na Cachoeira do Jaguar-pCapítulo I

            Salve Deus!

            Meu filho Jaguar:

            De todos os males, o mais triste que deixamos em nossas passagens é a cicatriz de nosso mau comportamento. Quando estamos na Terra vivemos seguros no orgulho, principalmente no egoísmo.

            Muitas vezes sentimos necessidade de chorar, de sorrir, de amar; ou melhor, pensamos em ser amados, mas nunca desejamos amar incondicionalmente para melhor atrairmos ao nosso favor… Não! Pelo contrário, exigimos de alguém o que nos convém, sem querermos oferecer nada em troca.

            Salve Deus meu filho! Vamos sentir a vida das Princesas e melhorar o nosso comportamento a respeito do Amor.

            Sim, as crioulas Princesas em 1700 no Brasil Colônia, anunciavam o seu tempo de evolução nas senzalas, a dor no destino cármico de um povo em desenvolvimento.

            Então, tudo começou a vibrar quando os dois Grandes Missionários, Pai Zé Pedro e Pai João, resolveram agir no campo vibracional de nossa missão, com este imenso Amor ouvindo e sentindo o céu, nos poderes de Vô Agripino, que emitia aos mesmos toda a Luz do Santo Evangelho.

            Aos 14 anos Pai Zé Pedro e Pai João, que regulavam em idade, vieram no mais triste quadro em um navio negreiro para o Brasil. Eram duas personalidades com idéias transcendentais traçadas do céu…

            Então estes dois Espíritos levaram em frente a sua obra; se prepararam nos Planos Espirituais e vieram para a Terra cumprir a sua missão, que seria em nossa última orientação a nova estrada do Jaguar na Linha do Amanhecer.

            Vendidos por navios negreiros no Brasil, por Deus se encontraram pela força do seu compromisso no sul da Bahia, onde a forte e verdadeira mensagem os impulsionava. Então, juntos desenvolveram as suas Faculdades Mediúnicas. O Senhor de Pai Zé Pedro era um homem muito bondoso, que ouvia o Grande Africano e amava as suas palavras, chegando a se converter e comprou também Pai João, deixando-os fazer na senzala o que lhes aprouvesse.

            E tudo começou assim:

            – Eram seis fazendas reunidas, onde Jurema e Juremá as gêmeas, eram muito queridas por toda aquela redondeza. Sua graça e beleza demonstravam “Herança Transcendental” de Altezas. “SIM, O HOMEM NÃO SE PERDE, SE REENCONTRA”. Então, a grandeza dos Missionários se fazia projetar por toda aquela região. Toda redondeza se juntava ali em busca da caridade. Ninguém entendia porque naquela Era tão crua de senhores tão arrogantes, pudessem eles admitir tanta liberdade. Pai João pregava a Doutrina do Amor, aliviando o chicote dos senhores. Pai Zé Pedro tocava os tambores para alertar o seu povo em outras fazendas vizinhas de Iracema, Jandaia, Janara e Iramar, contando também com Janaína, pequena Sinhazinha que muito amava os Nagôs, segundo se falava naquela Era. Eram jovens com apenas 18 anos, que sofriam as incompreensões de suas Sinhazinhas, as perseguições e seduções dos seus sinhozinhos. Era uma desdita naquele tempo o que sofriam essas Escravas Missionárias, porém, na senzala de Pai Zé Pedro tudo ia muito bem, vinha gente de longe e as curas se realizavam com tanto Amor, a ponto de se propagar o Africanismo com a sua presença.

Era o dia de Jurema e Juremá, a Lua surgia no céu prateada, os tambores ressoavam. Jurema em pé na soleira da sua Senzala vibrava cheia de Amor, esperando Juremá e sua mãe. De repente um crioulo que também fazia parte do Corpo Mediúnico, disse tremendo de dor: – Oh Jurema tua mãe não irá conosco. Amamentou a filha da Sinhazinha com febre e a febre passou para a nenezinha. – Cadê mamãe? – Tua mãe Jurema, está no tronco. – Oh! Coitadinha. Oh! Meu Deus! Gritou Jurema e segurando no portal da Senzala sentiu o seu Espírito se transportar seguindo até as ruínas de Pompéia. Jurema em sua visão se sentiu uma rica Princesa entre sedas e jóias. A sua irmã e também todos aqueles crioulos da Senzala, a negra que hoje era sua mãe, ridicularizavam uma jovem escrava, hoje a Sinhazinha da Senzala. Jurema compadecida da jovem que até então era uma visão, se esqueceu da tragédia que na realidade estava acontecendo. Não! Ela não via a sua mãe no tronco que era a realidade. Via somente a jovem escrava arrastada e ridicularizada, onde todos vaiavam chegando mesmo a machuca-la, e em meio desta alucinação começou a gritar: – Juremá, volte minha mãe! Saiu então decidida para o Congá. Chegando contou tudo o que se passava a Pai João e ele lhe explicou:

            – Filha não chore, não se desespere! Eu, você, sua mãe e todos os seus irmãos vivíamos na mais rica vida em Pompéia. Eu era Procurador, Zé Pedro era Imperador e todo esse povão estava lá. Só Deus sabe minha Jurema os desatinos, as tragédias que provocamos naquele Império. Fizemos a mais terrível escravidão. Hoje filha querida, Deus nos deu esta oportunidade de pagar todo este mal. Esta pequena Sinhazinha é o Espírito da jovem escrava de Pompéia.

            – Então Pai João, como tudo terminou? Pai João colocando a mão em sua cabeça disse:

            – Dorme filha, dorme Jurema. Deitada com a cabeça no colo de Pai João, adormeceu dizendo baixinho: – Oh meu Fidalgo Centurião, como pode me abandonar neste caminho tão espinhoso! Onde vives que eu não posso te alcançar? Sim meu Fidalgo, continue acariciando os meus cabelos que ficaram tão longos… Nisto um grito e ela se levantou decidida – Não voltarei para minha Senzala, vou-me embora daqui! Com muito custo Jurema conseguiu se acalmar. Os tambores recomeçaram, mas Jurema pensativa não saiu do seu lugar. Pai Zé Pedro iniciou os Trabalhos e veio se sentar perto dela e de Pai João. Jurema segurou em suas pernas, depois apoiou novamente sua cabeça na perna de Pai João que ali não sentia com coragem de se levantar. – Jurema minha filha (disse Pai Zé Pedro) – Choras pela tua mãe? – Não Pai, choro porque vi e perdi o meu amor AGRIPA, o meu amor. Eu o vi acariciar meus cabelos e passando a mão na cabeça meio sem graça disse: – Oh! Paizinho Nagô, é tudo tão diferente… – Sim filha, se acalme! Eu vou lhe mostrar onde e como se encontraram. – Não Pai, não quero! Se ele for aquele crioulo feio do Japuacy, não quero! – Ele não está aqui como vocês estão, todos nós estamos, e ele não pode, não admito que seja feio como nós. Os dois deram uma risada. Meio preocupado disse então Pai João:

            – Veja no que dá a Clarividência de uma pobre jovem. Ela voltou a dormir. Pai Zé Pedro e Pai João vibravam preocupados. O que fazer? Leva-la para a Cachoeira do Jaguar? Deus Todo Poderoso, só Ele poderá traçar este destino… E ali ficaram esperando a jovem despertar, para decidir o seu destino que tanto se agravara.

            Sim meu filho Jaguar, na próxima semana Jurema já estará despertada, então saberemos do destino feliz desta tribo e com cuidado, vamos nos encontrar como personagens desta história, que até então é um pequeno roteiro.

            A Mãe em Cristo,

            Tia Neiva.

            Vale do Amanhecer, 08 de dezembro de 1979.

 

Capítulo II

            Salve Deus!

            Meu filho Jaguar:

            Deus de fato, toma cedo ou tarde o partido dos que se dizem inocentes. Porque o Cristianismo surgiu por canais piedosos numa Era difícil. A Alma e o Perispírito são sempre os mesmos e por esta força, se opera pelo compromisso ao Etéreo e se desenvolvem na vontade de Deus.

            Sim, Jurema dormia. Os escravos não sabiam sair da Senzala e o dia começava a raiar. Pai Zé Pedro pediu a Pai João que a deixasse sob seus cuidados, que ele determinaria outros para zelar da pequena Jurema. Pai João era escravo recente naquela Senzala.

            O Feitor chegando inesperadamente à soleira gritou e todos tomaram um rumo, exceto Pai Zé Pedro que era protegido do Sinhozinho. – Quem é essa crioula Zé Pedro? – É Jurema, que desde ontem não quer se levantar. Está sofrendo pela mãe que está no tronco. – O quê? (exclamou o Feitor) – Quem já viu uma crioula com um mimo destes? Mimo é para Sinhazinha. Vou levanta-la agora mesmo com este chicote. E marchando para a cama de Jurema, fez menção de levantar o chicote quando se ouviu o grito de Pai Zé Pedro:

            – Se arremessar eu o mato! E o seu grito foi tão grande que se fez ouvir em toda redondeza, enfurecendo ainda mais o Feitor que arremessava o chicote de qualquer jeito, blasfemando horrores e ameaçando contar ao Sinhozinho de Jurema.

            – Não! (gritou Pai Zé Pedro) – Não fará! Os Ferreiras são muito malvados, não fará! Ouviram a risada sarcástica do Feitor. Então não se sabe como, centenas de negros apareceram intimidando o Feitor apenas com suas presenças; Nagôs que já tinham ganho sua alforria pela velhice e pela doença. O Feitor que agia escondido do Sinhozinho saiu dali calado e foi avisar sobre Jurema. Foi um reboliço. O Senhor de Pai Zé Pedro mandou chamá-lo e pediu notícias do que estava acontecendo. Pai Zé Pedro disse que havia sido por malcriação da pequena crioula.

            – O que devemos fazer? Enquanto falava, o Senhor de Jurema já estava na Senzala e como um raio já tinha Jurema desmaiada em seus braços, espraguejando de raiva. – Tanto a mãe como as filhas são feras, são irresponsáveis, são negras malvadas, imundas! Estes Nagôs… não tenho palavras para suas blasfêmias.

            De repente ouviu-se um estampido na serra e todos correram para olhar ou chegar mais perto, quando todos gritavam: – Afastem-se, afastem-se! Juntem as armas, atirem! Não deixem que eles desçam até aqui!

            Sim. Todos corriam abandonando a fazenda, menos Pai Zé Pedro e Pai João que correram para proteger os seus Senhores da Casa Grande.

            Era horrível. Trapos de negros revoltados pela escravidão. Arrebentavam tudo por onde passavam, matavam as crianças, levavam o que podiam; inclusive animais, etc. Em meio daquele pânico os negros chegaram e Pai Zé Pedro na soleira, gritou em voz alta:

            – Parem, parem!

            Um silêncio muito grande se fez ouvir. Os negros estacaram e ficaram como que petrificados.

            – Sigam seus destinos, levem algumas leitoas e vão-se embora.

            – Tem alguém no tronco? (perguntaram) – Não, aqui não encontrarão nem tronco. O meu Senhor é o meu filho (continuou Pai Zé Pedro). Nisto Pai João saiu de trás de uma árvore muito grande que tinha na frente da Casa Grande, e um crioulo em cima de um cavalo deu um tiro ferindo seu ombro. Jurema já havia se libertado do seu Senhor, pois o mesmo ao ver os negros jogou-a no chão e saiu correndo. Jurema ao se libertar correu para socorrer Pai João.

            – Queremos o Senhor branco! (gritavam os negros). Pai João com ternura disse: – Chega! Chega, Deus pode castigar! O ódio é amigo da fome. Voltem para seus donos, as onças vão lhes comer nestas matas! Deixem de ódio, vamos, desçam… eu não tenho medo de vocês! (dizia Pai João morrendo de dor).

            – Sim, vamos descer, disse um velho africano e num pulo já estavam juntos de Pai Zé Pedro. Se sentaram no terreiro como se quisessem ouvir o que ele queria dizer. Pai Zé Pedro começou a falar e perguntar a razão de suas fugas, o porquê de estarem fugindo. Eles contaram então a sua história.

            – Éramos trinta, entre homens, mulheres e crianças. O nosso Sinhozinho entregou-nos pro Feitor e todo dia morria nego de apanhar, então resolvemos sair matando até encontrarmos sossego.

            – De onde vocês vêm? (perguntou Pai Zé Pedro) – Viemos da Fazenda Esperança, no Engenho Velho. – Como? O Engenho Velho fica muito longe daqui. Meu Deus! (exclamou Pai Zé Pedro). Os negros como se estivessem enfeitiçados disseram: – Vamos ficar aqui, se o senhor deixar. Obedeceremos e não aborreceremos ninguém. – Oh! Meu Deus! (gemeu Pai Zé Pedro) Já temos muitos negros. Nisso de lá gritou uma crioula marcando seus trinta anos: Eu sei tecer e fia, desde que me dê algodão. Desceram mais ou menos umas oito crioulas, entre 18 e 35 anos e negros também nesta mesma idade.

            – Chame o Senhor, se adiantou o tal Jerônimo, que parecia dominar a tropa.

            Nisto, o Senhor sai na varanda e os negros se ajoelharam no chão pedindo perdão como crianças. Eram Almas em busca de Luz, mariposas encandeadas pela Luz. Desta vez foi diferente, os negros é quem decidiram a situação. Foram se acomodando na Senzala, deixando Pai Zé Pedro preocupado.

            Foi fazer uma vidência daquele quadro e ali cochilou entrando em transe. Viu todo aquele grupo de velhos e tradicionais Centuriões da antiga e já distante Roma. Viu também Pai Seta Branca que lhe disse: – Calma, calma José Pedro. Estes Centuriões que hoje são negros estão sob sua tutela. Foram seus algozes e entre eles está também Messalina, Policena, Emeritiana hoje na figura de Zefa. Salve Deus, José Pedro! Amor, Tolerância e Humildade! E assim desapareceu. Pai Zé Pedro despertou com o barulho deles. Sim, e João? O que vai pensar? Como irá entender isso? Oh! Meu Deus! Como me libertarei? Nisso Jurema vem correndo ao seu encontro. – Pai Zé Pedro, Pai João! Eu vi um Índio muito lindo que me falou sobre esses negros! Eles são nossos e vieram para nos salvar do meu Sinhozinho. Pai João deu uma risada e disse: – Salve Deus! Eu não o vi, porém senti tudo que passou. Jurema! Tu és minha filha! Eu e a sua mãe somos dois amores. Os três se abraçaram quando se ouviu a voz do Sinhozinho dono da fazenda.

            – Eu quero também me confraternizar neste abraço. Zé Pedro, você salvou as nossas vidas. E virando para Jurema disse: – Vou comprar a tua mãe e tua irmã, a Juremá. Os quatro pularam de alegria com as cabeças juntas e também em um só coração. Depois, como se despertassem daquela felicidade disseram: – Hoje faremos a maior festa no Congá. Suas atenções se voltaram para os velhos Jaguares, negros Centuriões que estavam batendo os pés e palmas cantando uma linguagem Nagô.

            – Oh! Meu Deus! (disse Pai Zé Pedro a Pai João) – Emeritiana está ali e Antera também! O que será de nós João?

            Respondeu-lhe então Pai João com calma, segurando no ombro ferido: – Onde está o Amor, onde está a compreensão!

            Sim, à noite foi um grande preparativo para a festa no Congá. Os tambores começavam a tocar, os chegantes pareciam tão disciplinados como os outros. De repente, ouviu-se um grito. Era Iramar que acabava de chegar esbaforida. O Povo da Fazenda dos Ferreiras estava cercando a Fazenda e iam levar Jurema. Foi pânico. Ninguém se entendia, até que Pai Zé Pedro novamente comandou todo o povo que lhe obedeceu. Salve Deus! Porém, todo o povo ficou em suspense… Foi horrível.

            Na semana vindoura saberemos o resto. Salve Deus, meu filho Jaguar! Procure sempre se encontrar nesta história, nestes personagens. Que a compreensão esteja contigo para que a felicidade possa te alcançar. É o que te deseja a Mãe em Cristo

            Tia Neiva

            Vale do Amanhecer, 15 de dezembro de 1979.

 

Capítulo III

            Salve Deus!

            Meu filho Jaguar:

            Não estamos preocupados com os velhos documentos das velhas escrituras, porém estamos sim, desejosos de saber onde os nossos antepassados encontraram tanta força e tanta coragem para chegar até aqui. Sim meus filhos, o Missionário tem, graças a Deus, a sua energia e toda a harmonia nos Três Reinos de sua Natureza. Muitas vezes contando, até pensamos ser irreal o que nos dizem sobre os escravos e seus Missionários.

            Vejam filhos, estavam em festa, quando alguém anunciou que os Ferreiras já haviam cercado o Conga e queriam Jurema a todo custo. Pai Zé Pedro, mais evoluído do que Pai João, foi tentando segurar o povo dentro do Congá e qual não foi sua surpresa, os crioulos novatos já haviam saído de dentro de casa e como loucos açoitavam os Ferreiras, fazendo-se ouvir pragas, ameaças e gemidos! O Feitor que estava do lado dos Ferreiras, sentindo que estava perdendo gritou:

            – Sou o Feitor desta Fazenda. Estes Nagôs imundos estão me assassinando. Socorro!

            Só se ouvia o urro do Feitor, pois na escuridão daquela noite, fora atingido na coluna ficando inerte no chão, gritando como um louco. Pai Zé Pedro foi até o terreiro onde estava a briga e logo viu que o Feitor estava aleijado para sempre.

            – Oh meu Deus! (gritou Pai Zé Pedro) Como poderemos assumir tal dívida com este pobre irmão? Nisto, alguém que ouvia gritou:

            – Eu acho muito bom que ele nunca mais caminhe, para não chicotear os outros.

            – Meu Deus, meu Deus! (dizia Pai Zé Pedro andando de um lado para outro) Oh meu Deus! Este pobre homem que não vai nunca mais andar… Caminhando, deparou com um outro triste quadro. Efigênia, uma jovem negra estava ali também com o crânio aberto de pancadas. Era filha de Júlia, uma paralítica. Zé Pedro não resistiu e foi buscar o seu Sinhozinho. Sim, nenhum dos Ferreira havia morrido e quis a vontade de Deus, nem mesmo ferido. Foi então que um dos quarenta que ainda não havia se manifestado, deu um urro e se manifestou dizendo: – Salve Deus!

            O sol já começava a esquentar seus raios, então o Nagô Pai Jerônimo disse:

            – Levanta acampamento, leva Jurema e Juremá. Escolhe o teu povo e segue rumo à Cachoeira do Jaguar, que desemboca nas águas grandes do mar. Nós, os Nagôs, ficamos. Vamos buscar a desditosa mãe destas gêmeas (disse apontando para Jurema e Juremá).

            – Não! Eu não permitirei (gritou Pai Zé Pedro).

            – Como? (disse Pai Jerônimo). Como se atreve a duvidar de teu irmão? Vão embora que eu a levo. Se demorarem terão mais mortes. Vamos, vamos logo. E desincorporou. Salve Deus!

            Pai Zé Pedro e Pai João não esperaram mais. Não se sabe como, juntaram suas coisas ajudados pelo Sinhozinho e partiram dali. Só no caminho notaram que não faltava ninguém e, inclusive o Feitor lá estava, numa cama de varas. O Sinhozinho e a Sinhazinha despediram-se com amor. Quando já iam longe ouviu-se um forte estampido. Era um tiro de cravinote.

            Os negros do terreiro, que já estavam de volta e o Sinhozinho com sua família, com a ajuda dos escravos que ficaram, enterraram os mortos e seguiram para a cidade onde moravam seus pais. Enquanto as crioulas contavam 108, faltando Jerônimo que ninguém sabia do paradeiro. Já era noite quando chegaram à Cachoeira do Jaguar. A Lua Cheia clareava as matas e o mar, as palmeiras balançando suas folhas como uma prece. Pai Zé Pedro sentando em uma pedra descortinava todo o quadro por onde teria que passar com aquela gente.

            Pai João chegou e os dois começaram a fazer os seus projetos.

            – Sim, (diziam) tudo pela condenação da matéria. A Terra… a Terra, (disse Pai João) tão lindo o mar, no entanto a Terra é o que nos pertence, por ser a parte sólida deste Planeta. Porém, o que me conforta é que as Forças Cósmicas continuam em atividade, porque neste Universo não há inércia, tudo se movimenta em nosso favor pela Bênção de Deus. A sua atividade é essencialmente produtora desta nossa matéria orgânica e inorgânica, logo nos dará forças, graças a Deus!

            Pai Zé Pedro que só ouvia, disse sorrindo:

            – Onde aprendeste tanto? Isto não são palavras de Nagô!

            – Estou consolando a mim mesmo, Pedro.

            – Porquê não pede ao Mestre Agripino? Ele é que me consola (Foi quando os dois começaram a receber energia).

            – Sim Zé Pedro, a atividade do homem é essencialmente produtora e as forças essencialmente ativas. Como já disse, cria na matéria orgânica este arsenal de forças, portanto temos que organizar um ritual, uma jornada, vestimentas que mudem a sintonia dos crioulos.

            – Sim Zé Pedro, vamos erguer esta arma para o Céu.

            – Sim João, é realmente um arsenal. Oh meu Deus!

            E olhando a paisagem do lugar disseram:

            – Faremos uma jornada em frente à Cachoeira, enfeitaremos as crioulas e faremos lindas Princesas dos Castelos Encantados que já ouvi contar.

            – E eu que pensei que você meu irmão, era um simples escravo!

            – Sim (disse Pai João), tenho Agripino que vem nos meus sonhos e me conta tudo.

            – Eu também tenho um Índio que me falava quando eu ia entrar no chicote do Feitor. Riram, riram muito, de repente lembram do Feitor.

            – Meu Deus! O que vamos fazer com este pobre homem? De repente ouviram um grito. Era Jerônimo gritando, como se estivesse perseguido.

            – Oh meu Deus! A nossa vida não tem fim. E os dois continuaram a sorrir.

            – Sim, e o ritual? (perguntou um).

            – Faremos! (disse o outro) Precisamos de energia para obter as Curas Desobsessivas. Salve Deus! Faremos tudo que Deus nos aprouver.

            Os gritos continuavam e todos já vinham ao encontro dos dois.

            Salve Deus! Meu filho Jaguar. Domingo vindouro lhe darei a continuação.

            Com carinho,

            A Mãe em Cristo,

            Tia Neiva

 

Capítulo IV

            Salve Deus!

            Meu filho Jaguar!

            O dever é a obrigação moral da criatura para consigo mesma em primeiro lugar, em segundo para com os outros. O dever é a lei da vida. Meu filho, a virtude é o mais alto grau onde o homem encontra sua liberdade espiritual. A virtude é a forma que sobrevive e explica a natureza do homem, porque tudo está contido em Deus! Sempre estamos a percorrer as ruínas de nossas vítimas, das suas vidas, sem preocupação exata de nossa missão. Hoje meu filho, estamos tentando acreditar no que nos dizem os nossos antepassados.

            Sim meus filhos, todos já estavam no Congá da Cachoeira do Jaguar. Foi triste aquela noite. Jerônimo havia chegado aos gritos, trouxera a mãe das gêmeas que estava muito mal. Emoções, choros, tristeza e também risos. O fato é que não se sabe como dormiram. Tão logo o dia clareou, todos já estavam tirando palmas, fazendo lindas choupanas. No prazo de oito dias já existia um lindo povoado de palha e tudo na melhor sintonia possível. Foi então o dia do grande Conga. Todos estavam realmente desejosos. Sim, o menor dos Seres vibrava na presença daquele lindo altar formado de palmas. Pai Zé Pedro e Pai João estavam muito felizes aquela noite, pois haviam se encontrado com Henrique de Enoque e com ele se identificaram. Henrique era um dos Nagôs. Juntos entraram na choupana de Jurema que estava ao lado de sua mãe moribunda. Jurema ao sentir os três, ergueu a cabeça e disse como se estivesse dormindo:

            – Salve Deus! Seja bem vindo nesta terra meu estimado Procurador! É árdua esta missão que escolheste de Nagô. Assim assumistes a maior das missões. Oh! (gritou) Como me orgulho de ti filho! Me orgulho de ti, como em poucos tenho o mais puro exemplo…

            Nisto abriu os olhos e meio decepcionada voltou para sua mãe e todos correram para ela.

            – Oh filha! Não sabes o bem que nos fez.

            Ela começou a chorar dizendo: – Sim, eu sei. Eu ouvi tudo que disse, apenas não pude me impedir de dizer (Zé Pedro olhou para João).

            – Como? Segundo Vô Agripino ela passou por um processo de incorporação consciente. – E quem tomou o seu corpo?

            – Os Anjos e Santos que prometeram nos proteger nesta jornada. Jurema será a Voz Direta do Céu (respondeu João).

            – Sim, graças a Deus! Então, comentaram tudo o que havia se passado. Zé Pedro reconhecera Henrique o seu velho Procurador Romano. Sim, Zé Pedro como Imperador o havia mandado a Pompéia e agora o reconhecera, porém não estivera tão seguro até que Jurema fizesse aquela grande afirmação. Os dois voltaram a se encontrar e no mesmo primitivo lugar. Pai João filosofando disse:

            – Todos somos livres neste mundão de meu Deus! Até mesmo para acreditar, desejar, escolher, fazer e obter; mas, todos somos também constrangidos a penetrar nos resultados de nossas próprias obras. Não existe direito sem obrigação e nem equilíbrio sem consciência.

            – Neste caso a consciência de Jurema é equilíbrio?

            – Graças a Deus, por isso me faz tanto bem, João.

            – Sim João, e a mãe de Jurema irá morrer?

            – Não Zé Pedro. A doença é apenas o conflito do seu estado externo, falta de energia física. Não precisamos nos preocupar. – Aceito sua afirmação João. Fico feliz e seguro de saber de seus sonhos com Vô Agripino. Seria tão bom se eu também pudesse sonhar com ele, porém devemos agradecer a Deus de termos você.

            – Sim Zé Pedro, porém ele ralha muito comigo!

            – Sim João, eu também tenho um Índio. Eu já lhe disse, não?

            – É verdade Zé Pedro, é verdade. E sabes mais Zé Pedro? Fui informado que o Vô Agripino é Pai Espiritual deste Índio.

            – João, espera, vamos devagar…

            Nisto um grito de alegria mudou a sintonia dos dois.

            Era o escandaloso do Tomáz que havia visto um pequeno barco trazendo a Sinhazinha Janaína.

            – Vê (disse Zé Pedro) Jurema bem que disse ter visto uma linda loura e um crioulo também que traziam belas mantas para as crioulas.

            – Sim, vamos Zé Pedro e cuidado! Você está fazendo muitas observações, isto é muito perigoso. Deixe que as coisas decorram sem muita precisão de sua cabeça.

            Desceram todos e a chegante parecia que já estava sendo esperada. Tudo calmo, desembarcou realmente com muitas mantas e pequenos terços, chamando Jurema foi também lhe entregando a sua bagagem. Vendo Pai João e Pai Zé Pedro perguntou se poderia viver ali com eles.

            – Como? (disse Pai João) Veio morar conosco?

            – Sim (disse a Sinhazinha). – Meu Deus, quantas complicações! (pensou Pai João).

            – Meu pai é dono de Engenho e tem grandes negócios na Europa. Minha mãe morreu e eu sonhei que nesta Cachoeira alguém me esperava. Viemos eu e Chiquito para nunca mais voltar. Libertei todos os negros que estavam no tronco e sei que eles também virão. Chiquito vai descer novamente, virar o barco e voltar a pé, depois de alardear o meu afogamento. Todos pensarão que morri.

            Neste ínterim todas as jovens já estavam juntas dando risadas. A euforia era tão grande que não houve sessão no Congá. Tudo ia correndo mais ou menos, todos se conhecendo melhor. Então uma grande harmonia foi evoluindo aquela gente. Pai Zé Pedro cada dia se evoluía no aprendizado de Pai João. Em vez de sessão no Congá eles gostavam mais das histórias doutrinárias de Pai João. Naquela noite, estavam todos sentados diante de uma linda fogueira atiçada por Pai Joaquim e Mãe Dita…

            Em resumo, ali acontecia a Doutrina Secreta, Mãe das Religiões e das Filosofias, que se reveste de aparências diversas no correr das idades, porém sua base permanecendo imutável em toda parte. Sim, nascida simultaneamente na Índia e no Egito, passando daí para o Ocidente com a onda das imigrações. Assim é que por toda parte, através da sucessão dos tempos e dos rastros dos Povos, afirma-se a existência de um Ensino Secreto que se encontra idêntico no fundo de todas as grandes concepções religiosas ou filosóficas. Os Sábios, os Pensadores, os Profetas dos Templos e dos países mais diversos, nela acham a inspiração, a energia que faz transformar e empreender as grandes coisas que aliviam as almas e equilibram a sociedade.

            Todos se preocupavam com a fogueira, enquanto Pai João cochilando ouvia todas essas coisas, estas lições, estes ensinos. Mal sabia Pai João, ia gravando tudo isso no fundo de sua alma, junto com a paz, uma serenidade e uma força moral incomparável. Todos sorriam, sem se lembrar do Feitor que repousava inerte na última choupana. Como a união faz a força, se obtém geralmente resultados satisfatórios sobre os encarnados. Todos estavam descontraídos e desprevenidos, alheios aos seus pensamentos exceto Jurema, que não saia da cabeceira de sua mãe.

            E no meio daquela noite surgiu um triste espetáculo: Jurema, com um pedaço de madeira na mão, gritava escandalizando todo mundo como se fosse o próprio Feitor!

            – Negros desgraçados, preguiçosos! (e se atirando em cima de todos e de olhos fechados espraguejava contra Zé Pedro).

            – Vem negro desgraçado, vem me matar!

            Pai Zé Pedro vendo que ela poderia cair na fogueira, foi segurá-la. Qual nada! Jurema investiu contra ele e o agrediu. Pai João foi ao encontro e os dois se machucaram. Jurema estava sem a razão. Pai João levantou os braços e na Força do chamado Deus Africano, gemeu como um leão dizendo:

            – Oh Obatalá! Oh Obatalá! Entrego neste instante mais esta ovelha para o teu redil!

            Jurema soltou o porrete e saiu cambaleando num pranto doloroso. Pai Zé Pedro enxugando o sangue do rosto, acariciava-a enquanto ela lhe enchia de perguntas.

            – Não tens raiva de mim? Não te zangastes?

            – Não filha (disse por fim). Conheço o fenômeno e tu só me fazes bem. Jurema levantando os grandes olhos rasos d’água, emitiu a Zé Pedro toda a sua ternura. Zé Pedro sentiu todo amor de sua vida. Os dois percorreram o transcendente e como por ventura, Jurema viu o famoso Procurador que a cortejava e a quem tanto amava. Então ali permaneceram sem que ninguém os reparasse. Todos estavam empolgados no fenômeno. Pai João fez aquela Emissão ou Elevação com toda a força dos seus sentimentos. Sentindo as dores do fenômeno, voltou para o mesmo lugar, voltando também a ouvir Vô Agripino.

            – Salve Deus! Viu João? Fizestes tudo tão perfeito, porque tens constantemente livre o teu Sol Interior. Te entregastes ao Cristianismo, esquecendo-te de ti mesmo. Sim, o ensino é como pétalas de rosa que caem em nossas mentes, enquanto vai orvalhando os Três Reinos de nossa Natureza.

            – É o Centro Coronário que me ensinaste uma vez?

            – Sim! Este guarda as pérolas que levamos para a Vida Eterna. (E disse mais) – Não te assustes com Zé Pedro. Não te esqueças que ele tem apenas 40 anos aí na Terra.

            Pai João meio confuso, viu que Zé Pedro ainda falava com Jurema. Então voltou a fazer outras perguntas ao seu Vô Agripino e este entre outros esclarecimentos disse:

            – João, sabes quem tomou o aparelho de Jurema?

            – Não meu Vô, quem?

            – O Feitor!

            – O Feitor? Como? Ele morreu?

            – Não, o seu ódio é tão grande que ele se desprende do corpo e faz o que fez.

            – Meu Deus!

            – Sim! E não poderás dizer nada, guarde tudo para ti mesmo, porque esta gente não tem capacidade de assimilar tudo isto.

            – Oh meu Obatalá! Tenho medo, e Zé Pedro?

            – Sim, nem Zé Pedro. Ele será feliz, porque saberá respeitar o seu grande e imortal amor.

            – E Japuacy?

            – Japuacy? Veja João. (Pai João deu uma grande risada…).

            Sim meu filho Jaguar, vou terminar a reforma da Sala de Costura com Rafael e Fabrício, e não tenho como escrever mais, porém na próxima semana darei a vocês mais uma parte.

            Com carinho,

            A Mãe em Cristo,

            Tia Neiva.

 

Capítulo V

            Salve Deus!

            Meus filhos Jaguares!

            Explica-se a diferença entre a velha estrada e o novo caminho.

            A velha estrada é cheia de medo, de temor a Deus. A velha estrada foi palmilhada por milhares de pessoas, milhares de teorias sempre escritas e nunca praticadas. O novo caminho, entretanto foi traçado pelo suor, pela própria energia de quem o traçou e vive a emitir com tanto amor.

            Vamos sentir o caminho do Amanhecer, sem superstições e sem as teorias dos pensadores, pela vivência na prática, na execução desta Doutrina e seus fenômenos sensoriais.

            Vamos senti-lo no respeito à dor alheia, no carinho aos humildes, no afeto das ninfas, no progresso e na compreensão de nossa família.

            Este é o caminho traçado para o homem na Doutrina do Amanhecer.

            Quem diria que naquela Era distante os Enoques levassem tão alto esta filosofia, esta Corrente.

            Sim, Pai João, o mais velho, era quem observava com mais precisão o desenrolar das vidas nos Carmas. Suas preocupações aumentavam enquanto Pai Zé Pedro filosofava de vez em quando.

            Os dias passavam sem qualquer anormalidade, isto é, sempre acontecendo fenômenos que ali já eram corriqueiros. Porém, só Deus sabia como e onde chegariam. Havia dias alegres e outros menos alegres, porém sempre em harmonia.

            Até que as forças foram se materializando e tudo começasse a ser mais verdadeiro, mais preciso.

            Pai João se inebriava com todos aqueles fenômenos e estava sempre à espreita dos mínimos acontecimentos. Os momentos de descanso era cochilando embaixo de uma pequena árvore.

            O pequeno arraial estava tranqüilo quando Pai João em um dos cochilos viu um finíssimo fio magnético entrando numa das cabanas, ao mesmo tempo que ouviu o grito desesperado de alguém que fora atingido.

            Era um fenômeno Mediúnico, puramente Espiritual. O grito era da jovem Iracema que rolava com uma dor na espinha, como se tivesse levado uma pancada.

            Pai João então correu e fez uma “Elevação” tirando-lhe a dor.

            Ele então começou a pensar que nada havia enxergado. Tinha certeza de ter visto aquele fio saindo da cabana do Feitor.

            Chamou então Pai Zé Pedro e contou-lhe o que vira e os dois começaram a ter medo da situação.

            Nisto Jurema, manifestada por um Caboclo começou a dizer:

            – “Meus filhos! Tomem cuidado, este Feitor é um instrumento feliz de evolução. O pobre infeliz vive ainda pelas mãos caridosas de Sinhá Sabina. O fenômeno foi visto por vosmissê João, para que tome cuidado!”.

            – Como? (perguntou Pai João).

            – Ele vai entrando em transe (respondeu o Caboclo) e sua alma ruim, odiosa, pega a quem ele mais ama ou odeia.

            – Salve Deus! (disseram todos de uma vez).

            – E eu que pensava que somente os desencarnados atuavam…

            – Sim! (continuou o Caboclo) Vocês estão em uma jornada para desenvolvimento, até que passe todo o Carma da escravidão.

            – O homem será feliz quando tiver a libertação? (perguntou Pai Zé Pedro).

            – Não! (continuou o Caboclo) O homem jamais se libertará.

            E dizendo isso deixou Juremá e se foi.

            Todos ficaram sem entender nada. Jurema porém entendeu e saiu correndo dali para a cabana do Feitor, decidida a falar com ele e dizendo que iria mata-lo, quando Pai João interferiu dizendo:

            – Jurema, a concepção de morte resulta de um entendimento completamente errado da vida, porquê na verdade ela jamais existiu. O Espírito não morre e então o Feitor nos atentará mil vezes mais. Matando-o ele ficará mais leve, mais sutil.

            – Todos que se prendem pelo pensamento e se enchem de ódio, ao se verem desencarnados no astral inferior, é evidente que voltam, sendo mais comuns as suas furiosas crises.

            – Vamos Jurema, vamos tentar doutriná-lo antes que morra e se torne invisível aos nossos olhos.

            Chegaram na cabana do Feitor. Ele estava esticado numa cama de vara e capim. Sabina veio sorrindo ao encontro deles. O feitor começou a espraguejar e Pai João a lhe fazer Doutrina, porém com medo de Jurema que o observava seriamente com seus olhos verdes e amendoados.

            Sem perceber, disse então Pai João: – Pobre Imperador! Viestes com tão nobre missão e, no entanto eis o que restou! Pensa Eufrásio, no que estou te dizendo. Vou levar Jurema e voltarei.

            O dia já estava terminando quando Pai Zé Pedro e Pai João se encontraram de novo e se entenderam. Pai Zé Pedro deslumbrado ficava repetindo: – A irradiação dos encarnados se desprende do corpo e manifesta com a mesma leveza do Espírito dos mortos…

            Nisto se ouviu um grito e em seguida gargalhadas; Pai Zacarias caíra na Cachoeira e estava todo molhado, porém nada havia lhe acontecido senão o susto. Coisas desta espécie aconteciam sempre.

            Sim, mas essa alegria durou pouco. Chegou o Feitor da Fazenda onde Juremá vivia.

            Ele chegou arrogante e já ia pegando Juremá quando Tomáz gritou: – Larga, porco imundo, aqui é diferente! – Nem tanto (gritou o Feitor) porque você vai morrer!

            Dizendo assim esporeou o cavalo e marchou para Tomáz. Como um relâmpago passou por cima dele com o cavalo esmagando o seu estômago. Quando Pai Zé Pedro e Pai João chegaram era tarde demais. Tomáz já estava morto!

            Todos gritaram fazendo um ambiente de terror naquele lugar.

            O Feitor foi fugindo desapercebido levando Juremá.

            Aquela dor era grande demais e ninguém, e ninguém se lembrou do Feitor assassino e nem de Juremá.

            A morte de Tomáz trouxe tanta tristeza que mudou a sintonia do lugar. Os Nagôs não cantaram mais e nas fogueiras riam raras vezes. A harmonia porém continuava.

            Começaram então os projetos para irem buscar Juremá. Tomáz fora quase criado por Pai Zé Pedro.

            Dois Nagôs que muito amavam Pai Zé Pedro resolveram buscar Juremá. Calados, sem que ninguém soubesse, puseram uma “matula” na mochila e se foram sem que ninguém soubesse.

            Jurema porém os viu na sua vidência.

            Pai João por sua vez sentiu tudo que estava se passando.

            Todos porém se fizeram de desentendidos e ninguém impediu os dois Nagôs.

            Jurema não olhava para Pai João e nem Pai Zé Pedro, pois viviam ainda o espírito de vingança pelo seu querido Tomáz.

            E realmente Joaquim e Cassiano chegaram com Juremá.

            Novamente o rebuliço.

            Juremá não falava, perdera a voz.

            Todos queriam saber o que houvera, porém nada diziam e ninguém tinha coragem de perguntar. Permaneciam em volta da fogueira e só ouviam o murmúrio da Cachoeira. Ninguém tinha mesmo coragem de quebrar aquele silêncio.

            De repente Jurema deu uma risada, Janaína foi para perto dela e as duas se abraçaram, Jurema, porém, mantendo uma atitude que não era dela, disse: – Salve Deus! (e chamando Joaquim e Cassiano disse): – Porquê fizeram isso? Mataram o Feitor e seu Sinhozinho! Isto não é de um filho de Deus e que está ‘a caminho! Terá que voltar ‘a Terra e receber o Feitor como teu filho. E tu Cassiano, terás o teu Sinhozinho também como filho!

            A estas alturas Cassiano e Joaquim já sabiam o que Jurema queria dizer.

            – Me perdoe, bom Espírito (disse Joaquim) porém aquele malvado matou nosso Tomáz em sua covardia!

            Cassiano por sua vez perguntou ao Espírito incorporado em Jurema em Jurema se eles poderiam continuar vivendo ali.

            – Sim! (disse o Espírito) Deus não tem pressa. Cada um daqui assumirá a sua sentença ou sua libertação.

            Juremá enchia-se de cuidados por Jurema.

            Tão logo terminou a incorporação cada um voltou ao seu estado d’alma. Uns foram dormir e outros ficaram ali na fogueira.

            Nisso ouviram gritos alucinantes!

            Meu Deus! Novamente o fio magnético. Novamente Iracema fora atingida pelo Feitor Eufrásio. Tudo se repetiu com as mesmas correrias, até que Pai João liquidou novamente o assunto com nova Elevação. Desta vez, porém, com muito trabalho.

            Mais dias decorreram e se notou que Iracema ficava cada dia mais pálida, com ar doente. A partir daí tudo foi de mal a pior.

            Certo dia fizeram uma vidência para saber o que deveriam fazer com a pobrezinha da Jurema. Dela participou Vovó Cambina, que viera da Bahia para tirar o quebranto dos filhos da Sinhá. E na sessão daquela noite decidiu seguir os seus irmãos naquela jornada.

            Vovó Cambina da Bahia “rezou” Iracema e esta com seu “Passe Magnético” começou a melhorar. A partir daí, na proporção em que ia se fortalecendo, ia também adquirindo forças para repelir o magnético do Feitor.

            A essas alturas, porém, as coisas já haviam tomado um rumo muito sério. Ninguém se lembrava mais de Tomáz. Toda a concentração agora era no Feitor Eufrásio. Urgia faze-lo amigo antes que ele os atingisse. Isso porque Pai João explicara que se doutrinassem o Feitor, ele deixaria de atacar com seu magnético. A partir daí o Feitor começou a receber constantes visitas e foi melhorando tanto, que chegou a pedir perdão muitas vezes.

            Eufrásio passou então a ser o confidente daquele povo!

            Sim, Eufrásio fora um grande Senhor, até o dia que perdera a sua fortuna e sua família devido ao jogo. Com isso fora obrigado a aceitar o triste lugar de Feitor naquela Fazenda de tragédia. Mais uma vez a prova de que o homem se liberta por si mesmo…

            Sim, enquanto Pai João e Pai Zé Pedro ensinavam a sua Doutrina de Amor, o Feitor ensinava, também, o que sabia dos mundos por onde andara.

            Vovó Cambina da Bahia também o “rezava” todos os dias.

            A vida do arraial, sem ter perdido sua harmonia, só agora, entretanto voltava ao normal das toadas e das alegres fogueiras. Certo dia estavam todos assentados quando ouviram um barulho no mato, como seu fosse um estouro de boiada arrastando tudo… Eles então carregaram suas espingardas e se entrincheiraram…

            Era uma vara de porcos selvagens que por ali passava, felizmente por fora do arraial. Assim mesmo os Nagôs mataram mais de 20 porcos, fazendo fartura de carne.

            Pai Juvêncio e Zefa eram os únicos que tinham coragem de ir até um lugarejo por nome Abóbora.

            Certa feita chegavam na entrada da cidadezinha, quando Pai Juvêncio viu uma mulher com uma menina meio desacordada nos braços. Ele chamou Zefa e cochichou no seu ouvido. Ela concordou com o que ele disse e ambos benzeram a menina, isto é, tiraram o Espírito que estava com ela. A menina ficou boa e Tânia, sua mãe, deu a eles algumas frutas que tinha, se desculpando por não ter mais nada.

            Juvêncio e Zefa comeram as frutas, trataram dos assuntos que os havia trazido à cidade e voltaram para casa. Ao chegarem, nem bem haviam pisado na soleira da cabana, quando sentiram uma violenta dor de barriga. Suas barrigas começaram a doer, doer tanto a ponto de chamarem Vovó Cambina da Bahia para socorre-los.

            Seria veneno?

            A desinteria piorava e os dois apresentavam os mesmos sintomas.

            Pobrezinhos, dizia Pai João. – Resolveram tantas coisas para nós nessa viagem! Deve ser provação, deve ser Deus testando seus corações.

            Logo mais à noite, todos estavam em torno da fogueira e pediam notícias. Súbito, Jurema que estava ao lado de Pai Zé Pedro, levantou-se bruscamente e apontando para os dois que estavam abaixadinhos junto à fogueira gemendo de dor, disse:

            – Eles comeram prenda ganha pela sua caridade!

            – Como? (disse Pai João) – Ah! Sim, Pena Branca não quer que a gente ganhe nada em troca do que faz! Sim, Vovó Agripino também já disse: – A gente só aprende com o espinho na carne, fincando!

            – É Pai João, todos nós temos um espinho na carne!

            – Oh! Meu Deus! (gritaram todos de uma vez) – Sim! Estamos conscientes!

            Nessa altura, graças a Deus, Vovó Cambina já estava chegando com a cuia de chá. Eles após tomaram o chá, contaram o que havia acontecido na entrada de Abóbora.

            Todos então abraçaram os dois pela sua ação e cantaram em coro – Juvêncio e Zefa comeram prenda da caridade que fizeram! – Sim, receberam pagamento e o Pena Branca não gosta de presentes ou de “cobre”!

            Zefa e Juvêncio ainda tiveram uns três dias de dor na barriga.

            Tudo foi alegre e passou.

            Eufrásio, que agora era o Conselheiro do grupo, também achou a lição muito importante. Primeiro pelas frutas, uma vez que Pena Branca não aceita pagamento pelo seu trabalho mediúnico, e segundo pela denúncia de Jurema, que em sua Clarividência vira o que se passara.

            O pobre casal fora lesado pelas suas mentes preguiçosas. E tudo está Espiritualmente pronto.

            Pai Zé Pedro e Pai João se regozijavam da situação. Zé Pedro sempre perguntava: – O que será de nós, onde iremos? O que será de nós? Não seria melhor sairmos, em vez de esperar o Mundo aqui? Eu já não suporto mais! Oh! Meu Deus!

            – Zé Pedro (dizia Pai João) Quando o celeiro está pronto o Mestre aparece! – São palavras de Vô Agripino!

            Pai Zé Pedro, Pai Lourenço, Pai Francisco e muitos outros dos 70 membros daquele grupo estavam inquietos. Menos Pai João e Eufrásio o Feitor, que firmes em Vovô Agripino, permaneciam calmos.

            Certa manhã Jurema avisou o Pai Zé Pedro que chegaria muita gente para se curar. Os Nagôs se reuniram e se prepararam para recebe-los. Já fazia dois anos que ali estavam.

            – Lá vêm eles, lá vêm eles!

            Lá embaixo avistava-se uma enorme fila de gente chegando.

            Só se ouvia gente correr para receber os chegantes.

            Zefa e Juvêncio reconheceram entre eles a mulher cuja menina haviam curado e gritaram: – Jurema, Pai João, Pai Zé Pedro! São gente que vêm em busca da caridade! (e perguntaram baixinho a Pai João): – Não tem perigo de nossa barriga doer?

            – Não! (respondeu Pai João).

            E o Povo foi chegando e fazendo e fazendo ambiente.

            Que maravilha! Todos estavam felizes, a felicidade dos Missionários de Deus!

            Tudo foi lindo com suas Curas Desobsessivas e seu Amor, a dedicação de toda aquela gente.

            Meus filhos, eu gostaria de contar mais desta história, porém Manezinho, o 7º Raio de Yucatã não me deixa. Sabe porquê? Porque ele é também um personagem da Cachoeira do Jaguar.

            E você também, meu filho, procure se encontrar nela.

            Com carinho,

            A Mãe em Cristo.

            Tia Neiva.

            Vale do Amanhecer-DF, 08 de março de 1980.

 

Capítulo VI

            Salve Deus!

            Meu filho Jaguar!

            As trevas da noite nada significam para o Espírito, pois este vê através do seu resplendor.

            Sim meu filho, declaro com toda confiança, que não está longe o dia em que a ciência irá se colocar diante desta realidade que é a reencarnação.

            Ninguém poderá impedir o progresso. O mundo de hoje está brincando com fogo. O tempo no espaço não se registra. Não se sabe porém os caminhos físicos. No centro nervoso da Terra tudo é lento, tudo vibra para formar a harmonia no centro eterno do homem. Seus rápidos contatos do etéreo-magnético é o bem que lhes dá força. O homem mesmo na sua inconsciência, confirma o seu penhor no eterno e junto aos seus velhos sábios retorna ao seu Sol Interior.

            Sim meu filho, breves dias irão chegar em que o Homem Espiritualizado será sentido pelo “PROFANO”, como uma música literária da mais alta sinfonia.

            Sim meu filho, segundo as leis e forças que governam todas as coisas que Deus criou, o homem na totalidade, sempre procura empregar sua força mais para impedir o desenvolvimento da Terra. Vê-se assim, como a se punir pelas suas próprias leis. Leis, sempre para punir outros e não sabem se desviar e continuar a punir.

            Sim meu filho, não é fácil abandonar a multidão, fixar-se em si para buscar a verdade. E quando conseguimos encontrá-la, é mais difícil ainda permanecer com ela. Permanecer com a Verdade quando a encontramos.

            Sim meu filho, com este Espírito de lealdade vamos encontrar o nosso Povo na Cachoeira do Jaguar. Foi tudo muito bem aquele primeiro dia. Curas, muitas curas que se espalharam por toda parte. De longe se viam luzes naquela Cachoeira. Nossos Missionários estavam unidos pelos compromissos Cármicos.

            Pai João amanheceu doente. Seis horas da manhã e o céu não clareava, fazendo os pensamentos se encontrarem. Eufrásio entoava um “bendito” da Igreja Católica. Jurema juntou a roupa e desceu com uma enorme trouxa para a fonte, e com ela Janaína, Jandaia e Janara. Alguns Nagôs já voltavam das caçadas e outros seguiam para as roças. As Sinhás preparavam a feijoada e outras ainda reavivavam o fogo da célebre fogueira.

            Pai João sentia a tristeza daquela gente e sua mente começou a voltar. Foi quando Pai Zé Pedro chegou fazendo algumas premonições. Sim! Pai Zé Pedro previa alguma dor devido também ao procedimento daquela gente.

            Pai Zé Pedro estava triste porque Pai João já havia contado uma certa comunicação sua com Vô Agripino, que segundo os fenômenos habituais, a desarmonia que há horas estava se dando no grupo, era forçada pelas vibrações dos familiares de Janaína. Eles acabariam descobrindo o seu paradeiro. Evidente, seria uma guerra. Perder Janaína seria um terrível descontrole para Jurema. Seus pensamentos não chegaram a se concretizar.

            Da entrada da aldeia três cavaleiros gritavam: – Negros! Queremos paz, porém, nos entreguem a Sinhazinha Janaína, porque o Senhor seu pai pede a cabeça de todos vocês que roubaram sua filha.

            – Ela não se encontra aqui (disse decidida Jurema).

            Janaína, que estava de cócoras, saiu correndo e entrou na cabana de Eufrásio, que tinha um Cravinote na sua cabeceira para se defender de bichos (onças, lobos, etc). Vendo Janaína tremendo de medo, segurou o Cravinote e ficou ali ‘a espreita do que desse e viesse.

            Ah! Foi horrível! Os homens desceram dos cavalos e foram direto ‘a cabana de Eufrásio. Este, fazendo um esforço acima de suas condições físicas, vendo o homem quase pegando Janaína, segurou a arma e atirou. Dois ficaram caídos e o outro foi embora pela mata adentro.

            Pai João mandou que desarreassem os cavalos e os juntasse à tropa.

            Todos correram para a cabana de Eufrásio que só sabia dizer: – Oh! Pai João, pelo amor de Deus, jamais pude pensar em tão desesperado gesto. Sim, Pai Zé Pedro! (Eufrásio continuava a falar) Eu não podia deixar que eles pusessem a mão nesta criaturinha…

            Nisto um urro. Reviraram o homem que estava de bruços com a boca no chão, ele ainda estava vivo, porém, o outro estava morto. Foi horrível. Ninguém sabia como proceder. Mas, a verdade não se pode esconder: Estava um homem morto, e o outro ninguém sabia o seu estado de saúde. Somente quando o dia clareou é que foram dar conta da tragédia.

            Eufrásio já estava só novamente.

            Um grande grito se fez ouvir, era Eufrásio; estava sentado na cama.

            – Sim! Pai João, Deus se compadeceu de mim, estou sentado. Oh! Pai Zé Pedro. Todos viraram-se para Eufrásio, ficando a dor da tragédia mais amena.

            Maria Conga não parava, enquanto todos sofriam em seu pranto emocional, ela junto à Vovó Sabina e também alguns Nagôs, já haviam cuidado do morto e do ferido, e até já sabiam que o morto se chamava Crésio e o doente Amâncio e que inclusive, estavam por conta própria, ninguém os havia mandado ali. Eram os velhos reajustes da noite fatal na Senzala.

            – Oh! Meu Deus! (gritavam todos) Eufrásio vai andar… entre lágrimas, gritos e emoções, Eufrásio dava alguns passos pelas mãos de muitas pessoas eufóricas que chamavam aquele fenômeno de milagre.

            Pai Zé Pedro estava em conflito e foi atrás de Pai João.

            – Como pode? Matou e ficou curado! Como pode? João, um fenômeno deste?

            – Cala-te Zé Pedro! Deixe de fazer julgamento. Estes três homens não eram mandados do pai de Janaína, e sim estavam com má intenção na pobrezinha desta virgem. Olha Zé Pedro, já estamos aqui há mais de cinco anos! Não está lembrado que o Sinhozinho Eric vendeu tudo que tinha e foi embora pensando que sua filha havia morrido afogada? Houve até uma lenda que Janaína aparecia cantando por cima das águas nas noites de lua cheia? De um ano para cá, porém, alguém começou a desconfiar que realmente ela estava aqui. Confiança Zé Pedro! Nas coisas de Deus! Estamos em maremoto, porém, para um nada. É confuso tudo isto, certo?

            – Oh! João, graças a Deus! Não sabes o bem que me fizeste.

            Pai João mandou um recado para o Sinhozinho de Pai Zé Pedro e este arrumou toda a situação ilegal, inclusive junto ao pequeno arraial de Abóboras.

            Eufrásio realmente ficou bom. Então tudo virou. Eufrásio queria procurar a família, os seus e, tão impaciente estava que já se aborrecia por qualquer coisa e por fim se apaixonou pela meiga Iracema. Então, em tudo colocava a amargura. Não parecia mais aquele Eufrásio cheio de cuidados.

            Certa noite, a lua estava cheia, ninguém se preocupava com a fogueira. Pai Zé Pedro e Pai João estavam fora, mais para longe da aldeia e começaram a fazer as reparações.

            – Eufrásio (comentavam), como uma criatura podia modificar em tantos aspectos, em tão vil procedimento?

            – É possível João, alguém regredir tão depressa?

            – Sim Zé Pedro, naquela noite trágica, muita experiência Deus nos deu à luz do saber. E eis o que sei dos meus contatos com Vô Agripino: – Eufrásio foi somente um instrumento de nossa evolução – e disse mais: que eu nunca me iludisse com o seu comportamento e nem tampouco com a sua evolução.

            Sim, tudo era compreensível, porque o homem não se evolui em tão pouco tempo.

            – Oh! Meu Deus! Começo a compreender o que estamos passando.

            Nisso chega Eufrásio.

            – Pai João, vou-me embora, não estou suportando mais esta vida! Vou sair, vou procurar emprego onde chegar. Darei notícias e jamais irei me esquecer de todos aqui, e muito menos de vocês dois.

            Olhando, Pai Zé Pedro, que espantado não dissera uma só palavra, perguntou: – Quando desejas partir?

            – Agora (respondeu Eufrásio) e sem muitas despedidas. E foi embora, montado na mula do finado.

            Pai João, Pai Zé Pedro e alguns Nagôs que já haviam se juntado ali, estavam perplexos. Ninguém, ninguém deu uma só palavra. Subiram até a aldeia sem comentários e com toda mágoa no coração se sentaram junto à fogueira. Jurema virando-se para Zé Pedro, disse:

            – Tenho pena de Vosmecês, e assim dizendo foi incorporando.

            – Salve Deus! (era Vô Agripino) Meus filhos! Eufrásio foi embora, cumpriu seu tempo com vocês, não se preocupem que ele não irá muito longe. Fez grandes dívidas nestes arredores. Pagou sua dívida com Janaína e vai se encontrar com sua família aí nas Abóboras. E vocês, João e Zé Pedro, se preparem que virá uma ordem para vocês partirem daqui.

            – Nas Abóboras? Sua família aí tão pertinho? (perguntou Pai João).

            – Sim! Porém, ele saiu daqui sem saber (continuou Vô Agripino) Sim! Vocês vão partir daqui, partir para bem longe. Jurema, Janaína, Iracema, Jandaia, Juremá, Janara, Iramar, Jazaíra e Jaiza precisam se casar. Esta aldeia já não tem mais energia para vocês.

            – Sim! Energia Transcendental, Herança que se encaminha na Lei do Auxílio.

            Pai Zé Pedro e alguns Nagôs estavam ainda decepcionados, mal ouviam o que o Vô dizia.

            Terminou a sessão e todos tristes, foram dormir.

            Sim, nesta época já viviam ali naquela Aldeia 108 personagens. Era uma família que com a saída de Eufrásio, ficou bem mais unida. Só Deus agora daria o destino daquela gente.

            Em volta da fogueira todos “murchos”; o coração de Pai João doía… Reagindo, voltou-se para os demais dizendo:

            – Meus filhos, o homem não vive com o coração dilacerado pela desilusão. Não fiquem assim compungidos pela falta de Eufrásio.

            Alguns comentaram – Eufrásio era tão bom, nos dava tantos conselhos, nos orientava em tudo…

            Pai João começou a pensar: Quando o homem se esquece das faltas do outro é porque está se evoluindo. Ali naquele caso, todos só lembravam de Eufrásio na sua boa fase. Sim, Iracema, a crioulinha mais indefesa, e a quem mais fez sofrer…

            – Zé Pedro (disse Pai João) Estes são realmente os velhos Reis e Imperadores.

            – Por quê João, afirmas com tanta euforia?

            – Zé Pedro, o homem que viveu em encarnação superior, digo, de procedência refinada, não perde a confiança em si mesmo.  Sempre estão a lhe passar o Espírito de Justiça e não se envolvem em mesquinharias. Somos 108, sabe?

            – Sim, foram todos Reis e Rainhas, e todos viverão muito tempo conosco.

            – Deveras (disse Pai Zé Pedro) – Eles só se lembram de Eufrásio, de Eufrásio em suas boas ações e de seu martírio na cama.

            Continuavam perto da fogueira. Jurema fazia previsões. Chegando a vez de Iracema ela disse:

            – Iracema, você voltará para ser a esposa de Petrúcio. Sim, seguirá para muito longe. Iracema e Iramar atravessarão o Espaço para receber a missão e depois voltarão esposas do mesmo Imperador.

            – Eu? (espantou-se Iracema), esposa do Imperador?

            – Sim! (continuou Jurema) Cujo Imperador será Eufrásio, que neste instante já se prepara para partir no rumo de sua missão.

            Deveras, foi horrível aquela noite. Frustramento, sonhos pesados, porém ninguém ousava dizer nada, até que Pai João quebrou o silêncio.

            – Sim! (disse Jurema) Uma morrerá e Iramar se casará por último e, depois todos nós partiremos de lá para outro lugar aqui perto…

            A vida continuava. Logo se acostumaram com a saída de Eufrásio. Reinava agora um suspense. Sempre sustos, reparações Doutrinárias, uma harmonia quase que de medo. Certo dia Pai João se juntou na fogueira e começou a falar:

            – Vejam meus filhos, como a lei segura o homem. Vê-se assim, como o homem pode ser punido pelas próprias leis que estabelece, sem se desviar deles. São as leis feitas pelos homens, que punem. Os Poderes Superiores podem proteger o homem das forças negativas que causam doença e sofrimento, porém, o pedido de proteção, segurança contida de paz, harmonia do nosso todo, isso é possível somente na Lei do Auxílio. Fazendo a caridade é que abatemos na Lei do nosso carma. O sofrimento de hoje é a luz do amanhã. Individualizamos a vida e, no entanto, somos guiados por Deus. Há muitos séculos o homem tentou criar e fez a força cega em si mesma, dirigida pelo Chefe das Almas…

            Pai Zé Pedro ouvia atento as palavras de Pai João, e remoia em seu canto a falta, a transformação de Eufrásio.

            – João, o quê é Deus? Não é dado ao homem conhecer Deus, que por si mesmo deve compreender? Sabemos que um homem está com Deus pelo seu procedimento. Por que regride o homem? Eufrásio estava em Deus, como pode cair tão de repente?

            – Sim Zé Pedro, cuidado com a tua forma de pensar, vancê é um Nego Velho pro chicote e não para julgar com tanta convicção.

            Os dois começaram a rir e João disse com Amor:

            – Sim Zé Pedro, ouça bem o que diz Vô Agripino: Deus é absolutamente Fé, é absolutamente Razão. E ser a Razão é ser a ciência. Eufrásio não estava em Deus, Deus tentava penetrar apenas em seu coração, como tocou ao vosso naquela noite.

            – Como? (pergunta Zé Pedro).

            – Assumindo com Eufrásio os seus desatinos! Afirmou Pai João.

            – Então tudo foi perdido? (indagou Zé Pedro).

            – Não Zé Pedro, nada se perdeu, muito pelo contrário, Eufrásio saiu para cumprir seu destino. Deus não lhe daria o perdão de suas faltas por aquele curto tempo em que esteve paralítico aqui na cabana. Espancou muitos homens, foi o pivô da noite trágica. Quantas mortes em seu nome? Tudo o que aconteceu foi à bem do seu Espírito, não se esqueça do que disse o Caboclo Pena Branca: Breve, muito breve, iremos nos encontrar. Salve Deus!

            – João, na verdade o homem não tem capacidade de julgar o outro.

            Os dois começaram a sorrir, achando graça daquelas coisas que falaram e que tanto lhes fizera bem. Tudo vinha de Vô Agripino a Pai João.

            Felizes, felizes estavam agora. Recordavam de sua vida passada, o porquê daquela escravidão.

            A felicidade porém durou pouco. Como por encanto um temporal, como um furacão, ameaçava aquela aldeia – o mar crescia, as árvores chegavam suas copas no chão. Pai Zé Pedro e Pai João juntavam a todos e em súplicas olhavam o céu. As palavras de Vô Agripino, eram agora o leme daquele povo: “CORAGEM! FIRMEZA! A FÉ, O AMOR, SÓ EM DEUS!…”.

            Quando a voz do Índio Estrangeiro, como uma melodia de paz se fez ouvir: É A HORA DE POMPÉIA! Foi a Voz Direta.

            Todos ouviam e viam seus Olhos Verdes incomparáveis, iluminando naquela escuridão. Logo todos estavam juntos.

            Oh! Meu Deus! Em que Plano? Em que Dimensão? Foram todos ou ficou alguém, alguns daqueles pobres Missionários?

            Meu filho Jaguar: Nós veremos na próxima semana um outro capítulo, porque Rafael, Jorge, Vildinha, Soares e Izaura precisam de mim, e eu, sua Mãe em Cristo, vou atendê-los.

            Sua Mãe em Cristo.

            Tia Neiva.

            Vale do Amanhecer-DF, 16 de maio de 1980.

 

Capítulo VII

            Salve Deus!

            Meu filho:

            Vamos voltar à Cachoeira do Jaguar. Vamos mais uma vez sentir a realização daquele Povo, os nossos antepassados.

            É filhos, quem diria que aquela filosofia de Pai João e Pai Zé Pedro partisse daqueles Nagôs? Sim filhos, é preciso que conheçam a vida fora da matéria, sabendo que vivemos na Terra a experiência de que somos testados pelos nossos amores, e pesados pelos nossos corações.

            Vivemos neste Globo Terrestre onde analisamos a um ovo; a vida atmosférica que não nos dá a mínima condição de viver sem dispensar as normas reais da vida. E assim, como ocorre na Terra, muito mais é no espaço, onde o poder do Pensamento Criador é incomparavelmente maior.

            Depois de atravessar uma pequena clareira, vamos encontrar os nossos queridos Pai Zé Pedro e Pai João no verdadeiro caminho que nos une à Eternidade.

            Tudo era movimento, no dia que Pai João e Pai Zé Pedro foram chamados para o Sono Cultural.

            Salve Deus!

            Pai João e Pai Zé Pedro se preparavam para o anfiteatro. Suas cabeças não haviam despertado daquele triste crepúsculo na Terra, na Cachoeira do Jaguar. Sentados em frente de uma grande tela, que nos Planos Espirituais do Canal Vermelho é como um cinema; aparece tudo que queremos saber de nossa vida na Terra. Pai João e Pai Zé Pedro viam com paixão tudo que lhes era tão caro; aqui e ali os dois comentavam:

            – Todos, todos estavam ali conosco.

            – Sim! (dizia um ao outro) Viam tudo…

            Nisso ouviu-se um soluço, era Efigênia que soluçava por não poder mais voltar a Terra, pois o seu crânio ainda merecia cuidado.

            Nisto ouviram também alguém que chegava:

            – Oh! Quantas saudades… falaram muito, tudo o que se passou, como se tivessem perdidos de vista. Depois Pai João perguntou:

            – Por quê Efigênia não pode voltar a Terra?

            – João (falava Vô Agripino): As forças biogênicas são transmutações das Forças Cósmicas. A função da matéria é organizada pelo sistema do Corpo Etérico. O corpo é sempre um e o mesmo tem sua origem na matéria orgânica, metamorfose da Matéria Cósmica. As funções são muitas e várias. Têm sua origem nos fenômenos vitais, que é criado pela matéria inorgânica que forma o corpo bruto, inerte, sem atividade própria. Efigênia naturalmente não está preparada para tanto. Ouviu-se um estrondo… O quadro se modificou.

            Vô Agripino sorrindo disse: – Vou lhes dar uma rica surpresa.

            – Ah! Lá estão todos que irão voltar…

            – Onde estamos? (perguntou Pai Zé Pedro).

            – Na Mansão dos Jaguares – E quem você está procurando Zé Pedro?

            – Eufrásio!

            – Ah! Sim, (disse Pai João) Eufrásio ainda não chegou.

            Perguntaram quanto tempo já se encontravam ali. Cinco anos e no entanto estavam todos ali. Sim, pensava Pai Zé Pedro: No Universo não há inércia. O movimento é incessante. A atividade é essencialmente produtora e as forças não param. Se ficarmos parados ela se vai e ficamos sós. Sim, repetia ele, o homem é portanto o Microcosmo, matéria e força, corpo e funções; o corpo físico não gera a vida ou a força promotora dos movimentos, mas absorve-os. O organismo é um reservatório universal, é assim o instrumento da vida, aparelho que varia do infinito, aos pesados contatos da Terra que alimentam as células vegetais…

            Sim, a experiência foi muito brusca, muito fatal. Pai João e Pai Zé Pedro não sabiam, nem mais nem menos o que estavam fazendo. Levados pelos arrolhos dos tumultos, arrastavam em suas mentes aquele crepúsculo final. Sim. Perguntavam-se sempre: Porquê uma dor tão grande? Verdade! Lembravam-se na Cachoeira… Os dois presos, soterrados da cintura para baixo, sem poder socorrer os demais, até que outra avalanche os levasse para o fim.

            Sim, pensavam, ficamos presos por castigo de Deus? Perguntavam sempre. Ficamos presos por reparação… castigo?… Eram as dúvidas e os conflitos daqueles dois. Porque suas cabeças não sabiam analisar, os dois presos para assistir toda a catástrofe. Sua revolta já estava levando-os a descambar para “Ponta Negra”.

            Verdade, amamos na Terra e no entanto sofremos tanto! – Cadê o Vô Agripino? – Ficou com as crioulas e os Nagôs? – Porquê saímos de perto deles?

            Porque nossas mentes têm que se encontrar por si mesmas e não vê Zé Pedro, aquele bendito arrolho nos jogou para aqui sem que nós sentíssemos?

            Nisto ouviram um grito que penetrava diretamente em seus ouvidos: – Tibério, eu sou e serei o teu Cônsul fiel, tenho prisioneiros: Marcus Cláudio e Vinícius os teus traidores. Os dois homens soterrados naquele imenso pântano. Saiam chispas de fogo pelos olhos. Pai João e Pai Zé Pedro se olhavam sem nada poder dizer. Porém, o homem continuava sua obra. – Marcus Vinícius, o traidor!

            – Sim, diziam os nossos queridos, não temos dúvidas, o quadro era idêntico, somente o ódio daquela gente era o oposto da Cachoeira do Jaguar.

            Quando se deram conta de si, estavam na Indumentária de Tibério (Pai João) e Marcus Vinícius (Pai Zé Pedro). Os Espíritos do triste comício agora gritavam com mais intensidade, foi na deposição de Gália, lembrou-se Pai João.

            – Oh! Meu Deus, porque estamos aqui?

            – É a misericórdia de Deus. Sim, não acreditamos nem mesmo em Vô Agripino, e olhando para suas novas vestimentas, Pai Zé Pedro gritou: Fujamos daqui antes de sermos vistos nestas Indumentárias! Vamos daqui! Nisto ouviu-se um assovio e um grupo de Cavaleiros surgiu, se espalhando por todo aquele pântano, ficando somente um Luminoso, que se aproximou dos nossos queridos e num tom de crítica prestou homenagem aos dois, que ainda vestiam as Indumentárias. Pai João e Pai Zé Pedro sentindo a maior humilhação disseram:

            – Viemos recentemente da Terra.

            – Estou vendo, porém nem tão recente. Sei que sofreram muito nesta jornada a ponto de perderem a sua Individualidade. Esqueceram-se do Amor de Deus, cumpriram com Amor e Dignidade a Missão na Terra; no entanto aqui, depois de cinco anos, estão para cair apenas por não terem encontrado a razão do seu crepúsculo. Egoísmo, o egoísmo poderá arrastar tão grandes e nobres Missionários?

            – Porque estamos assim? (perguntou Pai João) Vestidos assim?

            – A falta de segurança e de Amor a Deus.

            – Nos culpamos por ter ficado presos, vendo toda a tragédia sem poder nos movimentar, vendo todos perecerem. Tememos que fosse uma reparação e no entanto não sabemos onde ficou o erro.

            – Pelo que sei Vovô Agripino os orientava dando-lhes lindas lições.

            Nisto gritou Zé Pedro: João, João Nagô! Tire depressa de sua mente esta roupagem. Os dois começaram a rir e abraçados, tudo se modificou. Agora olhavam para o Vale Negro. Lá embaixo tudo já estava diferente, os Centuriões já os haviam levado em suas Redes Magnéticas.

            – Oh! Meu Deus! Como nos martirizamos. – Sim Zé Pedro, talvez queríamos ser recebidos com festa.

            Pai Zé Pedro e Pai João sentaram-se na primeira Pracinha e tristes começaram suas queixas: – O que será de nós? Temos que receber uma Missão e ficar juntos outra vez.

            Sim meus filhos, agora eles se recordavam mesmo de tudo…

            Quando estavam falando chegaram as sete Crioulas e tudo foi festa. Jurema já parecia uma Princesa.

            – Onde andavam meus queridos irmãos? Sabemos que estavam juntos, dizia com graça, daqui onde estamos avistamos tudo, até mesmo “Ponta Negra” e o “Vale Negro”.

            Quando Jurema terminou, Pai Zé Pedro disse baixinho: – Te viram na encarnação do Imperador Tibério César.

            – E você Marcus Vinícius.

            – Sim (disse Jurema) Salve Deus! É natural que façamos estas reparações. É difícil entender, estivemos ali e tudo foi como se Deus nos quisesse testar.

            – Sim, já entendemos tudo, Tibério enterrava os seus prisioneiros até a cintura e deixava que os bichos os comessem ainda vivos, no entanto não nos deixou vivos por muito tempo.

            Nisto uma pequena luz aparecia ao longe.

            – Olha! Disse Jurema. Olha Zé Pedro! Jerônimo soube que os senhores estão aqui e vem lhes ver.

            Pai João e Pai Zé Pedro se olharam, sim, como Jerônimo?…

            – Oh! Zé Pedro e João! Disse Jerônimo todo feliz. Vim buscar os senhores para a nova Mansão dos Jaguares.

            – Jerônimo, meu Jerônimo, como pode tanta compreensão?

            – Sim, disse Jerônimo, tenho a cabeça e o coração bem menores que o dos senhores, por conseguinte, a missão foi menor também.

            – É verdade, tudo vem de um Plano de Deus. Sim! Remataram…

            Ouviu-se um estrondo, eles já estavam perto da Mansão dos Jaguares. Jerônimo mostrava tudo por onde passavam. Sim, Jerônimo já estava ali há sete anos e sempre foi um Espírito conformado. Por último, vendo a admiração de Pai João e Pai Zé Pedro, disse: – Sabe meus queridos Mestres, tenho tudo que me ensinaram na minha cabeça, só Deus poderá lhes pagar.

            – A nossa Doutrina não chegou para nós: Vê que já estávamos descambando para “Ponta Negra”.

            Nisto ouviram vozes: Eram Antera, Zefa, Lívia, Emerenciana, Maria Conga, Sabina e Cambina, e junto os Nagôs, só faltava Eufrásio. Foram abraços e comentários como se estivessem chegando de uma grande viagem.

            Pai João se ligou a Antera e quando viram já estavam com uma nova roupagem.

            – Por Deus não te reconheceria, se tu também não estivesse junto com os outros.

            Todos entraram e os dois foram para uma Pracinha recordar as suas façanhas na Terra. Foi um tempo bonito, todos se conheceram em casais, saíam e com saudades esperavam o Amor de Deus.

            Já era hora da prece… “do Canto Universal”. Saíram dali e foram ao “Campo de Morsas” vibrar para os que ainda estavam na Terra.

            – Como? Perguntou Pai João.

            – Sim, no “Campo de Morsas” vibram os que ainda têm os seus familiares na Terra.

            – Tens alguém, Zé Pedro?

            Este surpreso respondeu – Tenho… tenho o meu Sinhozinho e minha Sinhazinha.

            – E eu (disse Janaína), vou devolver-lhes as rezas que fizeram pensando que eu estivesse morta.

            – Onde estão os teus familiares Janaína? Perguntou Jerônimo.

            – Na Europa, respondeu.

            – Se é na Europa, é logo ali…

            Todos sorriram, vendo a verdadeira família.

            Nisto o jovem Tomáz, que se vestia como um belo Fidalgo Grego, foi se juntar a Janaína.

            – Tomáz! Gritou Pai João meio ressabiado. Tomáz, meu querido Tomáz! Como sofremos por tua partida.

            – Sim, pelo que sei, e partiremos em breve.

            – Oh! Meu Deus! Disse Jurema que estava ao lado de Japuacy, também na roupagem de cidadão romano.

            Verdade, até parece conto de fadas; todos com seus amores chegaram ao grande e luminoso “Campo de Morsas”. Todos estavam em suas afirmações sentindo aquela força em perfume que exala dos Mundos Espirituais de Deus. As energias iam e vinham como laços de fitas. Pai João e Pai Zé Pedro sorriam e choravam, vendo aquela maravilha que jamais pensaram existir. Risos e luzes. De repente começou o sermão. A Voz Direta que também era maravilhoso.

            – Salve Deus! Quem está falando? Quem fala em nós como se nos conhecesse?

            – São as Vozes dos Ministros que nos preparam para voltar a Terra.

            – Como poderemos partir com todos os nossos amores?

            – Sim meu filho, como será a despedida dos nossos queridos? Veremos no próximo capítulo.

            Com carinho.

            A Mãe em Cristo…

            Tia Neiva

 

Obs: Sempre solicitada em muitas sintonias, a Clarividente não prosseguiu com a história. Salve Deus!

PEQUENAS HISTÓRIAS SOB OS OLHOS DA CLARIVIDENTE NEIVA

11 – O Amanhecer das Princesas na Cachoeira do Jaguar

Templos do Amanhecer

CASTELO DOS DEVAS – VALE DO AMANHECER

 

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Trabalho de Angical – Agosto/2016

Templos do Amanhecer - Trabalho de Angical-2016-08

“… Os mais esclarecidos buscam os que ainda estão nas Trevas ou no alcance de suas cobranças. Agem, se esclarecem e voltam para Deus, em busca de suas origens; são espíritos que já sofreram tanto que, às vezes evoluem com os primeiros esclarecimentos dos Doutrinadores e dos Aparás. Seção de Angical é uma benção de Deus. É suficiente uma camisa xadrez, uma fita e sua identificação, ou uma saia de chita e uma blusa preta; esperar que os Mentores os tragam até aqui, desde que se faça a Abertura às nove e meia da noite. Seu encerramento não tem hora determinada. Um Apará e um Doutrinador fazendo uma Corrente Magnética, têm a permissão de Deus de retirar um “Elítrio”, conforme seu merecimento.
Porém, o fato é que há necessidade nos planos espirituais que estes espíritos voltem para Deus. Tudo, sem dúvida, na LEI DO AUXÍLIO, que é a única maneira de chegarmos a Deus!” 

Com carinho, a Mãe em Cristo, Tia Neiva.

Templos do Amanhecer – Castelo dos Devas

Trabalho de Angical

Dia 15/08/2016

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A Volta dos Ciganos – E o efeito das Reencarnações

10 - A Volta dos Ciganos-pSurgiam os primeiros raios de sol, prometendo assim uma primavera festiva naquele pequeno povoado, província do Conde Rafael, jovem viúvo e herdeiro que gozava de todos os requintes da corte russa. Tudo prometia àquele belo dia de sol, todos queriam ser acariciados por ele. Foi então que despertou-me também aquela alegria. Oh meu Deus! Começo a lembrar-me como se fosse hoje; lembro-me, lembro-me sim!

Estava ali naquela pequena praça uma linda cigana, que cantava dançando em sua graça ricamente vestida. Que quadro original pensei. Chegando-me mais para perto, pude melhor observar. Alguém então conhecendo foi me explicando: é um magnífico casal de zíngaros, aquele menino é também um pequeno zíngaro, filho deles – percebi logo, e não sei porque cada vez mais chegava-me para perto daquele suntuoso quadro. E ali embevecida não reparei que já estava bem tarde para melhor atender as exigências de meu patrão, o Conde Rafael, pois eu era governanta do Castelo.

Senti que estava atrasada e segui para casa sem perca de tempo. Já estava eu nos meus afazeres domésticos, quando entra desesperado meu adorado patrão, trazendo em seu semblante um quadro de dor. Fui-lhe ao encontro… – que te passas meu filho? (disse eu com a familiaridade que tínhamos) diga, diga o que te passas meu bom menino! Oh minha boa Antera… (continuou ele) sempre foste compreensiva e sincera, diga-me o que devo fazer agora após minha triste atitude…

– Meu filho, que fizeste?

– Sim, foi horrível! Encontrei-me com uma bela cigana e a induzi a seguir-me.

– Oh meu Deus, como pude ser tão cruel, arranquei-a de Augusto, seu esposo e mandei que a trouxessem para aqui com o seu pequeno rebento. Oh minha querida Antera, se pudesse remediar o mal que cometi. Sim, sim, deve haver uma força especial para fazer-me cometer tão ignóbil ato, diga, diga alguma coisa, minha bondosa Antera.

Fiquei parada ali sem nada o que dizer, enquanto pensava mil coisas. Ora veja só, como pode meu Deus! Aquela linda cigana viver agora entre nós, e qual seria o fim de tudo aquilo? Vamos, vamos aonde está essa cigana, disse-lhe por fim.

É verdade, estava ali a cigana e seu filhinho de uns três anos mais ou menos.

– Seja bem vinda a esta casa, linda cigana (disse eu) – Sou a Governanta deste Castelo, para servir-lhe no que desejar.

– Oh (disse ela com graça), como sois boa, senhora… porém, sou uma pobre cigana que pretende servir e não ser servida.

– Verdade? Serviremos mutuamente (disse para arrematar).

Foi então que a criança começou a chorar. – Deve estar com fome (retruquei), e saí para preparar qualquer coisa para ele. Chama-se Yatan (disse a mãe), e desde já entrego-lhe boa senhora, eduque-o nos seus costumes.

Misericórdia, quase gritei de medo, pois as características do pequeno cigano, nada ofereciam de bom.

Passaram-se dias após a chegada desta cigana no Castelo. Foram celebradas as bodas do Conde Rafael e a linda Andaluza, era seu verdadeiro nome.

Tudo já voltava ao seu ritmo normal. A bondade e humildade daquela cigana deslumbrava a todos que a conheciam. Parecia verdadeiramente feliz o lindo casal.

Certa vez voltando de um dos meus giros costumeiros com o pequeno Yatan, deparei-me com Andaluza em frente ao quadro da minha falecida patroa. A princípio, pensei que ela estivesse admirando aquele quadro de tão rico valor, porém com o tempo, observei que chorava. A sala era ampla e de onde estávamos podíamos ali permanecer sem sermos vistos.

O menino olhou para mim e disse: – Antera não faças ruído que assuste minha mamãe, ela lastima-se do lobo que comeu o meu papai… Ah! Sabe, Antera, quando eu crescer e for um homem, matarei todos os lobos até encontrar meu papai. Andaluza virou-se para nós com os olhos rasos d’água e um ligeiro sorriso de amargor. Era verdadeiramente linda, seus cabelos em mechas douradas destacavam em seu rosto oval um par de olhos verdes, caprichosamente rasgados; seus lábios entreabertos exibiam um verdadeiro colar de pérolas de mais rico valor.

Sim, ela havia escutado todo aquele diálogo de seu filho comigo, pois veio ao encontro e pegou-o no colo dizendo: – Pobre filhinho…

– Venha minha querida, venha, quero que saiba tudo que aconteceu comigo e os meus. E arrastando-me para um pequeno sofá perto da lareira, deixou cair seu esbelto corpo e com a linda cabeça dourada no meu colo cerrou os olhos e começou a contar: – Querida Antera… Era uma vez uma infeliz tribo de ciganos, que tinha como Rei um jovem zíngaro por nome Augusto (disse ela fazendo uma pausa e continuando com os olhos semicerrados, como se estivesse sentindo aquela presença do Conde Rafael, que havia entrado e ali tomando o seu lugar em uma cadeira à nossa frente, não contando com o menino presente e bem consciente, esquecíamos dele).

– Sim minha filha, continue… Sei que nos faz bem este terrível segredo de tua formação. Desabafas, e me guias melhor, disse eu, continue minha bela.

– Sim… Augusto chamava-se ele, o nosso Rei! Lembro-me então, tinha eu quatorze anos quando uma velha Profetisa disse à minha mãe que eu haveria de me casar com um Rei de nossa tribo, porque do contrário não seria feliz. Guardei comigo aquela doce revelação. Certo dia quis o destino envolver-me em suas galhofas.

Quando morreu o nosso velho Rei, deixando dois filhos gêmeos na disputa de seu trono, eram Braz e Augusto, um dos dois teria que ser o nosso Rei e um dos dois havia de desposar-me. Houve então a grande disputa, Braz ganhara com todas as pompas; que feliz seria quando esposa de Braz. Oh! Meu Deus, em meu pequeno coração já palpitava o amor de Braz.

No entanto todos ali temiam que Augusto não aceitasse sua derrota, porém eu em minha criancice, não pensava senão no meu amor ao Braz, até que o mau dia chegou. Era bem tarde da noite… Começavam os primeiros sinais do outono, quando uma forte discussão se ouviu lá fora.

Saí de minha barraca a ver o que se passava. Lá estavam Braz e Augusto. Augusto partiria com alguns ciganos ambulantes e deixava Braz com o seu povo. Assim pensei: está tudo resolvido! E qual não foi o meu desgosto ao despertar-me no outro dia a ver-me nas garras de Augusto. Sim, Augusto havia me roubado altas horas da noite sem que eu houvesse despertado. Destino. Oh! Cruel destino… Continuava a bela cigana.

E sem que eu me refizesse daquele susto, foram celebradas as bodas nupciais minhas e de Augusto, tudo estava terminado para mim. Até que certo dia Augusto decidiu chegar até aqui. Era mesmo impossível aquele homem. E por isto de nada valeram os nossos conselhos e nem tão pouco as profecias dos Sábios Profetas. E, portanto tivemos que fazer este triste trajeto em respeito ao nosso caprichoso Rei.

Ah, foi horrível… quando já estávamos no meio do caminho começava a nevar. De um dia para outro estávamos no mais terrível oceano de gelo. Como fazer? Os nossos aquecedores ficaram imprestáveis e a caça muito perigosa. Prefiro não descrever os dias de tortura que passamos aprisionados em nossas barracas. Augusto escondia o alimento e nos dava ração.

Bastante tempo demorou aquela tortura. Foi até que uma noite fomos surpreendidos por uma forte tormenta. Não tivemos tempo para pensar; o vento soprava arrancando as barracas dos lugares num desastre de dor. Oh! Santo Deus! Sem que pudesse nos refazer ou procurar atender aos feridos, famintos animais investiram contra nós. Foi uma verdadeira luta da vida contra a morte…

Oh! Virgem Santa! Detrás de uma barrica que havia rolado, fui testemunha ocular daquele triste cenário. Sim, triste, muito triste. As feras lançando-se contra aqueles desafortunados ciganos, não nos dando tempo para qualquer defesa sequer.

Eram lobos, lobos! Eu os vi! E após todo aquele terror que eu havia registrado. Oh! Meu Deus! Até agora parece-me ouvir os uivos daqueles animais que fugiram levando suas vítimas na imensidão daquela trágica noite. É verdade, estava eu ali, não havia sonhado.

Corri os olhos ao redor, vi que tudo havia sido destruído e que apenas restavam eu e Augusto. Tudo, tudo acabado. Dizia a cigana, como se estivesse vivendo outra vez aquele drama tão triste e até então desconhecido para mim e ao Conde Rafael, e sem que pudéssemos impedi-la, continuou:

– Ah, foi horrível!… E muito rápido, sentia agora uma forte dor na cabeça, quando um grito rouco de alguém que me chamava: Andaluza, Andaluza… em seguida quis responder, mas a voz não me saía, estava petrificada; o único sinal de vida era aquela terrível dor de cabeça e ali talvez tenha adormecido. Acordei com os gritos de Augusto novamente, já não me chamava, mais parecia um louco; corri para perto dele quando tropecei em alguma coisa, abaixei-me para ver, oh! Meu Deus, eram os restos de Calaça, minha querida protetora. Quantas vezes as chibatadas que Augusto me lançava ela as enfrentava por amor a mim… Estava eu ali, com o meu triste destino, tudo, tudo infelizmente era verdadeiro!

Não sei por quanto tempo passamos abraçados eu e Augusto, com medo de olharmos ao redor. Após algum tempo ele balbuciou: Luza, querida, que nos resta fazer?

Esperarmos a nossa vez! Respondi pressentindo novas desgraças.

Passamos desgraçadamente dois dias, dentro do carroção que havia ficado de pé. Augusto desesperado pagava um preço exorbitante de sua perversidade. Nada nos restava senão esperar a triste morte. Odiava Augusto com toda a força do meu coração.

Já não podia suportar aquela terrível espera, resolvi então matar Augusto e a mim, depois de livre o meu Espírito, correr, correr até encontrar a minha querida Calaça. Sim, apalpei o punhal que trazia no seio, Augusto dormia com pesadelos, gemendo e virando-se de vez em quando de um lado para o outro. Será agora, pensei… Empunhando com toda força o meu pequeno punhal. Augusto estava agora calmo, sua camisa desabotoada exibia no seu peito forte o medalhão; emblema da saudosa tribo dos Katshimoshy; comecei a fitá-lo, como se os meus olhos estivessem pregados sobre aquela jóia tradicional dos Katshimoshy, o que estava acontecendo e o que aconteceria quando soubessem do triste final de Augusto e o seu povo? – Meu Deus, não ficara ninguém que possa contar esta triste história, porque eu matarei Augusto, matar-me-ei logo depois e correrei em busca de minha querida Calaça…

Augusto parecia que desafiava-me respirando profundamente. Levantei o braço decidida a sangra-lo quando ouvi uma voz familiar: – Luza, minha filha, pelo amor de Deus, como o desespero a fez cruel!… Não tens respeito às relíquias dos profetas Katshimoshy? Não temes os seus encantos? Olha minha filha, bem perto daqui habitam pequenos seres selvagens, que bem poderão ser dominados. Tu és loira e bonita, e eu te preparei com os encantos dos Katshimoshy, Augusto não precisa, pois já os tem (olhei em seu peito reluzia o encantado emblema). Disse afinal: Oh, quem dera não estar delirando!… Calaça continuou: Não estás delirando, aqui estou em Espírito e Verdade. Não crês nas manifestações dos Espíritos? Nas revelações dos Profetas? Pois bem, eu te darei uma prova. Desapareceu após dizer isto. E eu como se estivesse sonhando, despertei.

Porém, sem o mínimo desejo de matar aquele que seria em breve o pai de meu filho.

Debrucei sobre o seu peito e chorei por longo tempo.

Augusto sem nada desconfiar acordou e começou a acariciar-me. Comecei a perceber, então eram os fenômenos de Calaça, que haviam me transformado daquela maneira. Augusto me apertava contra o peito cada vez mais e eu pela primeira vez admiti sem nenhuma recusa íntima.

Calaça sempre boa a mostrar-nos bons caminhos, apesar de desencarnada, estava ali, ajudando-nos a enfrentar tão terrível destino. Grande culpa a de Augusto.

Depois deste meu encontro com Calaça, senti uma grande vontade de viver.

Certo dia, Augusto decidiu sair por aqueles arredores, deixando-me só na barraca. Ocupei-me dos meus poucos afazeres, quando gritos estranhos me sobressaltaram, e vi pequenos homens selvagens que se arremessavam contra a porta de minha infeliz “casa”, senti neste instante uma força suprema percorrer todo o meu corpo, como se nada temesse daqueles pequenos seres, abri a porta e na soleira esperei, desafiando aquela pequena tribo.

Na proporção que eles vinham chegando eu pensei mil coisas, pensava em Calaça, pensava também que já era a minha feliz hora; feliz sim, porque eu a esperava como libertação do meu Espírito. Olhei ao longe e vi Augusto que talvez atraído pelos gritos vinha correndo em nossa direção. Mas, os pequenos homens estancaram à minha frente e um deles ordenou que me pegassem e puxaram-me à frente do pequeno grupo.

Não reagi, nem tampouco manifestou-me desejos de lavar algum objeto de minha barraca, ao contrário, desejava esquecer tudo, esquecer o meu passado, mesmo que o meu infeliz destino naquele instante estivesse a gargalhar de mim.

Os pequenos homens continuavam com os seus gritos, porém, não me assustavam, não me davam o menor medo sequer e eu olhava Augusto que corria. A sensação de que ele não nos alcançava dava-me mais paz. Os homens caminhavam quase correndo. Quando já havíamos percorrido um enorme trecho fomos tomados por uma terrível tormenta; o vento nos fazia medo. Desabamentos, vales, tudo queria impedir o nosso caminho, porém os pequenos homens faziam-me ver que eram peritos naquelas zonas tempestuosas. Fui então cansando-me da viagem; a minha cabeça rodava, parei e logo em seguida senti que alguém me carregava. Quando acordei estava recostada numa pequena cama que mal me cabia e muitas mulheres ao meu redor, umas pegavam nos meus cabelos, outras mediam suas mãos com as minhas. Pensei então: devem estar achando-me muito grande; observei que elas ou eles só eram amáveis comigo quando eu sorria.

Ofereciam-me peixe, pois era sua comida mais fácil. Era também visitada por todos da aldeia, sim, era um povoado com hábitos selvagens.

Oito dias mais ou menos se passaram, quando na entrada da aldeia os pequenos guerreiros anunciavam a chegada de um estrangeiro. Fiquei lívida, só podia ser Augusto, corri para lá e acenei que aquele estrangeiro era meu marido, os homenzinhos deixaram então que entrasse. Foi fácil para Augusto sintonizar-se com aqueles homens. Augusto contou toda nossa história mentindo a seu regalo; mostrou a toda tribo o emblema dos Reis Katshimoshy, e eles também nos apresentaram seus costumes. E seu povo, dizendo-nos serem caçadores, Lapões era o nome de sua tribo. Vivemos ali por dois longos anos mais ou menos. Eles nos adoravam, inclusive o meu filho Yatan que veio a nascer naquela longínqua tribo. Oh! Meu Deus. O fenômeno de Calaça, o grande fenômeno, fez-me feliz depois de tantas desgraças. Partimos dali, eu, Augusto e meu filho.

Lindas peles trocamos nos mercados por agasalhos e moedas. Sofremos muito no longo e penoso tráfego até aqui. Uma noite antes de entrarmos nesta província, fui surpreendida novamente por Calaça, sonhei que ela me dizia: – Luza, chegarás amanhã na província de um Conde viúvo que te desposará com as leis da Côrte, amanhã aos primeiros raios do sol anunciarão a primavera para o começo de tua liberdade. Cante exibindo a tua graça. Adeus, minha Luza querida. Mesmo em sonho quis puxar a sua saia para impedir que fosse; qual nada, desapareceu diante dos meus olhos. Chorei descompassadamente e logo que o dia amanheceu contei a Augusto o meu triste sonho, sim, e qual não foi a minha surpresa, Augusto sorriu dizendo: – Veja só, se isto fosse verdadeiro eu não sei como agradeceria àquela víbora daquela Calaça, a livrar-me de você, seria um prêmio e eu não o mereço, por Deus. Oh, gritei, chega! Calaça não é víbora, minha querida Calaça, vítima de tua ignorante teimosia. Augusto dava gargalhadas que me davam medo. Foi então que nos demos conta da profecia de Calaça.

E depois de contar toda sua história, a bela cigana deu um salto espreguiçando seu esbelto corpo, balançou sua linda cabeça loira e disse: É tudo o que fui e que sou.

Rafael levantou-se e segurando-a pela cintura, beijou-lhe a testa. Depois chamou um criado ordenando-lhe que trouxesse o Brasão e chegando eu o vi colocar aos pés de sua esposa cigana e qual não foi a nossa surpresa; a cigana segurou aquele rico estojo e depois com os olhos rasos d’água devolveu ao Conde, seu esposo, dizendo que a uma cigana não eram permitidos luxos daquela natureza. Se ela aceitasse estava violando as tradições daquela nobreza. Colheste-me do lodo, amo-te em agradecimento, deste-me a paz e por isto não pretendo enlodar o que de puro encontro nesta nobreza, viverei como uma cigana, respeitando as normas dos Katshimoshy, do contrário Calaça não me trará as bênçãos de Deus, e disse mais: Calaça sabe tudo…

Rafael sorriu, gostando da humildade da cigana, porém eu observei muito o menino com os olhos no estojo, que bem se podia ler seus pensamentos.

Depois destes esclarecimentos parecíamos viver melhor, mesmo notando a aproximação dos ciganos nas imediações do Castelo, lembro-me também de haver tirado o menino muitas vezes do quarto, onde era guardado o Brasão.

Andaluza já estava calma e até parecia feliz. Se tudo ocorresse normalmente, dentro de três meses daria a luz a uma criança. Rafael muito feliz esperava a chegada do filho que seria seu primogênito. Porém o nosso infeliz destino já estava ligado à inditosa cigana. O tempo corria e o menino cada vez mais ficava pior, mal educado e por muitas vezes desaparecia sem que ninguém desse notícias, depois chegava contando coisas que não acreditávamos.

Certa manhã passamos um grande susto, foi encontrado um cigano no pátio do Castelo, um jovem cigano agonizante, os criados correram de um lado para outro procurando socorre-lo, quando um grito agudo nos fez virar, era Andaluza que nos dava prova de seu imortal apego aos seus antecedentes.

É verdade, a bela cigana curvou-se com carinho e procurava reanimar aquele corpo quase sem vida, enquanto, ao mesmo tempo, dizia: Oh, meu pobre irmão Nardo, Nardo, como chegastes até aqui? O que foi feito do nosso querido povo? Ao balbuciar o pobre rapaz disse: Venho falar contigo, venho de Braz… Braz o nosso Rei, pede para você dar uma chegadinha até lá, porque maus agouros pairam sobre tua cabeça, não tarde Luza. A cigana meio confusa pediu que os criados saíssem dali e quando fui retirar-me ela me deteve dizendo que eu era a sua segunda pessoa. Cuidamos do cigano fazendo com que ele logo se restabelecesse. E foi com grande surpresa e desespero que os vi contratando o momento daquela trágica fuga.

Oh! Meu Deus! Como sofri quando a cigana com os seus olhos tristes me disse: Antera querida, tenho que partir para ouvir os conselhos dos Profetas e suas santas ordens, serei amaldiçoada se não for eu mesma ao grande batismo, vede querida, não tenho a proteção dos Katshimoshy. E mostrando o grande escudo no peito do jovem cigano, repetia: Eu não tenho como não terei também a proteção de Calaça e do meu Rei.

Não, não! Tive forças para lhe dizer: Minha senhora querida, esta jóia é a superstição dos zíngaros, já não lhe fica bem usa-la; por conseguinte sei que és bastante prudente para não fazer semelhante viagem, deixando o seu apaixonado esposo; que tanto sacrificou à sociedade de seu condado. E em que posição a senhora me deixará com meu pobre patrão. Antera, disse-me ela, jamais praticarei atos que possam vir a desabonar este condado, como também não deixarei em hipótese alguma de atender ao chamado de meu Rei. Se Rafael me ama compreenderá a minha tradicional alma cigana e tu Antera, (completou) darás as desculpas que te convier.

E com a rapidez de um sonho, dirigiu-se para a estrebaria com o jovem cigano e em seguida partiram dali.

Fiquei ali parada, não sei por quanto tempo pensando como ia se portar o meu pobre patrão. Sim, foi tudo muito rápido. E qual não foi minha surpresa, pois logo que me refiz, fui dar a triste notícia ao Conde, meu patrão, e ele com um sorriso triste me disse:

– Querida Antera, esta tua notícia não me surpreende, estamos em um mundo de provações para uma evolução, devemos dar graças a Deus por Ele nos corrigir sempre que erramos, e eu sinto que fui corrigido, não respeitando as normas dos ciganos, a fiz minha esposa, e sei que naturalmente lhe foi doloroso desrespeitar as leis de sua crença cigana, pois afinal de contas foram celebradas suas bodas com Augusto, entre os encantos de suas Pitonisas e de fanáticos rituais. No entanto a pobrezinha não se rebelou e, muito ao contrário, vem nos cativando com sua Humildade e Amor.

E fazendo mais esta observação, o Conde Rafael continuou: Vede Antera! Nem mesmo o Brasão ela desejou toca-lo. Senti um calafrio percorrendo meu corpo, o Brasão.

Onde estará? Eu não o tenho visto no respectivo lugar… meu Deus! O Conde notando minha palidez disse:

Antera, o que tens? Escondes de mim alguma coisa a mais?

Não, lhe disse. É que estou cansada, devo descansar um pouco, se me permite.

Vai minha boa Antera, seria egoísmo meu segura-la agora. E dizendo mais, arrematou: Além do mais e como já disse, não mereço ser consolado se estou a pagar um delito que provoquei, talvez sem raciocinar.

Passaram-se mais ou menos quinze dias que a cigana havia partido. Tudo era tristeza, repartia bem o meu tempo disponível procurando distrair meu pobre patrão, que sem reclamar sofria sua grande dor. Todas as tentativas que fazíamos nas pegadas dos ciganos foram totalmente perdidas; ninguém dava notícias, ninguém sabia seu paradeiro. Cada dia mais tristes ficávamos, já sem esperanças.

Da sacada do Castelo onde estávamos, avistei o pequeno Yatan, que montado a galope de um fogoso cavalo vinha em nossa direção. O Conde Rafael levantou-se e juntos precipitamos, prevendo a grande desgraça que os nossos olhos presenciaram: após segundos, sem nos dar tempo de nada, o cavalo perdera o equilíbrio jogando o pequeno ao solo. Desacordado, com uma fratura na cabeça, perdendo uma quantidade incalculável de sangue.

Peguei sem perca de tempo o pequeno nos braços e pedi que providenciassem um médico. Fazia compaixão o estado de abatimento do Conde, não se retirava da cabeceira do pequeno enfermo.

Após mais ou menos três dias, o menino começou a falar chamando pela sua mamãe, às vezes com palavras desconexas, nos preocupava cada vez mais com o seu estado de saúde. E por mais que procurássemos agrada-lo, mais parecia odiar-nos.

Já bem tarde da noite deixei o quarto do enfermo para descansar, e passando no quarto da minha fugitiva patroa, escutei um gemido e qual não foi o meu pavor; fiquei petrificada alguns segundos e como cada vez mais iam aumentando, voltei correndo para junto do meu patrão, explicando o que ouvira. Alarmado com isso, disse não ter coragem de ir até lá sozinho. Mandou chamar Kazú, uma jovem servidora, dizendo que permanecesse no quarto junto ao pequeno enfermo, sem descuidar um só minuto sua vigilância.

Kazú era uma criatura temperamental que vivia a salientar-se por todos os cantos do Castelo, muito preguiçosa, porém, apesar de suas características indesejadas, não havíamos identificado o roubo.

Saindo para vermos os gemidos, qual não foi o nosso espanto. Encontramos a cigana em estado cataléptico de um lado e uma linda criança recém-nascida do outro. Não tivemos tempo a perder e esquecendo de tudo providenciamos médico e em seguida uma ama para a pequena prematura.

O dia havia amanhecido quando deixei o meu patrão recebendo algumas explicações da cigana, que com palavras firmes vivia o seu enredo.

– Querido Rafael, somos descendentes dos nômades, e sob o poder do Espírito Imortal dos Katshimoshy, juramos nas fogueiras colocar as nossas oferendas, por conseguinte, qualquer que tenha coincidentemente incorporado neste Ritual Cabalístico. Este juramento é considerado o elo de uma Corrente Salvadora, Poderosa e Imortal. Compreenda Rafael, eu sou um elo desta Corrente, jamais te farei infeliz; amo-te e não desejo viver longe deste Castelo, cumpri a minha penosa missão. Perdoa-me, por piedade. A minha pobre mãezinha desejava me ver.

Por quê não me pediu para que eu a levasse? Disse o Conde.

Ah! Continuou a cigana. Para não te deixar em dificuldades. O povo de Braz estava prestes a vir arrancar-me daqui. Não sabeis a intriga que fez Augusto, procurando com isto desculpar-se da grande desgraça da sua culpa, foi por isto que tive de correr para impedir outra armadilha do infeliz Augusto.

– Ah! Se soubesses como te amo e como me foi doloroso este meu comportamento. Encontrei a minha pobre mãe muito mal. Etelvina, a Profetisa oficial da tribo, profetizou os mais terríveis acontecimentos e tudo sobre mim.

Disse que tu meu querido Rafael, com toda tua indulgência para comigo, chegará o dia de acusar-me da mais vil calúnia e como ladra. Atirar-me-ia nas ruas exigindo que eu volte à tribo onde eu morrerei de saudades tuas. E logo após tudo isto, desatou em soluços de quem realmente está amargurada por uma louca e desabalada desilusão.

Oh! Minha querida, como pude duvidar de ti? Como se atreve esta Profetisa e que mal a fiz para ver-me tão vil, tão avarento a ponto de caluniar-te como ladra do teu próprio tesouro? Sim minha querida, és minha verdadeira herdeira de tudo quanto possuo. (Depois sorrindo para a recém-nascida) Agora será repartido com minha segunda sócia, não é mesmo querida? Não pense mais nessas tolices!

Oh! Disse a cigana, se me fosse possível esquecer que nada sinto, que os nossos Espíritos Imortais comprometeram-se no passado e, um grande débito eu terei que pagar-te antes de fugir daqui novamente, para novos mundos.

– Feito, e eu cobrar-te-ei em dobro, como tu, sinto que me deves um profundo amor e exijo ser pago! Quanto a tua partida, aconselho levar-me contigo pelas tuas concepções ou formações religiosas. Vejo que tens mais facilidades com estes transportes. Sempre gracejando, o Conde arrematou: Nunca vi tanta coragem, quando estiveres melhor, desejo que me ensines esta doce filosofia.

– Se Olga, minha usurária irmã souber de tais profecias, irá imediatamente aos pés daquela cigana profetisa.

– Oh! (gritou a cigana, chegando a assustar o Conde) Olga? Olga? Etelvina falou-me de Olga.

Sim! (respondeu ainda o Conde) Olga, minha irmã! Pois minha mãe encontrou-a à beira de um lago, era filha de um zelador da pequena mansão cujos donos morreram, uma fatalidade do seu destino, foi quando meu irmãozinho Hidelbrando foi salvo por ela naquele lago. Minha mãe a fez nossa irmã. Olga que sempre fora insatisfeita, apaixonou-se por mim a ponto de julgarmos que a morte da mamãe foi provocada por este grande desgosto. Olga fez todos sofrerem quando comprometi-me com Matusca, que morreu há dois anos, deixando-me viúvo e nem sequer um filho para que eu tivesse recordação do nosso casamento.

Dizem as pessoas supersticiosas que Olga se influenciava com feiticeiros e pitonisas para destruir a mim e Matusca. Não acredito que os feiticeiros tivessem tanta influência nos destinos ou desígnios de Deus. Vê, minha querida, se assim eu acreditasse em tamanho desafio, mandaria juntar todos os feiticeiros e pitonisas em uma tenda, fazendo o mais poderoso mecanismo e depois ordenaria aos mesmos fazer com que o coração da minha linda esposa cigana fosse puro de qualquer superstição. A respeito principalmente do Espírito Imortal. Disse ela: Vejo meu marido, que te falta compreensão dos fatos que vêm ocorrendo dia a dia, porém já me pedistes aulas de filosofia, não tardarei em dar o diploma ao meu Conde marido. Espero que não seja diploma de feiticeiro. Sim, também tenho tarimba (acrescentou, rindo os dois).

Vendo a compreensão daqueles dois, dei graças a Deus e fui dormir um pouco.

Apesar de preocupada com o pequeno Yatan, ao passar dos dias tudo percorreu na graça de Deus, até que chegou o dia da festa de São Petersburgo.

Começaram os grandes preparativos, o Imperador mandou que abrisse os portões para os estrangeiros e nômades, enfim, só se ouvia o tinir de guizos e passos de animais, nas ruas fogueiras enormes, danças e algazarras.

Para mim e meu patrão Rafael não havia alegria, ao contrário, nos sentíamos em perigo porque os ciganos com seus enormes cavalos enfeitados de fita pareciam desafiar até mesmo a própria natureza. E para o nosso maior receio, os ciganos que mais realçavam eram da tribo de Andaluza, pois em seus cavalos fogosos, mais pareciam príncipes encantados das antigas lendas.

Foi até que o nosso mau presságio confirmou-se.

Estávamos tomando chá, mais ou menos às duas horas da tarde, quando Kazú veio anunciar a chegada de duas formosas ciganas, que depois vim a saber serem Etelvina e Zaida. Etelvina a Profetisa da Tribo dos Katshimoshy, verdadeiramente simpática.

Andaluza mandou que entrassem e sem nenhum embaraço, apresentou-nos o Conde Rafael e eu. Fizemos tudo para nos tornarmos os melhores hospitaleiros. Zaida sempre abraçada a Andaluza, disse que naquela noite iria cantar para o Imperador no pátio do Grande Palácio e assim dizendo, saiu cantando e dançando com todos os encantos dos seus dezoito anos. Andaluza que não resistiu a tentação daquela dança, acompanhou-a e no amplo salão formaram a mais linda dupla.

Rafael ficou tão emocionado que franqueou o Castelo não só àquelas ciganas, como também a outros que estivessem com elas.

Tudo correu bem, até que à noite voltassem da grande festa. Só eu havia ficado tomando conta das crianças, pois entretida com a pequena herdeira não reparei que o pequeno Yatan havia desaparecido.

Chamamos a criadagem e um jovem por nome Tucem nos disse que havia visto o pequeno Yatan, em companhia de Kazú, que seduzida por um jovem zíngaro, haviam dito que só voltariam no outro dia, pois pretendiam passar a noite com o seu amor cigano.

O Conde Rafael, que estava ainda cheio de euforia da magnífica noitada com as ciganas na casa do Imperador, pouca importância deu ao desaparecimento do menino. E logo depois reunindo no salão as convidadas, pediu-me que fosse até o cofre e trouxesse o Brasão, pois desejava mostrar às ciganas a rica jóia que sua querida esposa havia rejeitado.

Oh! Meu Deus! Que horror, lembro-me como se fosse hoje, quando abri o cofre o maldito Brasão não estava.

Foi um verdadeiro alarme, os criados garantiram não ter entrado ninguém no Castelo, e todos insinuavam ser Kazú, pois a viram fugir com embrulhos grandes nos braços.

O Conde Rafael terrivelmente agitado gritava, dando ordens que trouxessem Kazú de qualquer forma ao Castelo.

A pobre Andaluza abatida, pobrezinha, levantava-se algumas vezes e falava ao seu esposo palavras de conformação. Os Cavaleiros vinham e voltavam sem qualquer notícia da servidora Kazú.

Com muito carinho, Andaluza conseguiu que o seu esposo se recolhesse aos seus aposentos. O dia já amanhecia, as três ciganas pareciam mais tristes, como se previssem a total desgraça profetizada para nós.

Etelvina, vê onde se encontra esta rica jóia, disse Zaida. Etelvina sacudiu todo seu corpo, proferiu coisas desconexas para mim, depois, depois como se passasse por um processo habitual, começou a dizer:

– Luza querida, as forças estão afastando-se de ti. Yatan, o teu filho, neste instante coloca sobre Augusto esta jóia que é o Brasão, instrumento de terríveis desgraças.

– Meu filho! Meu filhinho, de apenas cinco anos de idade?…

– Sim, continuou a Profetisa. Ele, Augusto, vem sempre ensinando o filho para este nefasto roubo. A cigana continuava suas tristes revelações enquanto nós outras gemíamos de dor. Depois com o dedo indicador apontando para mim, disse: Querida Antera, eu sou Calaça, sou o Espírito que perdeu o seu corpo pelos lobos famintos. Amo-te Antera, por ver-te tão dedicada à minha desventurada Luza, não me temas, porque dentro de pouco estarás comigo. A desventura paira sobre este Castelo, a Justiça e o Poder de Deus terá muito em breve sua força para a evolução e melhor libertar o Espírito de Luza. Luza, antiga Czarina, terá que carregar a Cruz Simbólica do Cristo, para safar-se do egoísmo, poder este do sanguinário Império Romano… Adeus… Não me queiram mal… Voltarei muito em breve. Depois como se estivesse cumprindo uma séria missão tomou então sua posição antiga.

Corri para a copa e trouxe alguma coisa quente, que não me lembro mais. Os criados haviam espalhado por toda parte a notícia do desaparecimento do Brasão.

A Condessa Olga logo que soube de tal notícia veio correndo ao Castelo. A sua visita indesejada nos fazia mal, principalmente no estado de angústia que nos encontrávamos. As duas ciganas solidárias a Andaluza, não quiseram mais saber das festas e nem tampouco afastaram-se do Castelo.

A Condessa Olga, depois dos cumprimentos habituais, chamou Rafael para um canto da sala e começou a falar:

– Oh meu querido mano… Lastimo ver-te em tão incorrigível situação, de se casar com uma nômade está certo… Enfim, é o teu impensado amor. Mas, ter em casa toda tribo… Ah!… Jamais aceitaria, isto é indigno de ti… Este povo está te hipnotizando, não é possível! E assim dizia enxugando as lágrimas, como se realmente estivesse desesperada, e eu que bem conhecia a Condessa arremessei-me para ela e disse:

– Cara Condessa, não admito por hipótese nenhuma que a senhora saia do seu Castelo para vir aqui nos perturbar, o Brasão não te pertence mais e nem tampouco ao Conde Rafael. Ele casou-se com Andaluza e neste Castelo quem manda é ela, o Brasão pertence a ela por tradição e para que ele nunca fosse parar nas tuas mãos imundas, criminosas, eu roubei e mandei levar para a Tribo dos Katshimoshy. (E como se eu conhecesse os processos de Etelvina, continuava) Criminosa, mataste a duas santas criaturas. Mataste com aquela erva daninha a pobre e indefesa Matusca, e com a mesma assassinaste também a Baronesa Yuca Santa, que te deu o Condado e te livrou da fome e da desgraça e, por último com medo do teu cúmplice mandaste surrar e expulsar da cidade, porém Deus não esconde por muito tempo as nossas perversidades. Sei onde, todo aleijado, resiste ainda o infeliz Yochim, arrependido dos seus crimes trabalha hoje pela sobrevivência. No entanto a senhora armou-se de suas forças satânicas, e veio para destruir a nossa Cigana Condessa. Não! Esta a senhora não destruirá!

Aquela criança que ali está é a herdeira do Conde Rafael, tua vítima. Aquela criança é a luz que ilumina este Castelo. Somos todos felizes, não precisamos da senhora e tampouco dos seus conselhos. E assim completei e quando dei conta de tudo, vi que todos estavam tão surpresos que não tinham pernas para saírem dos seus lugares.

– Antera, disse o Conde Rafael, Antera, como se atreve a tanto; testemunhas o que acabas de dizer?…

– Sim, meu patrão, perdoe-me… Não lhe disse há mais tempo pois quando fiquei sabendo, esta infeliz já havia matado minhas patroinhas queridas.

– Meu Deus! Não sabes que o Brazão pertence à Andaluza, como se explica terrível injustiça? Kazú está amarrada na praça de diversões para ser executada à noite, para pagar o crime que não cometeu.

Andaluza resmungou em pranto: Meu Deus, a maldição dos Espíritos ronda este Castelo!

– Etelvina, Etelvina, que farei para reparar tudo isto? Enlouquecerei se não tiveres piedade de mim… Não minha querida Andaluza, nada tens a temer… Disse o Conde procurando acalmar sua esposa. Rafael! Se souberes a verdade de tudo isto, odiar-me-ia, é tudo tão monstruoso.

– Como?… (gritou por fim Rafael sem entender) Como?… Por todos os diabos, estarás aliada com Antera, tramando infelicidades… Esqueces que tu e Antera são as únicas criaturas que amo! Oh! Minha Andaluza querida, vamos juntos perdoar o nefando erro de Antera, pelo amor do Grande Deus se isente deste roubo, não é digno de uma Condessa (até esse momento o Conde Rafael nada sabia sobre a atitude de Yatan).

Andaluza foi ao encontro de Antera e disse em soluços:

– Oh minha boa Antera, por piedade tenhas pena de mim, porque condenastes a ti mesma?

Fiz pelo meu patrãozinho, sei que se saíres deste Castelo ele morrerá e também eu. Odeio a Condessa Olga! Tudo era tão confuso que ninguém entendia nada a não ser eu e Etelvina com a sua Clarividência.

A Condessa Olga espraguejando deixou o Castelo.

Os ciganos também se foram. Agora restava-nos os três oprimidos pelo terrível acontecimento; o menino não apareceu. Agora tudo era tristeza, Kazú fora queimada como ladra, comecei então a sentir certas anormalidades, pensei queixar-me para ser vista por um médico, mas qual nada, os meus sintomas anormais tomavam-me com mais freqüência, a ponto de eu não mais poder falar. Uma espessa nebulosa tomava totalmente minha visão e em continuidade percebi uma sensação de leveza, ouvia como um sussurro palavras desconexas, como sendo: Oh! Pobre Antera, está morta! Ouvi também a voz querida do meu patrão: Morreu, minha Antera, a querida criatura que tanto me compreendia.

Até que fui levada dali pelas forças magnéticas do astral. Após submetida aos processos espirituais que não sei por quanto tempo, voltei a minha visual atual; sentia agora uma louca e inexplicável saudade da vida cotidiana da Terra.

Germano, o meu luminoso Mentor, explicava minha futura missão na Terra, porém o meu Espírito incompreendido e culpado não quis esperar pela benevolência das Leis, e com a facilidade do meu livre arbítrio, desprezei as cadeias benditas e voltei ao atraso nos carreiros terrenos.

Era uma bela madrugada quando o meu Mentor trouxe-me novamente à Terra. Antera! Disse-me: Voltarás aos labores terrenos, terás oportunidade novamente junto aos seus familiares. Cuidado com o teu Padrão Vibratório e com os teus julgamentos.

O sol começava a aparecer aos primeiros raios, quando avistei os portões do Castelo. E com tristeza foi que descobri a fraqueza de meu Espírito, reparei que não estava preparada, pois voltavam todos os instintos de vingar-me da Condessa Olga. E por mais que eu lutasse contra os maus impulsos, nada conseguia senão aumenta-los.

Germano, o meu bom guia, deixou-me à mercê de minha consciência. Estava ali o suntuoso Castelo do meu querido patrão. Tive então a mais triste surpresa: O Conde havia morrido, a cigana sua esposa estava desaparecida, e agora a Condessa Olga era a dona de tudo. Sim, até que Hildebrando chegasse de outros países, onde vivia levando sua vida boêmia, pois sendo o único irmão do Conde Rafael, seria ele o dono de tudo.

Estava eu agora naquele casarão sem nada o que fazer, apenas me acrisolando na aura da Condessa Olga… Quando já estava me preparando para deixar o Castelo, senti que as coisas estavam mudando de sintonia, voltei então e comecei a sentir a presença da cigana e me desesperei, comecei a invocar o meu Mentor, mas ele não aparecia.

Compreendi que o meu ódio pela Condessa Olga só fizera me embrutecer. Foi então que eu vi Andaluza caminhando sem destino. Chamei-a e ela ouviu, e que satisfação! Andaluza disse tristonha:

Querida Antera, não sabes a desgraça que nos causou o infeliz Brasão, tu minha boa Antera, morreu deixando-me no mais terrível desespero, sabias que Yatan meu filho havia roubado-º Morreu a infeliz Kazú e ele, Yatan, desapareceu. Foi então que desesperada corri para o meu bando a ver o que me dizia os Profetas de Braz, então Rafael sabendo disso saiu desesperado com os seus guardas e lá me encontraram. Mas, eu não quis mais voltar, a vergonha era demais; na verdade eu queria viver ao lado do meu esposo, mas, era mãe de um ladrão que podia ser sacrificado na fogueira. Oh Antera, foi horrível! Rafael saiu desesperado dali, sem me dar tempo de explicar. Depois ficamos sabendo que ele morrera, mas não foi encontrado o corpo dele.

– E tu? Perguntei. Ela baixou os olhos e depois continuou: Fiquei vivendo com os meus, temendo sempre Augusto, não dançava e não cantava. Certo dia estava à margem do rio onde Rafael foi visto pela última vez, quando um braço forte me puxou, me dando uma forte pancada na cabeça e trouxeram-me até aqui, onde estou prisioneira. Disse-me a Condessa Olga que o meu povo me considera morta segundo as minhas vestes encontradas… tudo foi tão bem feito!

– E as tuas Profetisas, por que não contam?

– Sim! Elas já disseram que eu vivo, mas não sabem onde. E eu estou ali, naquele armário.

– Oh! Gritei, compreendo, o teu corpo dorme, meu Deus! O que poderei fazer por ti? Minha querida Luza. Enquanto me lamentava ouvi uma forte pancada, era Gregória, a Governanta, que esmurrava o armário para acordar Luza a cigana, que também em um segundo desapareceu.

E quando a porta abriu-se, foi terrível, aquele corpo esbelto agora era o símbolo da dor, pálida e amedrontada.

E no auge do meu desespero, veio então Germano, que logo foi me explicar: Antera, se desejas fazer alguma coisa pela tua cigana, afasta-te dela. Estes ciganos estão em prova para a nova evolução. Vieram do Império dos Césares de Roma. E depois acrescentou: Também tu e todos os descendentes deste Castelo… Porque fugistes dos ensinamentos? Porque não te interessavas em aprender as Leis? Nada nos foi possível fazer pela sua teimosia. Agora estás destinada a passar o que der e vier; é verdade que terias de voltar e cumprir o teu carma, porém nunca assim.

Salve Deus! Que esses ensinamentos sejam promissores!

Com carinho,

A Mãe em Cristo.

Tia Neiva.

PEQUENAS HISTÓRIAS SOB OS OLHOS DA CLARIVIDENTE NEIVA

10 – A Volta dos Ciganos

Templos do Amanhecer

CASTELO DOS DEVAS – VALE DO AMANHECER

 

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